31 de dezembro de 2009

A DEFESA DO APOSTOLADO DE PAULO.

A DEFESA DO APOSTOLADO DE PAULO.

Porque a nossa glória é esta: o testemunho da nossa consciência, de que com simplicidade e sinceridade de Deus, não com sabedoria carnal, mas na graça de Deus, temos vivido no mundo, e de modo particular convosco. Porque nenhumas outras coisas vos escrevemos, senão as que já sabeis ou também reconheceis; e espero que também até ao fim as reconhecereis”. ( II Cor. 1.12,13)

Introdução

A segunda carta de Paulo aos Coríntios elenca em seu aspecto mais amplo, o desejo do homem de Deus, pela obra do Senhor. Escrever sobre o apóstolo Paulo se torna um desafio, ao passo que este homem se identificou com o evangelho de Jesus Cristo, em relação aos gentios, como nenhum outro apóstolo. Paulo tornou-se uma referência para todos os obreiros que vieram após ele, e muitos são os servos de Senhor que foram tocados pela história de vida deste obreiro.

Paulo em todas as épocas contribuiu, através dos seus escritos, de uma maneira gloriosa para manutenção das doutrinas bíblicas. Com poderíamos falar, sem os escritos de Paulo, sobre o casamento? Sobre a ressurreição? Sobre a fé? Sobre a segunda vinda de Jesus? Sobre tantas outras doutrinas que inspiradas pelo Espírito Santo foram deixadas para igreja? Não, de maneira nenhuma, este apóstolo se tornou, mesmo que se considerando como o menor (I Cor. 15.9), um marco para igreja de nosso Senhor Jesus Cristo.

O apóstolo Paulo que tivera uma vida exemplar vem através de sua nesta segunda carta convencer os seus pares, neste caso os da própria igreja que estava em Corinto, que tudo quanto fizera está dentro de um plano maior, isto é, a salvação das almas; Mas, se somos atribulados, é para vossa consolação e salvação; ou, se somos consolados, para vossa consolação e salvação é, a qual se opera suportando com paciência as mesmas”. (II Cor. 1.6). Desta forma, o apóstolo inicia a sua epístola falando sobre as consolações que são produzidas pelo Espírito Santo na vida daqueles que se entregam ao serviço do Senhor.

A cidade de Corinto.

Uma das quatro cidades mais importantes do Império Romano, segundo alguns estudiosos considerada a cidade mai opulentas do Império.

Terrivelmente afetada pela licenciosidade, este era um dos seus maiores aspectos quanto à imoralidade praticada pelos seus habitantes. Situada aproximadamente 64 quilômetros a sudoeste de Atenas, na península do Peloponeso. Ficava numa posição estratégica e privilegiada, pois facilitava o acesso aos portos de trocas existentes naquele período. Possivelmente os grandes fluxos de pessoas vindas das várias partes do Império Romano circulavam pela cidade diariamente.

Outro aspecto importante a elencar, é que esta cidade era dominada pela idolatria e por toda forma ritos pecaminosos. O apóstolo chegou nesta cidade em sua segunda viagem missionária, como se lê em Atos 18.1,18. O evangelista encontrou grande dificuldade para ministrar a palavra de nosso Senhor Jesus aos judeus e gregos vers.6. Paulo permaneceu ali um ano e seis meses (Atos 18.11), ensinando a palavra do Senhor. Observemos que foi a partir da fundação da igreja em Corinto, pelo apóstolo Paulo, que a pregação aos gentios tornou-se mais evidente, no seu ministério. E foi pela ordenação do Senhor que Paulo inicia em Corinto a busca por aqueles que realmente necessitavam de salvação (Atos 18.6,10).

Uma cidade corrompida.

Paulo chegou a Corinto provavelmente em 57 d.C, e com certeza encontrou uma população envolvida com uma vida de extrema pobreza espiritual. O aspecto religioso daquele período mostra-nos que Corinto além de ser uma cidade importante para comércio servia como um centro de adoração a deusa Venus, uma entidade cultuada pelos habitantes daquela cidade. Segundo alguns estudiosos o templo em Corinto abrigava mais de mil prostitutas que praticavam todo o tipo de torpezas. Existiam ainda vários outros deuses que eram adorados em muitos templos espalhados pela cidade. Quiçá num ambiente tão hostil, isto falamos dos rudimentos aos quais aquele povo fora criado (Gl 4.3; Cl 2.8;Cl 2.20), seja fácil compreendermos a dificuldade de Paulo em combater o pecado e as divisões dentro da igreja. E isto é evidenciado na angústia que Paulo sentia ao escrever sua primeira carta aos irmãos em Corinto. No capitulo 5 de 1° Coríntios, fica evidenciado até a que ponto aqueles crentes foram influenciados pela corrupção social existente. Paulo condenou a prática daquele pecado.

E desta forma escreve o versículo que diz; “Geralmente se ouve que há entre vós fornicação, e fornicação tal, que nem ainda entre os gentios se nomeia, como é haver quem abuse da mulher de seu pai. Estais ensoberbecidos, e nem ao menos vos entristecestes por não ter sido dentre vós tirado quem cometeu tal ação” (1° Cor. 5 1,2), percebe-se que aqueles irmãos não fizeram nada para combater aquele pecado.

Contudo, nos parece que o pecado em si não fosse o mais agravante para aqueles irmãos, pois numa sociedade corrompida, todo o fato que causa estranheza é tratado como atípico e facilmente tolerável. E isto se enquadra também as leis que agem na sociedade e podem influenciar a igreja. Portanto, o mesmo pecado cometido naquela sociedade, isto tido como normal, pode infiltrar-se na igreja e ao menos tempo ser “tolerado”. E se considerarmos os “tais rudimentos” poderíamos dizer que aquela igreja refletia no seu interior aspecto de uma sociedade que precisava urgentemente de socorro espiritual.

Paulo e a sua autoridade.

Ao iniciar sua segunda carta, Paulo trás para seus leitores um sentimento de consolo em relação às tribulações que aquele momento necessitava. Naquele momento havia a necessidade do apóstolo defender o seu ministério, ou seja, falar de si mesmos, abrindo a oportunidade para que aqueles que ali estavam pudessem conhecer realmente o desejo amoroso que Paulo nutria pelos seus irmãos. Paulo apela para o princípio maior da consolação que é proveniente da salvação; “E a nossa esperança acerca de vós é firme, sabendo que, como sois participantes das aflições, assim o sereis também da consolação”. (I Cor. 1.7).

Paulo nos ensina que em relação às dificuldades, todos nós participamos das tribulações, e com certeza participaremos das consolações. Este princípio de coletividade está bem delimitado neste versículo. Pois é através da coletividade, que ocorre dentro do corpo que é a igreja, onde é gerido o reino de Deus na terra. A coletividade nos sofrimento, que são causados pelas tribulações, afeta toda a igreja.

Pois o sofrimento de um, causa dor em todo corpo, mas quando a alegria chega, todos são beneficiados pelo consolo; “como sois participantes das aflições, assim sereis também da consolação”.A palavra consolação deriva da palavra grega “paraklh,sewj” (parakléseos), que em seu significado literal é conforto. Desta forma, aqueles irmãos estariam conseguindo conforto da parte de Deus no meio das tribulações. Talvez a opção pelo apóstolo em começar a sua carta com uma palavra tão expressiva. Portanto o consolo está simplesmente em confiar em Deus no meio das angustias; “Porque, como as aflições de Cristo são abundantes em nós, assim também é abundante a nossa consolação por meio de Cristo.” (I Cor. 1.5).

A preocupação com a obra do Senhor.

Por esperar uma resposta sobre igreja de Corintos, que era trazida por Tito, Paulo angustiava-se por não ter noticias sobre aqueles irmãos (I Cor. 2.13). Paulo não poderia naquele momento ir até aquela igreja, mas precisava saber o que realmente estava acontecendo. Existe a necessidade do obreiro saber como estão as suas ovelhas, e isto muitas vezes causa inquietação, fadigas, noites de sonos e perturbações na alma. Paula sabia que as coisas não iam muito bem, havia a urgência de transmitir uma resposta para aqueles queriam arruinar o seu ministério e a sua autoridade. “Não tive descanso no meu espírito, porque não achei ali meu irmão Tito; mas, despedindo-me deles, parti para a Macedônia.” (vers.13).

Hoje com o advento das novas tecnologias, a comunicação ficou muito fácil, e nós podemos estar em qualquer parte do mundo e ter acesso a contas bancárias, email, vídeos ou participar de eventos pela internet. Podemos até, ao ler este pequeno estudo, estarmos falando com alguém a milhares de quilômetros de distância, esta é a vantagem da tecnologia da comunicação, e isto não era possível no tempo de Paulo.

A segunda carta aos Coríntios foi escrita provavelmente na província da Macedônia, possivelmente em Filipos. Filipos ficava ao norte da Grécia, e foi a primeira igreja fundada na Europa (Atos 6.12,40). A distância era enorme e por isso a urgência de informação se fazia necessária.

Nos dias hodiernos existem as tecnologias e vemos como é difícil conseguimos que o evangelho chegue a todas as pessoas. Parece até um paradoxo, temos a forma de enviar a mensagem, mas nunca teremos a certeza de que estaremos sendo compreendidos. “Porque nenhumas outras coisas vos escrevemos, senão as que já sabeis ou também reconheceis; e espero que também até ao fim as reconhecereis”. ( II Cor. 1.12)

Conclusão

Com certeza tiraremos grandes e preciosos ensinamentos ao estudarmos a segunda carta de Paula aos Coríntios. Somente as ricas misericórdias do Senhor são capazes de nos fazer entender a sua vontade concernente a sua obra.

Que nestes últimos dias o Senhor Jesus possa levantar em nosso meio; homens com coragem, determinação e acima de tudo com caráter, para enfrentas os grandes ardis de satanás. A igreja atual necessita que as mãos do Senhor estejam estendidas sobre ela, e que o Espírito Santo continue a operar grandes maravilhas em nossas vidas.

Bibliografia

BOYER Orlando, Pequena Enciclopédia Biblica. Rio de Janeiro, CPAD.

FOX John, O Livro dos Martires, Trad. Marta Doreto de Andrade e Degmar Ribas Júnior. Rio de Janeiro, CPAD 2001.

JOSEFO Flavio, Historia dos Hebreus. Trad. De Vicente Pedroso. Rio de Janeiro, CPAD, 199O.

HENRY Matteu, Comentário Bíblico, Trad. Degmar Ribas Júnior. Rio de Janeiro, CPAD 2002.

Novo Testamento Interlinear Grego-Português, Sociedade Bíblica do Brasil. São Paulo 2004.

Elaboração por:- Presb. Juarez Alves

Professor de História.

Formação Teológica ETAD.

28 de dezembro de 2009

A RELEVÂNCIA DA VIDA DE PAULO NA IGREJA DE CORINTO

A RELEVÂNCIA DA VIDA DE PAULO NA IGREJA DE CORINTO

Paulo foi e é um personagem do Novo Testamento que se identifica com a igreja de hoje. Neste primeiro trimestre, estaremos dando seqüência ao estudo das cartas de Paulo aos coríntios. Especialmente a segunda carta tem um caráter bem pessoal e foi escrita quase um ano depois da primeira enviada à igreja de Corinto. Porém, neste artigo, queremos destacar alguns aspectos fascinantes da vida do apóstolo Paulo, os quais deixaram lições preciosas para todos os tempos da vida da Igreja na Terra.

Missionário e plantador de igrejas, especialmente na Asia Menor e Europa, Paulo se destacou pela sua ousadia e amor ao Senhor Jesus. Por causa de seu passado

religioso judeu radical, não lhe faltaram questionamentos, levantados por outros judeus, que duvidavam da autenticidade de seu apostolado e da sua mensagem.Havia quem duvidasse até mesmo de sua conversão a Cristo e, por isso, rejeitavam seus ensinos. Ele enfrentou a influência do helenismo grego através da filosofia do gnosticismo sobre os cristãos espalhados na Ásia Menor e na Europa.

Mas, Paulo enfrentou ameaças de morte porque era capaz de contender com com judeus radicais e com os filósofos de sua época.

No campo da teologia, Paulo tinha uma boa formação da escola judaica quando fi aluno de mestres respeitados como Gamaliel. Reuniu o que sabia e com a revelação do Espírito Santo, foi um sistematizador da teologia do Novo testamento, sem diminuir os demais apóstolos, pais da igreja. Ele deu uma nova roupagem a teologia judaica do Antigo Testamento, apresentando uma teologia nova em que Cristo se tornou o ponto convergente da vida da Igreja

Nos dias de Paulo, no primeiro século da Era Cristã, o Império Romano abrangia parte da Europa, da Asia Menor e norte da Africa.Cesar Augusto ascendeu ao poder romano em 3l aC. e teve um período de quase um século (ate 68 dC) de grande progresso e paz período conhecido como o da pax romana. Havia muito comércio, cultura e religiosidade em todo o império, especialmente em Roma. A religiosidade do povo era politeísta ( I Co 8.5), com os deuses romanos e os gregos representados, não só em templos, mas expostos em obras de escultura nas praças públicas. Paulo enfrentou dificuldades ao pregar que havia apenas um Deus e, por isso, em todo o império, onde ele visitava, grandes polemicas e debates teológicos existiam, conforme o testemunho dos Atos dos Apóstolos e as epístolas e cartas enviadas as igrejas.

As cartas à igreja de Corinto

Corinto tem sua posição geográfica numa estreita faixa de terra entre o Golfo de Corinto e o Golfo Sarônico. Essa posição lhe dava garantias de grande comércio para toda a região ao seu redor.

Segundo os especialistas históricos e geográficos, os comerciantes preferiam fazer seus negócios via Corinto, porque algumas regiões junto ao mar Egeu eram perigosas e rochosas, e provocavam ventos fortes que podiam submergir suas embarcações. Por isso, na rota de Roma para o Oriente, o caminho era facilitado pelo fato de Corinto fazer parte da colônia romana.

Corinto era a menos romana de todas as cidades da Ásia Menor. Nela, viviam pessoas de vários povos e nações, por causa do comércio e da cultura desenvolvida na cidade. Corinto era a capital da Acaia. Por essas características cosmopolitas, a cidade atraía gente de todos os lados. Paulo percebeu que era uma oportunidade ímpar para se pregar o Evangelho de Cristo e formar uma igreja naquela cidade.

Paulo cumpre seu papel apostólico na cidade

Ao chegar a Corinto, Paulo vinha de uma experiência um pouco frustrante em Filipos, onde enfrentou grande oposição de judeus fanáticos. Essa oposição não foi menor em Tessalônica e Beréza. Só em Atenas ele conseguiu algum sucesso com a sua pregação Quando foi a Corinto, seus companheiros de ministério, Silas e Timóteo, estavam na Macedônia e ele teve de enfrentar sozinho inicialmente as dificuldades iniciais de semear o Evangelho naquela cidade. Ao chegar a Corinto, tinha conhecimento de um casal de cristãos, Áquila e Priscila, que eram judeus que haviam saído de Roma por causa da expulsão por decreto do Imperador Cláudio. Áquila e Priscila eram fabricantes de tendas e Paulo juntou-se a eles para fabricar tendas para poder subsistir naquela terra.

A despeito da oposição dos judeus à sua presença nas sinagogas da cidade, confrontava a todos com a revelação de que Jesus Cristo era o cumprimento das profecias bíblicas. A igreja foi formada com oposições de todos os lados, mas prosseguiu crescendo em número, tendo Apolo, um expositor veemente da Palavra, como continuador da obra em Corinto (At 18.26-28). Paulo continuou seu ministério itinerante dando assistência a outras igrejas na Ásia Menor.

PAULO ENFRENTOU SERIAS OPOSIÇÕES AO SEU MINISTERIO EM CORINTO

Ao escrever a Primeira Carta aos Coríntios, a referida carta desapareça conforme Paulo cita em l Cormtios 5.9. Posteriormente, ele escreveu outra carta, presumivelmente levada por Estéfanas, Fortunato e Acaico ( I Co 16.17), e nesta carta Paulo foi incisivo acerca de alguns problemas de ordem moral e doutrinaria. Por isso, ele enviou Timóteo para tomar conhecimento dos grandes problemas e procurar amenizar a situação que era grave. Na Segunda Carta, Paulo continuou a tratar de certos problemas, especialmente aqueles que foram levantados com falsas denúncias contra sua vida e que questionavam seu apostolado. Eram pessoas que suspeitavam da sua coerência e boa vontade para com a igreja.

Paternidade literária da Carta

Os críticos literários, estudiosos sérios, que se preocupam com a autenticidade de um documento, chegaram à conclusão deque não há dúvidas quanto à autoria das Cartas aos Coríntios. Na análise textual, os assuntos tratados sugerem a ideia das duas serem uma só carta. Entretanto, os especialistas concordam que as duas cartas diferem em si, e não representam, como entendem, tratar-se de uma compilação de várias cartas. Por essa razão, sugerem algumas divisões de assuntos tratados nas cartas, mas, inevitavelmente, cada uma das cartas tem sua própria linguagem nos assuntos tratados pelo autor. As provas textuais depois de analisadas não deixam dúvidas de que cada uma delas, mesmo sendo dirigidas à mesma igreja, tratam de assuntos parecidos, mas distintos. Não há dificuldade em aceitar a unidade dos assuntos tratados pelo apóstolo.

Propósito da Carta

Ao escrever esta Segunda Carta, Paulo estava preocupado com a vulnerabifidade dos cristãos expostos às influências negativas dos seus oponentes. Ele desejava voltar a estabelecer a confiança que os coríntios tinham quanto à sua pessoa e seu ministério. Havia no seio da igreja amigos fiéis e leais que o conheciam e o amavam, e ele não queria perder essa relação positiva com esses irmãos. Por isso, nesta carta, ele se obriga a fazer uma autorecomendação com uma forma particular de comunicar-se para defender-se das acusações injustas feitas contra ele.

As duas cartas diferem em tom e teor dos assuntos tratados. Na primeira, além dos aspectos doutrinários de ordem moral e de ordem teológica, Paulo doutrinou a igreja acerca dos dons espirituais e como administrá-los. Na segunda, Paulo foi incisivo em defender seu apostolado das acusações injustas que colocavam

“Percebe-se, nos seus escritos,

uma mescla de severidade e

ternura, de exortação e louvor,

de gratidão e indignação, de

humilhação e exaltação”

em dúvida seu ministério apostólico. Alguns oponentes haviam se infiltrado no seio da igreja promovendo dissensões e rejeição a sua pessoa, mas Paulo tratou com firmeza sua posição em nome de Cristo. Ele abordou alguns assuntos teológicos que requeriam clareza e revelação e, graças à sua mente zelosa e à ação do Espírito Santo, esses assuntos se constituem até hoje elementos de doutrina cristã. Ele destacou o ensino sobre a Nova Aliança (2.12 a 4.6); o ministério da reconciliação dado a igreja (5.11-21) e assuntos relacionados com a obra expiatória de Cristo (4.8-12; 6.4-10).

Paulo deu um ensino sobre a administração financeira, ao falar das coletas levantadas em prol da obra, que serve de base para o ensino do assunto na igreja hoje (8.1 a 9.15). A defesa do seu apostolado tem um sentido histórico porque o modo como Paulo fez essa defesa valorizou o ministério pastoral e projetou o cuidado que se deve ter em relação à unção recebida. Quando atingida de forma irracional, essa unção se constitui numa muralha espiritual para aqueles que ministram a Palavra de Deus. Desrespeitar essa unção ofende ao Espírito Santo. Por isso, a autoridade apostólica é aquela que é exercida sob a égide do Espírito Santo.

Paulo era arguto nas ideias que defendia. Sua maneira de falar e de escreve± eram típicas de um coração tocado pelo Evangelho. Ao estudar suas cartas, entramos no seu coração. Vemos seus motivos, suas angústias, suas alegrias, seus temores, suas esperanças, seus sentimentos feridos, seu amor ardente. O estilo como se comunica é irregular, porque transparece um homem de temperamento forte e multo emotivo. A vivacidade do pensamento corre de um ponto para outro com rapidez.

Sua linguagem chega a ser pitoresca, porque abundam metáforas que ilustram as verdades que inundavam seu coração. É evidente que toda a carta foi escrita sob tensão e emoções profundas. Percebe-se, nos seus escritos, uma mescla de severidade e ternura, de exortação e louvor, de gratidão e indignação, de humilhação e exaltação. Todos esses elementos de sua personalidade e espiritualidade revelam um homem como nós, totalmente dependente do Espírito Santo para fazer a obra de Cristo. Acima de tudo, a paixão que o consumia era servir ao Senhor Jesus Cristo de corpo, alma e espírito.

Ensinador Cristão 1º. Trimestre 2010

Elienai Cabral é líder da AD em Sobradinho (DE), articulista, escritor e comentarista deste trimestre das Lições Bíblicas para Jovens e Adultos, que trata de 2Coríntios.

15 de novembro de 2009

Origem, Natureza e Conseqüências do Pecado

Origem, Natureza e Conseqüências do Pecado

O ensino bíblico a respeito do pecado apresenta nitidamente dupla face: a depravação abissal da humanidade e a sobrepujante glória de Deus. A sombra do pecado está sobre cada aspecto da existência humana. Fora de nós, o pecado é um inimigo que seduz; por dentro, compele-nos ao mal, como parte de nossa natureza caída. Nesta vida, o pecado é intimamente conhecido, ainda que permaneça estranho e misterioso.

Promete a liberdade, mas escraviza, produzindo desejos que não podem ser satisfeitos. Quanto mais nos debatemos pata escapar ao seu domínio, inextricavelmente nos enlaça. Compreender o pecado nos ajuda no conhecimento de Deus, porém o pecado distorce até mesmo nosso conhecimento do próprio-eu. Mas se a luz da iluminação divina consegue penetrar essas trevas, e não somente as trevas mas também a própria luz, então poderão ser melhor analisadas.

Percebe-se a importância prática do estudo do pecado na sua gravidade, O pecado é contra Deus. Afeta a totalidade da criação, inclusive a humanidade. Até mesmo o menor dos pecados pode provocar o juízo eterno. E o remédio para o pecado é nada menos que a morte de Cristo na cruz. Os resultados do pecado abrangem todo o terror do sofrimento e da morte. Finalmente, as trevas do pecado demonstram - num contraste nítido e terrível a glória de Deus.

A importância prática do estudo da natureza do pecado também pode ser percebida no seu relacionamento outras doutrinas, O pecado distorce todos os conhecimentos e lança dúvidas sobre eles. Ao defendermos a fé cristã, defrontamos com um dilema ético: como pode existir o mal no mundo governado por um Deus onipotente e inteiramente bom?

O estudo da natureza divina deve considerar o controle providencial de Deus sobre um mundo amaldiçoado pelo pecado. O estudo do Universo deve descrevê-lo como tendo sido criado bom, mas que agora geme, ansiando pela redenção.

O estudo da humanidade deve considerar a natureza humana, que se tornou grotescamente desumana e desnaturada. A doutrina de Cristo depara-se com a pergunta de como a natureza plenamente humana do Filho de Deus, nascido de uma virgem, pode ser totalmente impecável. O estudo da salvação deve declarar não somente para qual destino a humanidade é salva, mas também de qual destino foi resgatada. A doutrina do Espírito Santo deve considerar a convicção e a santificação, levando em conta a carne pecaminosa. A doutrina eclesiástica deve adaptar seu ministério a essa humanidade distorcida pelo pecado, dentro e fora da Igreja.

O estudo dos tempos do fim precisa descrever, e também defender, o juízo divino contra os pecadores mesmo tempo que aponta o fim do pecado. Finalmente, cabe à teologia prática evangelizar, aconselhar, educar, governar a Igreja, influir na sociedade e encorajar a santidade a despeito do pecado.

O estudo do pecado, entretanto, apresenta muitas dificuldades. E revoltante, pois focaliza a fealdade grosseira do pecado generalizado e flagrante e o logro sutil do secreto e pessoal. A sociedade pós-cristã de hoje reduz o pecado a sentimentos ou atos, desconhecendo ou rejeitando totalmente o mal. Mais insidiosamente, o estudo do pecado é frustrado pelo próprio mal, uma vez que este é irracional por natureza.

O número de conceitos extrabíblicos é imenso. A despeito de não serem bíblicos, estudá-los é importante porque nos permite:

(1) pensar mais clara e biblicamente a respeito do Cristianismo;

(2) defender melhor a fé e elaborar uma crítica mais correta dos outros sistemas;

(3) avaliar mais critica- mente as novidades em psicoterapias, programas políticos, abordagens educacionais, e assim por diante; e

(4) ministrar de modo mais eficaz aos crentes e não-crentes que mantêm essas e outras idéias antibíblicas.

Muitas teorias, tomando como ponto de partida o existencialismo de Søren Kierkegaard, argumentam que os seres humanos enfrentam um dilema quando suas limitadas capacidades são inadequadas para satisfazer as possibilidades e escolhas virtualmente limitadas de suas percepções e imaginações. Tal situação produz tensão, ansiedade. O pecado é a tentativa fútil de se resolver a tensão, através de meios inapropriados, ao invés de aceitá-la de modo pessimista ou, no modo cristão de pensar, voltar-se para Deus.

Num desdobramento mais radical, argumenta-se que a existência individual é um estado pecaminoso porque as pessoas estão alienadas da base da realidade (freqüentemente definida como “deus”) e umas das outras, mutuamente. Esse tema já aparece em forma primitiva com o filósofo judaico Filo. Atualmente, expressam-no teólogos liberais, como Paul Tillich, muitas das religiões orientais e o pensamento da Nova Era.

Alguns acreditam que o pecado e o mal não sejam reais, porém meras ilusões que podem ser vencidas pela percepção correta. A Ciência Cristã, o hinduísmo, o budismo, o pensamento positivo de alguns tipos de cristianismo popular, boa parte da psicologia e aspectos do movimento da Nova Era.

O pecado também tem sido interpretado em termos dos restos não evolvidos de características animais primevas, como a agressão. Os defensores dessa idéia dizem que a história do Éden é realmente um mito a respeito do desenvolvimento da consciência moral, e não uma queda.

A teologia da libertação entende que o pecado é a opressão de um grupo da sociedade por outro. Os teólogos da libertação freqüentemente combinam as teorias econômicas de Karl Marx (que falam da luta entre as classes, em que o proletariado acabará vencendo a burguesia) com temas bíblicos (tais como a vitória de Israel contra a escravidão) e também identificam os oprimidos pelo emprego de termos econômicos, raciais, de distinção entre os sexos e outros, O pecado é eliminado pela remoção das condições sociais que provocam a opressão.Os extremistas propõem a derrubada violenta dos opressores irredimíveis, ao passo que os moderado dos enfatizam a mudança através da ação social e da educação.

Entre os mais antigos conceitos de pecado está o dualismo, a crença de que há uma luta entre forças preexistentes iguais (virtual ou realmente) os deuses do bem e do mal. As duas forças cósmicas, com sua luta, são a causa da pecaminosidade na esfera temporal. Muitas vezes, a matéria má (especialmente a carne) ou contém ou realmente é pecado, que deve ser conquistado. Essa idéia aparece nas religiões do Oriente Próximo antigo, como o gnosticismo, o maniqueísmo e o zoroastrismo. Em muitas versões do hinduísmo e do budismo, bem como na sua descendente, a Nova Era, o mal é reduzido a uma necessidade amoral.

A teologia moderna vê “deus” como finito ou até mesmo em evolução moral. E o mundo sofrerá males enquanto o lado escuro da natureza divina não for controlado, idéia típica da mistura que a teologia do processo faz com a física e o misticismo oriental.

Grande parte do pensamento popular, o desinformado, o islamismo e muitos sistemas moralistas sustentam que o pecado consiste somente em ações delibera- das. Pessoas moralmente livres simplesmente fazem escolhas livres. Não existe a natureza pecaminosa, apenas eventos reais do pecado. A salvação é simplesmente comportar-se melhor e praticar o bem.

O ateísmo sustenta que o mal é meramente uma probabilidade de um cosmos sem Deus. O pecado é rejeitado, a ética é apenas questão de preferência, e a salvação, mera autopromoção humanística.

Embora muitas dessas teorias pareçam conter algum discernimento, nenhuma delas aceita a Bíblia como revelação plenamente inspirada.

As Escrituras ensinam que o pecado é real e pessoal; que se originou na queda de Satanás, um ser pessoal, maligno e ativo; e que, através da queda de Adão, propagou-se entre a humanidade, que fora criada boa por um Deus totalmente bom.

OS COMEÇOS DO PECADO

A Bíblia refere-se a um evento nos recônditos mais distantes do tempo, além da experiência humana, quando o pecado se tornou uma realidade. Uma criatura extraordinária, a serpente, já estava confirmada na iniqüidade antes de “o pecado entrar no mundo” através de Adão (Rm 5.12; ver Gn 3).

Essa antiga serpente aparece em outros lugares como o grande dragão, Satanás e o diabo (Ap 12.9; = 20.2). O diabo tem andado pecando e assassinando desde o princípio (Jo 8.44; = 1 Jo 3.8). O orgulho (1 Tm 3.6) e uma queda de anjos (Jd 6; = Ap 12.7-9) também se associam a essa catástrofe

As Escrituras também nos ensinam a respeito de outra queda: Adão e Eva foram criados “bons” e colocados num jardim idílico, no Éden, desfrutando de estreita comunhão com Deus (Gn 1.26 — 2,25), Por não serem divinos e porque eram capazes de pecar, era necessária uma contínua dependência de Deus. Semelhantemente, precisavam comer regularmente da árvore da vida.

Isto nos é sugerido pelo convite a comer de todas as árvores, inclusive da árvore da vida, antes da Queda (2.16), e pela rigorosa proibição depois desta (3.22,23). Houvessem obedecido, teriam sido frutíferos e alegres para sempre (1.28-30).

Alternativamente, após um período de prova, poderiam conseguir um estado mais permanente de imortalidade, mediante a trasladação para o Céu (Gn 5.21-24; = 2 Rs 2.1-12) ou pela ressurreição do corpo sepultado na terra (cf. os crentes, 1 Co 15.35-54)

Deus permitiu que o Éden fosse invadido por Satanás, o qual tentou Eva com astúcia (Gn 3.1-5). Desconsiderando a Palavra de Deus, Eva entregou-se ao desejo por beleza e sabedoria. Tomou do fruto proibido, ofereceu-o ao seu marido e juntos comeram-no (3.6). Eva fora enganada pela serpente, mas Adão parece ter pecado em plena consciência (2 Co 11.3; = 1 Tm 2.14; Deus concorda tacitamente com esse fato em Gn 3.13-19). É possível que Adão tenha recebido do próprio Deus a proibição de comer da árvore e que Eva a tenha ouvido somente através do marido (Gn 2.17; = cf. 2.22).

Adão, portanto, tinha mais responsabilidade diante de Deus, e Eva era mais suscetível diante de Satanás (cf. Jo 20.29).

Talvez seja esta a explicação da ênfase que a Bíblia atribui ao pecado de Adão (Rm 5.12-21; = 1 Co 15.21,22), embora, na realidade, Eva tenha pecado primeiro. Finalmente, é crucial observar que o pecado deles começou na sua livre escolha moral, e não na tentação (a que poderiam ter resistido; 1 Co 10.13; = Tg 4.7). Isto é, embora a tentação os incentivasse a pecar, a serpente não colheu o fruto tampouco os forçou a comê-lo. O casal optou por assim fazer.

O primeiro pecado da humanidade abrangeu todos os demais pecados: a afronta e desobediência a Deus, o orgulho, a incredulidade, desejos errados, o desviar outras pessoas, assassinato em massa da posteridade e a submissão voluntária ao diabo. As conseqüências imediatas foram numerosas, extensivas e irônicas (observe cuidadosamente Gn 1.26 - 3,24). O relacionamento entre Deus e os homens, le franca comunhão, amor, confiança e segurança, foi trocado por isolamento, autodefesa, culpa e banimento. Adão e Eva, bem como o relacionamento entre eles, entraram em degeneração.

A intimidade e a inocência cederam lugar à acusação (jogavam a culpa um sobre o outro). Seu desejo rebelde pela independência resultou em dores de parto, labuta morte. Seus olhos realmente foram abertos, e eles conheceram o bem e o mal (mediante um atalho), mas era pesado esse conhecimento sem o equilíbrio de outros atributos divinos, como o amor, a sabedoria e o conhecimento. A criação, confiada aos cuidados de Adão, foi amaldiçoada, gemendo pela libertação dos resultados da infidelidade dele (Rm 8.20,22).

Satanás, que oferecera a Eva as alturas da divindade e prometera ao homem e à mulher que estes não morreriam, foi mais amaldiçoado que todas as criaturas e condenado à destruição eterna pela descendência de Eva (ver Mt 25.41). Finalmente, o primeiro casal humano trouxe a morte a todos os seus filhos (Rm 5.12-21; = 1 Co 15.20-28).

O Midrash judaico entende a advertência divina de que a morte viria quando (literalmente “no dia em que”), comessem da árvore (Gn 2.17) como uma referência à morte física de Adão (Gn 3.19; = 5.5), pois um dia, aos olhos de Deus, é como mil anos (Sl 90.4) — e Adão viveu apenas 930 anos (Gn 5.5). Outros a entendem como uma conseqüência natural do afastamento da árvore da vida. Muitos rabinos judaicos defendiam a idéia de que Adão nunca foi imortal e que sua morte teria chegado imediatamente se Deus, em sua misericórdia, não a tivesse adiado.

A maioria sustenta que a morte espiritual ou a separação de Deus ocorreu naquele mesmo dia. Não obstante a condenação, Deus graciosamente confeccionou túnicas de peles para Adão e Eva, a fim de substituir os aventais de folhas que eles haviam providenciado por sua própria iniciativa (Gn 37,21).

O PECADO ORIGINAL: UMA ANÁLISE BÍBLICA

As Escrituras ensinam que o pecado de Adão afetou muito mais que a ele próprio (Rm 5.12-21; = 1 Co 15.21,22). Esta questão é chamada pecado original e postula três perguntas: até que ponto, por quais meios e em que base o pecado de Adão é transmitido ao restante da humanidade? Qualquer teoria do pecado original precisa responder as três perguntas e satisfazer os seguintes critérios bíblicos:

Solidariedade.Toda a humanidade, em algum sentido, está unida ou vinculada, como numa única entidade, a Adão (por causa dele, todas as pessoas estão fora da bem-aventurança do Eden; Rm 5.12-21; = 1 Co 15.21,22).

Corrupção. Por estar a natureza humana tão deteriorada pela Queda, pessoa alguma tem a capacidade de fazer o que é espiritualmente bom sem a aluda graciosa de Deus. A esta condição chamamos corrupção total depravação da natureza. Não significa que as pessoas não possam fazer algum bem aparente, apenas que nada do que elas façam será suficiente para torná-las merecedoras da salvação. E este ensino não é exclusivamente calvinista. Até mesmo Armínio (mas não todos os seus seguidores) descreveu o “livre-arbítrio do homem em favor do verdadeiro Bem”, na condição de “preso, destruído e perdido... não tem nenhuma capacidade a não ser aquela despertada pela graça divina”. A intenção de Armínio, assim como depois a de Wesley, não era manter a liberdade humana a despeito da Queda, mas asseverar que a graça divina era maior até mesmo que a destruição provocada pela Queda.

Assim a corrupção é reconhecida na Bíblia. Salmos 51.5 menciona Davi sendo concebido em pecado, ou seja: seu pecado remontava à concepção. Romanos 7.7-24 sugere que o pecado, embora morto, estava em Paulo desde o princípio. Mais categoricamente, Efésios 2.3 declara que todos somos “por natureza filhos da ira. “Natureza” (phusis) fala da realidade fundamental ou origem de corrupto o “conteúdo” de todas as pessoas.

Posto que a Bíblia ensina estarem corrompidos os adultos e que cada um produz o seu igual (Jó 14.4; = Mt 7.17,18; = Lc 6.43), os seres humanos forçosamente produzem filhos corruptos.

A natureza corrupta produzindo filhos corruptos é a melhor explicação da universalidade do pecado. Embora vários trechos dos Evangelhos se refiram à humildade e à receptividade espiritual das crianças (Mt 10.42;= 11.25,26; = 18.1-7; = 19.13-15; = Mc 9.33-37,41,42; = 10.13-16; = Lc 9.46-48; = 10.21; = 18.15-17), nenhum as afirma incorruptas. Realmente, algumas crianças são até mesmo endemoninhadas (Mt 15.22; = 17.18; Mc 7.25; = 9.17).

A pecaminosidade de todos. Romanos 5.12 declara que “todos pecaram”. Romanos 5.18 diz que mediante pecado todos foram condenados, o que subentende que todos pecaram. Romanos 5.19 diz que mediante o pecado de um só homem todos foram feitos pecadores. Textos que falam da pecaminosidade universal não fazem exceçóes à infância. Crianças impecáveis seriam salvas sem Cristo, mas isto é antibíblico ( Jo 14.6; = At 4.12). Ser merecedor de castigo também indica o pecado.

Ser merecedor de castigo. Todas as pessoas, as crianças pequenas, estão sujeitas ao castigo. “Filhos da ira” (Ef 2.3) é um semitismo que indica o castigo divino (cf. 2 Pe 2.14). As imprecações bíblicas contra crianças (Sl 137.9) indicam esse fato. E Romanos 5.12 diz que a morte física (cf. 5.6-8,10,14,17) chega a todos porque todos tem pecado, aparentemente até as crianças.

As crianças, antes da idade de responsabilidade ou consentimento moral (a idade cronológica provavelmente varia com o indivíduo), não são pessoalmente culpadas. As crianças não têm o conhecimento do bem e do mal (Dt 1.39; cf. Gn 2.17). Romanos 7.9-11 declara que Paulo “vivia” até à chegada da lei mosaica (cf. 7.1), a qual fez “reviver o pecado”, que o enganou e matou espiritualmente.

A salvação das crianças. Embora as crianças sejam consideradas pecadoras e, portanto, passíveis do inferno, isso não significa que serão realmente mandadas para lá.

Várias doutrinas indicam diferentes mecanismos para a salvação de algumas ou de todas: a eleição condicional dentro do calvinismo; o batismo das crianças dentro do sacramentalismo; a fé preconsciente; a presciência de Deus de como a criança teria vivido; a graciosidade específica de Deus para com as crianças; a aliança implícita uma família crente (talvez incluindo a “lei do coração”, Rm 2.14,15), que toma o lugar da aliança com Adão; graça preveniente (do latim, “que vem antes da” salvação) que oferece a expiação a todos que não têm idade para a prestação de contas. De qualquer maneira, podemos estar certos de que o “Juiz de toda a terra” faz tudo com justiça (Gn 18.25)

O paralelo entre Adão e Cristo, Romanos 5.12-21 e, grau menor, 1 Coríntios 15.21,22 enfatizam um nítido paralelo entre Adão e Cristo. Romanos 5.19 é especialmente relevante: “Porque, como, pela desobediência de um só homem [Adão], muitos foram feitos (kathístêmi] pecadores, assim, pelo obediência de um [Cristo] muitos serão feitos (kathistêmi) justos”. No Novo Testamento, kathistémi tipicamente se refere a uma pessoa nomeando outra para um cargo. Nenhum ato propriamente dito é exigido para receber o cargo. Logo, pessoas que não haviam pecado especifica- mente poderiam ser feitas pecadoras por Adão. Paralela- mente à obra de Cristo, Adão, por um ato legal, pode qualificar as pessoas como pecadoras, mesmo não havendo pecado da parte delas. (Que a pessoa precisa “aceitar Cristo” para ser salva não pode fazer parte desse paralelo, pois crianças incapazes de conscientemente aceitar Cristo podem ser salvas; 2 Sm 12.23).

Nem todos são iguais a Adão. Algumas pessoas claramente não pecaram da mesma maneira que Adão, meteram outros pecados e morreram (Rm 5.14) ,

O pecado de um só homem. Em Romanos 5.12, Paulo declara repetidas vezes que o pecado de um só homem trouxe condenação e morte (ver também 1 Co 15.2 1,22) a todas as pessoas.

A terra amaldiçoada. Alguma base precisa ser identificada para a maldição lançada por Deus à Terra (Gn 3.17-18).

A impecabilidade de Cristo. E necessário reconhecer que Cristo possuía natureza humana completa, mas totalmente protegida do pecado.

A justiça de Deus. A justiça de Deus, que permitiu ao pecado de Adão passar a outras pessoas, precisa ser preserva

O PECADO ORIGINAL: UMA ANÁLISE TEOLÓGICA

Muitas tentativas foram feitas para construir um modelo ou teoria teológica que encaixassem esses parâmetros complexos. Algumas das teorias mais relevantes são consideradas aqui.

Conceitos judaicos. Três correntes principais são identificadas no judaísmo. A teoria predominante é a das duas naturezas: a boa — yetser tov — e a má – yetser ra (cf. Gn 6.5; 8.2 1). Os rabinos debatiam sobre a idade em que esses impulsos se manifestam, e se o impulso mau é realmente iniqüidade ou apenas instinto natural. Seja como for, os maus são controlados pelo impulso mau, ao passo que os bons o controlam.

A segunda teoria diz respeito aos “vigilantes” (Gn 6.1-4), anjos cujo dever era fiscalizar a humanidade, mas que acabaram pecando com as mulheres. Finalmente, há conceitos de pecado original que antecipam o Cristianismo. Mais dramaticamente, o Midrash explica, por analogia, a morte do justo Moisés. Uma criança pergunta ao rei por que ela está na prisão. O soberano responde que é por causa do pecado da mãe dela. Semelhantemente, Moisés morreu por causa do primeiro homem que trouxe mundo. Resumindo, pecado original não é uma inovação paulina. Pelo contrario, Paulo, inspirado pelo Espírito Santo, desenvolveu-o de conformidade com a revelação progressiva.

O agnosticísmo. Há os que sustentam não haver evidências bíblicas suficientes para uma teoria detalhada do pecado original. Qualquer assertiva quanto à pecaminosidade que vá alem de uma conexão entre Adão e a raça humana é considerada especulação filosofica.

Embora esteja correto que a doutrina não deve basear-se em especulações extra-bíblicas, é válida a dedução das Escrituras.

O pelagianismo. O pelagianismo enfatiza fortemente a responsabilidade pessoal na oposição à frouxidão moral. Pelágio (c. de 361 — c. de 420 d.C.) ensinava que a justiça de Deus não permitiria a transferência do pecado de Adão a outras pessoas e que, portanto, todas as pessoas nascem sem pecado e com total livre-arbítrio. O pecado é disseminado exclusiva- mente pelo mau exemplo. Por isso há uma possibilidade real de vidas sem pecado, e elas se acham dentro e fora da Bíblia.

Tudo isso, porém, é antibíblico, além de anular as conexões que a Bíblia faz entre Adão e a humanidade. A morte de Cristo é reduzida tão-somente a bom exemplo. A salvação fica sendo meramente boas obras. A vida nova em Cristo não passa da antiga disciplina. Embora o pelagianismo tenha razão quando enfatiza a responsabilidade pessoal, a santidade e o fato de que alguns pecados são aprendidos, tem sido apropriadamente condenado como heresia.

O semipeiagianismo. O semipelagianismo sustenta que, embora a humanidade tenha se enfraquecido com a natureza de Adão, sobrou livre-arbítrio suficiente para a iniciativa de ter fé em Deus, e então Ele corresponderá. A natureza enfraquecida é transmitida naturalmente a partir de Adão.

Porém, como se sustenta a justiça de Deus após permitir que pessoas inocentes recebam uma natureza maculada e como é salvaguardada a natureza impecável de Cristo, ainda não foi bem explicado.

Mais importante, em algumas formulações o semipelagianismo ensina que, embora a natureza humana esteja tão enfraquecida pela Queda, a ponto de ser inevitável que as pessoas pequem, a bondade inerente que possuem é suficiente para iniciar a verdadeira fé.

A transmissão natural ou genética. Essa teoria sustenta que a transmissão da natureza corrupta baseia-se na lei da herança. Toma por certo que as características espirituais são transmitidas da mesma forma que as naturais. Tais teorias mencionam usualmente a transmissão da natureza corrompida, mas não a da culpa. Mesmo assim, não parece haver base adequada para Deus infligir numa alma virtuosa uma natureza corrupta. Nem está claro como Cristo pode ter uma natureza plenamente humana e ao mesmo tempo livre do pecado.

A imputação mediada. A imputação mediada entende que Deus imputou culpa aos descendentes de Adão por meios indiretos, ou mediados. O pecado de Adão o fez culpado e, como castigo, Deus corrompeu-lhe a natureza. E, como ninguém da sua posteridade tomou parte na sua ação, nenhum de seus descendentes é culpado. Mesmo assim, recebem a sua natureza como conseqüência natural de serem descendentes dele (não como julgamento). Porém, antes de cometerem qualquer pecado real ou pessoal (que a sua natureza necessita), Deus os julga culpados de possuir aquela natureza corrompida, Infelizmente, essa tentativa de proteger Deus da inflição injusta da “culpa exclusiva” de Adão à humanidade resulta em acusar Deus de uma injustiça ainda maior — permitir que a corrupção, causadora do pecado, enfraqueça pessoas destituídas de culpa e depois julgá-las culpadas dessa mesma corrupção.

O realismo. O realismo e o federalismo (ver abaixo) são as teorias mais importantes. O realismo sustenta que o “tecido da alma” de todas as pessoas estava real e pessoalmente em Adão (“seminalmente presente”, segundo o conceito traduciano da origem da alma), participando de fato do seu pecado. Cada pessoa é culpada porque, na realidade, cada uma pecou. A natureza da pessoa passa então a ser corrompida por Deus, como julgamento contra aquele pecado. Não há transmissão de pecado, mas a participação total da raça naquele primeiro pecado.

Agostinho (354—430) aperfeiçoou a teoria, dizendo que a corrupção era transmitida mediante o ato sexual. Assim, conseguia manter Cristo livre do pecado original, porque Ele nasceu de uma virgem. W. O. T. Shedd (1820—94) acrescenta um argumento mais sofisticado: por baixo da vontade das escolhas de todos os dias há a vontade profunda, a “vontade propriamente dita”, que determina a direção que a pessoa segue em última análise. Foi essa vontade profunda que realmente pecou em Adão.

O realismo tem pontos fortes. Não apresenta o problema da culpa de terceiros, a solidariedade de Adão e da raça no pecado daquele é levada a sério e parece bem explicada a expressão “todos pecaram”, de Romanos 5.12.

Apresenta, no entanto, alguns problemas. O realismo possui todas as fraquezas do traducianismo extremo. O tipo de presença pessoal necessária em Adão e Eva distorce até mesmo Hebreus 7.9,10 (cf. Gn 46.26), a passagem clássica traducianista. A expressão “para assim dizer” (Hb 7.9), em grego, sugere seja entendido figuradamente o que se segue.

Idéias como a de uma “vontade profunda” tendem a exigir e pressupor um conceito determinista, calvinista, da salvação. O realismo por si só não pode explicar por que ou em que base Deus amaldiçoa a terra.

Portanto, torna-se necessário algo como a aliança. Para a humanidade de Jesus ser isenta de pecado, Ele deve cometido o primeiro pecado em Adão, sendo posteriormente purificado; ou Ele não estava mesmo presente em Adão; ou Ele estava presente mas não pecou, e seus antepassados humanos diretos permaneceram sem pecado em suas gerações. Cada uma dessas opiniões apresenta dificuldades (uma alternativa é sugerida adiante).

A idéia de que todos pecaram pessoalmente parece contradizer o conceito de que o pecado de um só homem fez de todos pecadores (Rm 5.12,15- 19). Posto que todos pecaram em Adão, com Adão e como Adão, sugere terem pecado segundo o padrão do primeiro homem, o que contraria 5.14.

O federalismo. A teoria federal da transmissão sustenta que a corrupção e a culpa se estendem a toda a humanidade porque Adão era a cabeça da raça num sentido representativo, governamental ou federal quando pecou. Toda pessoa está sujeita à aliança entre Adão e Deus (a aliança adâmica ou aliança das obras por contraste à aliança da graça). Faz-se uma analogia com uma nação que declara guerra. Seus cidadãos sofrem; quer concordem com ela ou a condenem e mesmo sem terem participado da decisão.

Os descendentes de Adão não estão pessoalmente culpados até realmente pecarem, mas vivem um estado de culpa e são passíveis do inferno por ter-lhes sido imputado — de conformidade com a aliança o pecado de Adão. Por causa desse estado, Deus os castiga com a corrupção. Muitos federalistas, portanto, distinguem entre o pecado herdado (a corrupção) e o imputado (a culpa) da parte de Adão.

A maioria dos federalistas são criacionistas no tocante à origem da alma, mas o federalismo não é incompatível com o traducianismo. A aliança com Adão incluía sua posição de despenseiro da criação — a base perfeita para Deus amaldiçoar a terra. Cristo, como cabeça de urna nova aliança e de urna nova raça, está isento do julgamento da corrupção sendo, portanto, impecável.

O federalismo tem pontos fortes. A aliança, como base bíblica para a transmissão do pecado, concorda razoavelmente com Romanos 5.12-2 1 e fornece mecanismos para a maldição da terra e para proteger Cristo do pecado. No entanto, apresenta algumas fraquezas. Romanos 7 deve descrever somente o conhecimento que Paulo tomou de sua própria natureza pecaminosa, e não a experiência física do pecado que o matava. Mais importante que isso, a transmissão da “culpa exclusiva” de Adão é freqüentemente considerada injusta.

Uma teoria integrada. Várias das teorias acima podem ser combinadas para formar uma abordagem integrada, resultando numa teoria que faz distinção entre a pessoa individual e a natureza pecaminosa da carne. Quando Adão pecou separou-se de Deus, e isto produziu nele — como indivíduo e a corrupção (inclusive a morte). Pelo fato de ele conter toda a natureza genérica, ela toda ficou corrompida.

A natureza genérica é transmitida naturalmente ao aspecto individual da pessoa, o “próprio-eu” (como em Rm 7). A aliança adâmica é a justa base dessa transmissão e também da maldição contra a terra. O “eu” não é corrompido nem culpado por causa da natureza genérica, natureza genérica o impede de agradar a Deus (Jo 14.21; = 1 Jo 5.3). Ao chegar à idade da responsabilidade pessoal, o “eu”, lutando contra a natureza, ou corresponde à graça preveniente de Deus na salvação ou realmente peca ao desconsiderá-la, de modo que o mesmo “eu” fica separado de Deus, tornando-se culpado e corrupto.

Deus continua estendendo a mão para o “eu” mediante a graça preveniente, e o ele poderá aceitar a salvação.

Logo, Romanos 5.12 pode dizer que “todos pecaram” e que todos estão corrompidos e necessitando de salvação, mas nenhuma culpa é infligida àqueles que ainda não pecaram na realidade Isto é consistente com a luta descrita em Romanos 7. Nem todas as pessoas pecam da mesma forma que Adão (Rm 5.14), mas o pecado de um só homem realmente traz a morte e transforma todos em pecadores. E o faz mediante a aliança adâmica, um mecanismo paralelo à obra de Cristo, que é tornar justos os pecadores (Rm 5.12-21). Evita-se o semipelagianisino extremado, porque o “eu” é capaz reconhecer a sua necessidade mas não pode agir com fé por causa da natureza humana genérica (Tg 2.26). Sendo o ficar separado de Deus a causa da corrupção, a união entre Cristo e sua parte da natureza genérica restaura-a à santidade. Por ter o Espírito Santo chegado a Maria na concepção do “eu” humano de Cristo, este era pré-responsável e, portanto, impecável. Essa disposição é justa, pois Cristo é o cabeça de uma nova aliança. Semelhantemente, a união entre o Espírito Santo e o crente na salvação é regeneradora.

Embora as Escrituras não afirmem explicitamente que a aliança é a base para a transmissão, há muitas evidências em favor dessa idéia.

As alianças fazem parte fundamental do plano de Deus (Gn 6.18; = 9.9-17;= 15.18; = 17.2-21; = Ex 34.27,28; = Jr 31.31; = Hb 8.6,13; = 12.24).

Houve urna aliança entre Deus e Adão. Oséias 6.7 — “Mas eles traspassaram o concerto, como Adão” — refere-se muito provavelmente aliança, uma vez que a tradução alternativa (“homens”, NIV margem) é tautológica. Hebreus 8.7, que diz ter sido a aliança com Israel a primeira, não exclui a aliança com Adão, pois o contexto indica que se trata da primeira aliança entre Deus e Israel (e não com a humanidade inteira).

E há uma aliança (a Bíblia ARC emprega “pacto”, “concerto” e “aliança” como sinônimos) explícita anterior, com Noé (Gn 6.18; 9.9-17). As alianças bíblicas são obrigatórias às gerações futuras, quer para o bem (Noé, Gn 6.18; = 9.9-17) quer para o mal (Josué e os gibeonitas, Js 9.15). As alianças são freqüentemente a única base observável para o julgamento (os israelitas que morreram em Ai por causa do pecado de Acã em Jericó, Js 7; o sofrimento dos súditos de Davi porque este os numerou, 2 Sm 24). A circuncisão segundo a aliança podia até mesmo acolher crianças estrangeiras na nação de Israel (Gn 17.9-14).

Alguns estudiosos objetam que qualquer teoria que transmita a outras alguma conseqüência do pecado de Adão é inerentemente injusta, pois lhe imputa o pecado sem fundamento nem base. (Somente o pelagianismo evita totalmente essa objeção, ao tornar todos os seres humanos pessoalmente responsáveis. O “pecado pré-consciente” do realismo detém a maioria das dificuldades.)

As alianças, no entanto, constituem base justa para esse tipo de transmissão, pelas seguintes razões: os descendentes de Adão teriam sido tão abençoados por causa do seu bom comportamento como foram amaldiçoados por suas obras más; a aliança certamente é mais justa que a mera transmissão genética; a culpa e as conseqüências transmitidas pelo concerto são semelhantes aos pecados da ignorância (Gn 20).

Há também o argumento de que Deuteronômio 24.16 e Ezequiel 18.20 proíbem o julgamento de uma geração para outra.

Mas outros textos mencionam julgamentos assim (os primogênitos do Egito; Moabe; Ex 20.5; = 34.6,7; = Jr 32.18). E possível, no entanto, que os dois textos acima se refiram à chefia biológica como base insuficiente para transmissão de julgamento, ao passo que os textos mencionados entre parênteses referem-se a uma base pactual, adequada à transmissão do julgamento.

Alternativamente, segundo a teoria integrada, se a natureza corrompida não é um juízo positivo de Deus, a execução de um castigo pelo pecado do pai realmente não ocorre. Finalmente, quem, mesmo sem corrupção e dentro do Jardim perfeito, se comportaria melhor que Adão, quanto à obediência aos mandamentos de Deus? E, sem dúvida, a suposta “injustiça” do pecado imputado é mais que contrabalançada pelo dom gratuito da salvação em Jesus Cristo, oferecido a todos livremente

Embora seja especulativa e não sem algumas dificuldades, uma teoria integrada que utilize a aliança parece explicar boa parte dos dados bíblicos e talvez sugira uma terceira alternativa às teorias predominantes do realismo e do federalismo.

EXISTÊNCIA E DEFINIÇÃO DO PECADO

Como pode existir o mal, se Deus é onipotente e totalmente bom?38 Esta pergunta, juntamente com a questão correlata a respeito da origem do mal, é o fantasma que assombra todas as tentativas de se compreender o pecado. Antes de continuarmos este estudo, façamos uma distinção entre algumas formas de mal. O mal moral ou pecado iniqüidade cometida por criaturas dotadas de vontade, O mal natural é a desordem e decadência do Universo (calamidades naturais, algumas doenças.etc.). Está ligado à maldição que Deus pronunciou contra a terra (Gn 3.17,18).

O mal metafísico é aquele involuntário, resultante da finitude das criaturas (insuficiência mental e física etc.)

A Bíblia afirma a perfeição moral de Deus (Sl 100.5; = Mc 10.18) e o seu poder (Jr 32.17; = Mt 19.26). Foi Ele só quem criou (Gn 1.1,2; = Jo 1.1-3), e tudo quanto Ele criou era bom (Gn 1; = Ec 7.29). Ele não criou o mal, a que odeia (SI 7.11; = Rm 1.18). Ele não tenta, nem é tentado (Tg 1,13). Apesar disso, dois textos bíblicos que parecem contradizer esse fato devem ser considerados. Isaías 45.7 diz que Deus cria o mal (ARC). Mas ra (“mal”) também possui um sentido que nada tem que ver com a moralidade (Gn 47.9) ou apresenta-se como antônimo de “paz” (Am 6.3). Pode significar também “desventura”, “calamidade”, “desgraça”, palavras que neste contexto são boas traduções. Deus, portanto, traz o julgamento moral, mas não o mal imoral.

O fato de Deus endurecer ou cegar as pessoas também levanta dúvidas. Pode tratar-se de uma “entrega” passiva em que Deus simplesmente deixa as pessoas viverem conforme desejam (SI 81,12; = Rm 1.18-28;= 1 Tm 4. l,2) ou uma imposição ativa de endurecimento a pessoas que já assumiram um compromisso irrevogável com o mal (Ex 1.8-15.21; = Dt 2.30; = Js 11.20; = Is 6.9,10; = 2 Co 3.14,15; = Ef4.l7-l9; = 2 Ts 2.9-12).

Observe o exemplo de Faraó (Êx 1.8-15.2 1). Ele não foi criado com o propósito de ser endurecido (o que pode sugerir uma leitura superficial de Romanos 9.17: “... te levantei”). O verbo hebraico amad e seu equivalente na Septuaginta (LXX), diatereõ (Ex 9.16), referem-se a posição ou categoria (e não à criação), fato este que está dentro do alcance semântico de exegeiró (Rm 9.17).

Faraó já mereceu o castigo divino quando rejeitou a petição de Moisés pela primeira vez (Ex 5.2). Deus, porém, o preservou, para ser glorificado através do rei egípcio. Inicialmente, Deus apenas predisse o endurecimento do coração de Faraó (4.21, heb. achazzeq, “tornarei forte”; 7.3. heh ‘aqsheh, “tornarei pesado”, ou seja, difícil de ser movido).

Antes de Deus agir, no entanto, Faraó endureceu seu próprio coração (implicitamente, 1.8- 22; = 5.2; e explicitamente, 7:13,14). O coração de Faraó “endureceu-se” (literalmente “tornou-se forte”), aparentemente um modo de reagir ao milagre que removeu a praga, e Deus disse que o coração de Faraó não cedia (heb. kavedh, “estar pesado”,7.22,23; = 8.15,32; = 9.7). Faraó, então, continuou o processo (9.34,35) com a ajuda de Deus (9.12; = 10.1,20,27; = 11.10; = 14.4,8,17).

Esse sistema está explícito em outros casos ou é compatível com eles e com a santa justiça de Deus (Rm 1.18). Por isso Deus pode acelerar a pecaminosidade deliberada, visando seus próprios propósitos (Sl105.25), mas os pecadores continuam arcando com a responsabilidade (Rm 1.20)

Deus não criou o mal, porém realmente criou tudo que existe. Assim, o mal não pode ter uma existência independente. O mal é a ausência ou a perversão do bem. Este fato pode ser ilustrado pelo sal de cozinha, que é um composto (ou mistura compacta) de duas matérias químicas: o sódio e o cloreto. Estes dois elementos, em separado, são altamente mortíferos. O sódio irrompe em chamas ao entrar em contato com a água, e o cloro é um veneno fatal. Assim como a alteração na composição do sal, a criação perfeita de Deus é mortífera quando o pecado lhe estraga o equilíbrio. Das quedas de Satanás e de Adão surge todo o mal. Por isso, o mal natural provém do mal moral. Todas as doenças provêm, em última análise, do mal, porém não necessariamente do pecado daquele que está enfermo (Jo 9.1-3), embora este possa ser o caso (SI 107,17; = Is 3.17; = At 12.23).

A grande ironia de Gênesis 1—3 é que tanto Deus quanto Satanás empregam a linguagem: Deus, num gesto criador, para trazer à existência a realidade e a ordem ex níhilo; e Satanás, de modo imitativo, para trazer engano e desordem. O mal depende do bem, e a obra de Satanás não passa de imitação.

Por ter Deus a capacidade de impedir o mal (isolando a árvore, por exemplo) e não o ter feito, e, por saber o que aconteceria, parece que Ele permitiu que o mal surgisse (isto é muito diferente de causá-lo).

Segue-se que o Deus Santo viu que do permitir o mal surgiria um maior bem. Eis algumas sugestões quanto à natureza desse bem:

(1) que a humanidade amadureceria através do sofrimento (cf. Hb 5.79); (2) que as pessoas poderiam amar a Deus livre e sinceramente, uma vez que tamanho amor só pode existir onde houver a possibilidade do ódio e do pecado;

(3) que as maneiras como Deus se expressa seriam impossíveis de outra forma (tais como seu ódio ao mal, Rm 9.22, e seu amor gracioso aos pecadores, Ef 2: 7). Todos esses pontos de vista têm sua validade.

Descrever o pecado é uma tarefa difícil. Talvez a dificuldade provenha da sua natureza parasítica, posto que não tem existência em separado, mas é condicionado por aquilo a que se agarra. Mesmo assim, delineia-se nas Escrituras uma imagem algo camaleônica da existência derivada do pecado.

Há muitas sugestões a respeito da essência do pecado: a incredulidade, o orgulho, o egoísmo, a rebelião, a corrupção moral, a luta entre a carne e o espírito, a idolatria e combinações entre todos esses itens. Embora todas essas idéias sejam informativas, nenhuma delas caracteriza a totalidade dos pecados (os pecados da ignorância, por exemplo) nem explica adequadamente o pecado como natureza (a pecaminosidade).

De modo mais significativo, todas definem o pecado em termos de pecadores, que são muitos, variados e imperfeitos. Parece preferível definir o pecado como algo cometido contra Deus. Somente Ele é uno, consistente e absoluto, e a qualidade perversa e iníqua do pecado é revelada contra o pano de fundo de sua santidade.

Talvez a melhor definição do pecado seja a encontrada em 1 João 3.4: “O pecado é iniqüidade”. Seja o que mais o pecado for, ele é, no seu âmago, uma violação da lei de Deus. E, já que “toda a iniqüidade [gr. adikia, literalmente “injustiça”} é pecado” (1 Jo 5,17), toda injustiça quebra a lei de Deus. Por isso, Davi confessa: “Contra ti, contra ti somente pequei” (S151.4; = cf. Lc 15.18,21).

Além disso, a transgressão provoca a separação entre a pessoa e o Deus da vida e da santidade, que necessariamente resulta na corrupção (inclusive a morte) da natureza humana finita e dependente. Logo, essa definição do pecado é bíblica, exata, e abrange todos os tipos do pecado; explica os efeitos do pecado sobre a natureza; e tem Deus (e não a humanidade) como ponto de referência. Isto é, reconhecemos a verdadeira natureza do pecado ao observarmos seu contraste com Deus, e não por meio de comparar seus efeitos entre os seres humanos.

Embora os crentes não estejam debaixo da lei mosaica, ainda existem padrões objetivos, passíveis de serem violados (Jo 4.2 1; 1 Jo 5.3; os muitos regulamentos nas epístolas). Por causa da incapacidade humana de cumprir a Lei, um relacionamento com Cristo pode suprir a expiação para apagar o pecado e o poder para viver uma vida segundo a vontade de Deus. O crente que ainda peca precisa confessar e, se possível, fazer restituição, não visando a absolvição, mas para reafirmar seu relacionamento com Cristo.

E essa fé que sempre se contrasta com a “justiça segundo as obras” (Hc 2.4; = Rm 1,17; = Gl 3.11; = Hb 10.38), de modo que tudo quanto não é de fé é pecado (Rm 14.23; = cf. Tt 1.15; = Hb 11.6). Por isso, o pecado nos crentes ou nos incrédulos, antes ou depois da crucificação é sempre a violação da Lei, e a única solução é a fé em Cristo.

Não se define o pecado por sentimentos, nem por filosofias 48, mas somente por Deus, na sua lei, no seu desejo e na sua vontade. E nas Escrituras que descobrimos esse fato de modo mais concreto. Embora, na melhor das hipóteses, coração do crente (no seu sentido mais lato) perceba o que é o pecado (Rm 2.13-15; = 1 Jo 3.2 1), sua sensibilidade espiritual para com o bem e o mal precisa ser aprimorada ( Hb 5.14). O coração tem sido desesperançosamente corrupto ( Jr 17.9) e pode ser cauterizado (1 Tm 4.2). Pode, também, sentir falsa culpa (1 Jo 3.20).

Assim, os sentimentos subjetivos jamais devem ser colocados acima da Palavra objetiva e escrita de Deus. Nem por isso, entretanto, devemos deixar de ser espiritualmente sensíveis. A idéia do pecado como uma violação da lei está embutida na própria linguagem das Escrituras. O grupo de palavras hebraicas representado por chatta ‘th (o mais importante no assunto do pecado) tem a idéia básica de “errar o alvo” (Jz 20.16; = Pv 19.2).

Essa idéia de alvo ou padrão objetivo permite a referência aos pecados deliberados (Ex 10.17; = Dt 9.18; = SI 25.7), a uma realidade externa do pecado (Gn 4.7), a um padrão sistemático do pecado (Gn 18.20; = 1 Rs 8.36), aos erros (Lv 4.2) e às ofertas exigidas por causa dos pecados (Lv 4.8). ‘Awon (“iniqüidade”), proveniente da idéia de ser “torto” ou “pervertido”, refere-se a pecados graves e muitas vezes forma um paralelo com chatta’th (Is 43.24). O verbo ‘avar fala em ir além de uma fronteira e, portanto (metaforicamente), da transgressão (Nm 14.41; = Dt 17.2). Resha’ pode referir-se a coisa errada (Pv 11.10) ou à injustiça (Pv 28.3,4).

Um grupo de palavras gregas representado por hamartia é usado para o conceito genérico de pecado no Novo Testamento. Tem o sentido básico de “errar o alvo” (assim como em chatta’th), e é um termo amplo, originalmente sem conotação moral. No Novo Testamento, porém, refere-se a pecados específicos (Mc 1.5; = At 2.38; Gl 1.4; Hb 10.12) e ao pecado como uma força (Rm 6.6,12; = Hb 12.1). Anomia (gr. nomos, “lei”, mais o prefixo negativo a — “sem lei”, “ilegalidade”, “iniqüidade”) e seus termos correlatos representam provavelmente a linguagem mais contundente para o pecado.

O adjetivo e o advérbio talvez se refiram àqueles que não têm a Torá (Rm 2.12; = 1 Co 9.21), mas a palavra usualmente identifica qualquer pessoa que violou alguma lei divina (Mt 7.23; = 1 Jo 3.4). E, também, a “injustiça” de 2 Tessalonicenses 2.7-12.Outro termo para o pecado, adikia, é mais literalmente traduzido por “ilegalidade” (mais comumente “iniqüidade”, em nossas Bíblias) e varia desde um mero engano até violações grosseiras da lei. E grande injustiça (Rm 1.29; = 2 Pe 2.13-15) e contrasta-se com a justiça (Rm 6.13). Parabasis (“passar além”, “transgressão”) e seus derivados indicam o violar um padrão. A palavra descreve a Queda (Rm 5.14; = cf. 1 Tm 2.14), a transgressão da lei como pecado (Tg 2.9,11) e a perda do apostolado de Judas (At 1.25). Asebeia (“impiedade” — o prefixo negativo a com sebomai [“reverenciar”, “adorar” etc.]), sugere uma insensibilidade espiritual que resulta em pecado grosseiro (Jd 4) e grande condenação (1 Pe 4.18; = 2 Pe 2.5; = 3.7).

A idéia do pecado como quebra de lei e como desordem evidencia um contraste marcante com o Deus pessoal que, pela sua palavra, trouxe à existência um mundo ordeiro e bom. A própria idéia de uma personalidade (humana divina) exige ordem. A ausência desta dá origem ao termo técnico “desordem da personalidade”

CARACTERÍSTICAS DO PECADO

Muitas das facetas do pecado estão refletidas nas características a seguir, tiradas do registro bíblico.

O pecado como incredulidade, ou falta de fé, Queda, na rejeição da humanidade à revelação geral (Rm 1.18-2.2) e naqueles condenados à segunda morte (Ap 21.8).

Está estreitamente vinculado à desobediência de Israel no deserto (Hb 3.18,19). A palavra grega apistia (“incredulidade”, At 28.24) combina o prefixo negativo a com pistis (“fé”, “confiança”, “fidelidade”). Tudo o que não é de fé é pecado (Rm 14.23; = Hb 11.6), A incredulidade é o antônimo da fé salvífica (At 13.39; = Rm 10.9) e leva à condenação eterna Jo 3.16; = Hb 4.6,11).

O orgulho é a auto-exaltação. Ironicamente, desejo de ser semelhante a Deus (como na ocasião em que Satanás tentou Eva) quanto a rejeição a Ele (Sl 10.4). A despeito do terrível custo, não tem valor diante de Deus (Is 2.11) e é por Ele odiado (Am 6.8). O orgulho engana (Ob 3) e leva à destruição (Pv 16.18; = Ob 4; = Zc 10.11).

Ajudou a tornar a incredulidade de Cafamaum pior que a depravação de Sodoma (Mt 11.23; = Lc 10.15), e é a antítese da humildade de Jesus (Mt 11.29; = 20.28; cf. Fp 2.3-8), No Juízo Final, os orgulhosos serão humilhados, e os humildes, exaltados (Mt 23.1-12; = Lc 14.7-14).

Embora apresente um lado positivo, o hebraico ga’on (Am 6.8) e o grego huperéphanos (Tg 4.6) tipicamente denotam uma arrogância profunda e permanente.

Intimamente relacionado ao orgulho, o desejo malsão — ou mal orientado e seu egocentrismo são pecado e motivam ao pecado (1 Jo 2.15-17). Epithumia (“desejo”, Tg 4.2), usado num mau sentido, leva ao assassínio e à guerra, e pleonexia, a apaixonada “cobiça” ou o “desejo de ter mais”, é equiparada à idolatria. Conseqüentemente, são condenados todos os desejos iníquos (Rm 6.12).

Quer se trate da desobediência de Adão ou da falta de amor no crente ( Jo 14.15,21; = 15.10), todo pecado consciente é rebelião contra Deus.

Em hebraico, pesha’ envolve a rebelião deliberada e premeditada (Is 59.13; = Jr 5.6). A rebelião também é refletida em marah (“ser refratário, obstinado”, Dt 9.7) e em sarar (“ser teimoso”, SI 78.8), e no grego apeitheia (“desobediência”, Ef 2.2), apostasia (“apostasia” ou “abandono rebelde, traição”, 2 Ts 2.3) e parakoê (“recusa de ouvir”, “desobediência”, Rm 5.19; = 2 Co 10.6). E assim, a rebelião é equiparada ao pecado da adivinhação, que busca orientação em outras fontes que não Deus ou sua Palavra (1 Sm 15.23).

O pecado, que provém do “pai da mentira” (Jo 8: 44 ), é a antítese da verdade de Deus (Sl 31.5; = Jo 14.6; = 1 Jo 5.20). Desde o princípio tem sido enganoso nas suas promessas, incitando pessoas enganadas a cometer mais prevaricação ( Jo 3.20; = 2 Tm 3.13). Pode outorgar prazer dramático, sempre temporário (Hb 11.25).

O hebraico ma‘a] (“infidelidade”, “engano”, Lv 26,40) e o grego paraptõma (“passo em falso”, “transgressão”, Hb 6.6), podem igualmente significar traição devida à incredulidade.

O lado objetivo da mentira que é o pecado é a distorção real do bem. “Iniqüidade” (‘awon), que provém da idéia de torcido ou pervertido, representa esse conceito (Gn 19.15; = SI 31.10; = Zc 3.9). Vários compostos de strephõ (“virar”-’ apo-, Lc 23.14; dia-, At 20.30; meta-, = Gl 1.7; ek-, Tt 3,11) também apresentam o mesmo sentido em grego, assim como skolios (“perverso”, “inescrupuloso”, At 2.40).

De modo genérico, o conceito bíblico do mal abrange tanto o pecado quanto o seu resultado, O hebraico ra’ apresenta uma ampla variedade de usos: animais inadequados para o sacrifício (Lv 27.10), as dificuldades da vida (Gn 47.9), a árvore proibida da Eden (Gn 2.17), as imaginações do coração (Gn 6.5), atos iníquos (Ex 23.2), pessoas perversas (Gn 38.7), a retribuição (Gn 31.29) e o justo juízo de Deus (Jr 6.19).

O grego, kakos tipicamente designa coisas más ou desagradáveis (At 28.5). No entanto, kakos e os seus compostos podem ter um significado mais amplo, moral, que designa pensamentos (Mc 7.21), ações (2 Co 5.10), pessoas (Tt 1.12) e o mal como uma força (Rm 7.21; = 12.21). Ponêria e a sua classe de palavras desenvolvem conotações fortemente éticas no Novo Testamento, inclusive Satanás como o “maligno” (Mt 13.19; ver também Mc 4.15; = Lc 8.12; = cf. 1 Jo 2.13) e o mal coletivo (Cl 1.4).

Os pecados especialmente repugnantes para Deus designados como detestáveis (“abominações”). To’evah (“coisa abominável, detestável, ofensiva”) pode referir-se aos ímpios (Pv 29.27), ao transvestismo (Dt 22.5), ao homossexualismo (Lv 18.22), à idolatria (Dt 7.25,26), ao sacrificio infantil (Dt 12.31) e a outros pecados graves (Pv 6.16-19). A palavra grega correspondente, bdelugrna, fala de grande hipocrisia (Lc 16,15), da profanação final do Lugar Santo (Mt 24.15; = Mc 13.14) e do conteúdo da taça nas mãos da prostituta Babilônia (Ap 17.4)

FORÇA E EXTENSÃO DO PECADO

Conforme indicam a totalidade deste capítulo e o estudo sobre Satanás (cap. 6), uma força maligna real e pessoal está operando no Universo, contra Deus e contra o seu povo. Esse fato sugere a importância crucial do guerra espiritual e de coisas semelhantes, mas sem o histerismo pouco religioso que tão freqüentemente acompanha esses esforços.

O pecado não consiste apenas de ações isoladas, também é uma realidade, ou natureza, dentro da pessoa (ver Ef 2.3).

O pecado, como natureza, indica a “sede” ou a sua “localização” no interior da pessoa, como a origem imediata dos pecados. Inversamente, é visto na necessidade do novo de uma nova natureza a substituir a velha, pecaminosa (Jo 3.3-7; = At3.19; = lPe 1.23). Esse fatoérevelado na idéia de que a regeneração só pode acontecer de fora para dentro da pessoa (Jr 24.7; = Ez 11,19; = 36.26,27; = 37.1-14; = 1 Pe 1.3).

O Novo Testamento relaciona a natureza pecaminosa com sarx (a “carne”). Embora a palavra originalmente se referisse ao corpo material, Paulo (inovando) equiparou-a à natureza pecaminosa (Rm 7.5-8.13; = Gl 5.13,19). Neste sentido, sarx é o centro dos desejos pecaminosos (Rm 13.14; = Gl 5.16,24; = Ef 2.3; = 1 Pe 4.2; = 2 Pe 2.10; = 1 Jo 2.16).

O pecado e as paixões surgem da carne (Rm 7.5; = Gl 5.17-21), onde não habita nenhuma coisa boa (Rm 7.18), e os pecadores mais sórdidos dentro da igreja são entregues a Satanás, “para destruição da carne”, possivelmente uma enfermidade que os leve ao arrependimento (1 Co 5.5; cf. 1 Tm 1.20), Sõma (“corpo”) é usado de modo semelhante apenas em algumas ocasiões (Rm 6.6; = 7.24; = 8.13; = CI 2.11). O corpo físico não é considerado um mal em si mesmo.

O hebraico lev, ou levav (“coração”: “mente” ou entendimento”), indica a essência da pessoa. O coração do homem pode ser pecaminoso (Gn 6.5; = Dt 15.9; = Is 29.13) acima de todas as coisas (Jr 17.9). Pois isso precisa de renovação (SI 51.10; = Jr 31.33; = Ez 11.19). Dele fluem as más intenções (Jr 3.17; = 7.24), e todas as suas inclinações são más (Gn 6.5).

O grego kardia (“coração”) também indica a vida interior e o próprio-eu. Tanto o mal quanto o bem são dele provenientes (Mt 12.33-35; = 15.18;= Lc 6.43-45). Pode significar a pessoa essencial (Mt 15.19; = At 15.9; = Hb 3.12). Kardia pode ser duro (Mc 3.5; = 6.52; = 8.17; = Jo 12.40; = Rm 1.21; = Hb 3.8).

Assim como sarx, kardia pode ser a origem de desejos errados (Rm 1.24). Da mesma forma a mente (nous) pode ser má nas suas operações (Rm 1.28; = Ef 4.17; = Cl 2.18; = 1 Tm 6.5; = 2 Tm 3.8; = Tt 1.15) e necessitar de renovação (Rm 12.2).

O pecado luta contra o Espírito. A natureza pecaminosa está totalmente contrária ao Espírito e além do controle da pessoa ( Gl 5.17; cf. Rm 7.7-25). E morte para o ser humano (Rm 8.7,8; = 1 Co 15.50).

Dela provém epithumia, a inteira gama de desejos malignos (Rrn 1.24;= 7.8; = Tt 2.12; = 1 Jo 2.16). O pecado até mesmo habita dentro da pessoa (Rm 7.17-24; = 8.5-8), como um princípio ou lei (Rm 7.21,23,25).

Os pecados propriamente ditos começam na natureza pecaminosa, freqüentemente como resultado de tentações mundanas ou sobrenaturais (Tg 1.14,15; = 1 Jo 2.16).

Uma das características mais insidiosas do pecado é a de dar ainda vazão a mais pecado. O pecado, por ser crescimento maligno, avoluma-se por conta própria a proporções fatais, tanto na extensão quanto na intensidade, a não ser quando freado pela purificação no sangue de Cristo.

A maneira como o pecado reproduz a si mesmo pode ser vista na Queda (Gn 3.1-13), na maneira de Caim descer da inveja ao homicídio (Gn 4.1-15) e na concupiscência de Davi, que deu à luz o adultério, o assassínio e gerações de sofrimentos (2 Sm 11 e 12). Romanos 1.18-32 relata a caminhada descendente da humanidade, desde a rejeição à revelação até sua reprovação por Deus e a conseqüente perversidade total. Semelhantemente, os “sete pecados mortais” (um catálogo antigo de vícios contrastados com virtudes paralelas) têm sido considerados não somente pecados radicais, como também uma seqüência descendente de pecados.

O processo de pecado se alimentando de pecado é levado a efeito através de muitos mecanismos. O ambicioso autor da iniqüidade, Satanás, é o antagonista principal desse drama maligno. Como governante da presente era ( Jo 12.31; = 14.30; = 16.11; = 2 Co 4.4; = Ef 2.2), ele tem procurado constantemente enganar, tentar, peneirar e devorar (Lc 22.31-34; = 2 Co 11.14; = 1 Ts 3.5; = 1 Pe 5.8), até mesmo por incitamento direto ao coração (1 Cr 21.1).

A inclinação natural da carne, que ainda aguarda a redenção plena, também desempenha o seu papel. As tentações do mundo apelam ao coração (Tg 1.2-4; = 1 Jo 2.16). O pecado muitas vezes requer mais pecados para alcançar o seu alvo elusivo, assim como aconteceu a Caim, que tentou esconder de Deus o seu crime (Gn 4.9). O prazer do pecado (Hb 11.25,26) pode reforçar o próprio pecado. Os pecadores provocam as suas vítimas a reagir de modo pecaminoso (observe as exortações contrárias: Pv 20.22; = Mt 5.38-48; = 1 Ts 5.15; = 1 Pe 3.9).

Os pecadores seduzem outras pessoas ao pecado (Gn 3.1-6; = Ex 32.1; = 1 Rs 21.25; = Pv 1.10-14; = Mt 4.1-11; = 5.19; = Mc 1.12,13; = Lc 4.1-13; = 2 Tm 3.6-9; = 2 Pe 2.18,19; = 3.17; = 1 Jo 2.26).

Os pecadores encorajam outros pecadores ao pecado (Sl 64.5; = Rm 1.19-32). Os indivíduos endurecem seus corações contra Deus, procurando evitar a aflição mental do pecado (1 Sm 6.6; = SI 95.8; = Pv 28.14; = Rm 1.24,26,28; = 2.5; = Hb 3.7-19; = 4.7).

Finalmente, endurecimento do coração por Deus pode facilitar esse pio-

Nunca se deve confundir tentação com pecado. Jesus sofreu as maiores tentações (Mt 4.1-11; = Mc 1.1243; = Lc 4.1- 13; = Hb 2.18; = 4.15) e permaneceu sem pecado (2 Co 5.21; = Hb 4.15; = 7.26-28; = 1 Pe 1.19;= 2.22; = 1 Jo 3.5; e as provas da divindade).

Além disso, se a tentação fosse pecado, Deus não providenciaria socorro para ajudar a suportá-la (1 Co 10.13). Embora Deus realmente submeta a provas os que são seus (Gn 22.1-14; = Jo 6.6) e obviamente permita a tentação (Gn 3), Ele mesmo não tenta (Tg 1.13). Na prática, a Bíblia admoesta a respeito do perigo da tentação e da necessidade de evitá-la e livrar-se dela (Mt 6.13; = Lc 11.4; = 22.46; = 1 Co 10.13; = 1 Tm 6.6-12; = Hb 3.8; = 2 Pe 2.9).

A Bíblia contém abundantes descrições de atos pecaminosos e advertências contra eles, inclusive catálogos de vícios (tipicamente em Rm 1.29-31; = 13.13; = 1 Co 5.l0,ll; = 6.9,10; = 2 Co 12.20,21; = Gl 5.19-21; = Ef4.31; = 5.3-5; = Cl 3.5,8; = Ap 21.8; = 22.15).

Essas listas indicam a gravidade do pecado e demonstram sua incrível variedade. No entanto, por si só, podem incitar o desespero mórbido em razão de pecados passados ou futuros. Mais grave ainda, podem ser entendidas no sentido de reduzir o pecado a meras ações, sem se levar em conta sua profundidade como lei, natureza e força dentro da pessoa e do Universo. Nesse caso, a pessoa acabaria vendo apenas os sintomas, sem tomar consciência da própria enfermidade.

As Escrituras descrevem muitas categorias de pecados. Podem ser cometidos por incrédulos ou por crentes, sendo que estes dois grupos são lesados pelos pecados e precisam da graça. Os pecados podem ser cometidos contra Deus, contra o próximo, contra o próprio-eu ou contra alguma combinação destes. Em última análise, porém, todo o pecado é contra Deus (SI 51.4; = cf. Lc 15.18,21).

O pecado pode ser confessado e perdoado. Não sendo perdoado, exercendo o seu domínio sobre a pessoa. A Bíblia ensina que uma atitude pode ser tão pecaminosa quanto um ato. Por exemplo, a fúria contra alguém pode ser tão pecaminosa quanto o assassinato, e um olhar de concupiscência, táo pecaminoso quanto o adultério (Mt 5.21, 22,27,28; = Tg 3.14- 16).

A atitude pecaminosa inutiliza a oração (SI 66.18). O pecado pode ser ativo ou passivo, ou seja, a prática do mal ou a negligência à prática do bem (Lc 10.30-37; = Tg 4.17). Os pecados sexuais físicos são lastimáveis para os cristãos, porque abusam o corpo do Senhor na pessoa do crente e porque o corpo é o templo do Espírito Santo (1 Co 6.12-20).

Os pecados podem ser cometidos por ignorância (Gn 20; = Lv 5.17-19; = Nm 35.22-24; = Lc 12.47-48; = 23.34). O salmista, com muita sabedoria, pede ajuda para discerni-los (SI 19.12). Parece que aqueles que só possuem a lei da natureza (Rm 2.13-15) cometem pecados da ignorância (At 17,30).

Todas as pessoas são, até certo grau, responsáveis e sem desculpa (Rm 1.20), e a ignorância deliberada, como a de Faraó, proveniente do contínuo endurecimento do próprio coração, é condenada vigorosamente. O pecado secreto é tão iníquo quanto o praticado em público (Ef 5.11-13). Assim acontece especialmente no caso da hipocrisia, uma forma de pecado secreto no qual a aparência exterior serve de máscara à realidade interior (Mt 23.1-33; note o v. 5). Os pecados cometidos abertamente, no entanto, tendem à presunção e à subversão da comunidade (Tt 1.9-11; = 2 Pe 2.1,2). Muitos rabinos acreditavam que o pecado secreto também era, na prática, uma negação da onipresença de Deus.

Os pecados cometidos por fraqueza têm origem no desejo dividido, usualmente após uma luta contra a tentação (Mt 26.36-46; = Mc 14.32-42; = Lc 22.31-34,54-62; talvez Rm 7.14-25). Os pecados presunçosos são cometidos com intenção profundamente iníqua, ou “à mão levantada” (Nm 15.30). Os pecados de fraqueza constituem menor afronta a Deus que os presunçosos. Indicam esse fato a severidade com que as Escrituras consideram os pecados presunçosos (Ex 21.12-14; = Sl 19.13; = Is 5,18-25; = 2 Pe 2.10) e a ausência de expiação para eles na lei mosaica (não no Evangelho, porém). Mesmo assim, a distinção entre fraqueza e presunção jamais deve ser usada como desculpa para tratar levianamente qualquer pecado.

A teologia católica romana faz distinção entre pecados veniais (lat. venha - “favor”, “perdão”, “bondade”) e pecados mortais. Nos pecados veniais (assim como nos de fraqueza), a vontade, embora consinta ou concorde com o ato do pecado, recusa-se a alterar sua identidade piedosa fundamental. Os pecados veniais podem levar aos pecados mortais. Entretanto, estes envolvem uma reorientação radical da pessoa, que leva a um estado de rebelião contra Deus e perda da salvação, embora a possibilidade do perdão permaneça. A verdadeira distinção entre esses tipos de pecado não parece achar-se na sua própria natureza, mas na natureza da salvação, O catolicismo acredita não serem os pecados inerentemente veniais, mas que se tornam em tais porque os fiéis possuem uma retidão que, em grande medida, mitiga o efeito dos pecados menores.

Nessa qualidade, não são diretamente prejudiciais ao relacionamento entre o fiel e Deus e, tecnicamente, não exigem a confissão. Esse conceito não é bíblico (Tg5.16; = lJo 1.9). Além de todos os demais pecados, o próprio Jesus ensinava que há um pecado sem perdão (Mt 12.22-37; = Mc 3.20-30; = Lc 12.1-12; cf. 11.14-26).

Muito se tem debatido a respeito da natureza desse “pecado imperdoável” ou “blasfêmia contra o Espírito Santo”. O texto sugere vários critérios que toda análise precisa levar em conta.

Deve ter alguma referência ao Espírito Santo (Mt 12.31; = Mc 3.29; = Lc 12.10). No entanto, a blasfêmia contra Deus ou contra outros membros da Trindade (Mt 12.31-32; = Mc 3.28; = Lc 12.10; = At 26.11; = Cl 3.8; = 1 Tm 1.13,20) é perdoável. Não pode ser um pecado que a Bíblia aliste como alcançado com o perdão. Tais pecados incluem aqueles cometidos antes de se conhecer a Deus a possessão demoníaca (Lc 8.2-3), a crucificação do Senhor (23.34), a impiedade de duração quase vitalícia (23.39-43), a blasfêmia (1 Tm 1.13), o compelir os crentes a blasfemar (At 26.11) e os cometidos depois de se ter conhecimento de Deus.

Além disso, o pecado imperdoável não inclui negar o Deus dos milagres (Ex 32), voltar à idolatria a despeito de grandes milagres (Ex 32), assassinato (2 Sm 11 e 12), imoralidade grosseira (1 Co 5.1- 5), negar Jesus (Mt 26.69-75), ver os milagres de Jesus e considerá-lo “fora de si” (Mc 3.2 1, imediatamente antes do seu ensino acerca da blasfêmia) e nem a volta à Lei depois de se conhecer a graça (Gl 2.11-21).

Esse pecado deve ser forçosamente blasfêmia (gr. blasphêmia), a calúnia mais vil contra Deus. Na LXX, blasphêmia freqüentemente descreve o ato de negar o poder e a glória de Deus, que é consistente com a atitude dos líderes judaicos de atribuir os milagres de Jesus ao diabo. O pecado da blasfêmia deve ser comparável ao dos líderes judaicos ao acusarem Jesus de ter um espírito maligno (Mc 3.30). Não pode ser meramente negar o testemunho dos milagres, pois Pedro negou Jesus (Mt 26.69-75) e Tomé duvidou dEle (Jo 20.24-29) depois de verem muitos milagres, mas os dois foram perdoados.

Devido à explícita afirmação de Jesus de que todos os demais pecados podem ser perdoados (Mt 12.3 1; = Mc 3.28), o pecado contra o Espírito Santo precisa ser comparado com Hebreus 6.4-8; = 10.26-31; = 2 Pe 2.20-22; e 1 João 5.16,17 — que também descrevem o pecado imperdoável. Notavelmente, Hebreus 10.29 liga esse pecado com o ultraje ao Espírito Santo. Parece, também, que podem ser incluídos o endurecimento do coração e a presunção (2 Ts 2.11,12).

E bom acrescentar que tal pecado não envolve necessariamente a presença do Jesus encarnado nem a dos apóstolos, pois eles não foram vistos por ninguém no Antigo Testamento nem (mais provavelmente) pelos destinatários de Hebreus, 2 Pedro e 1 João.

Assim, o pecado imperdoável não pode ser a falta de correspondência às manifestações milagrosas do Jesus encarnado ou dos apóstolos. Nem pode tratar-se de uma negação temporária à fé, que as Escrituras consideram perdoável.

O pecado imperdoável é melhor definido como a rejeição deliberada e derradeira da obra especial do Espírito Santo (Jo 16.7-11), que testemunha diretamente ao coração a respeito de Jesus como Senhor e Salvador, resultando na recusa total de crer. Por isso a blasfêmia contra o Espírito Santo não é uma indiscrição momentânea, mas uma disposição definitiva da vontade, embora as declarações de Jesus sugiram que possa manifestar-se num ato específico. Isto concorda com a avaliação de João de que os crentes não podem continuar pecando (1 Jo 3.6,9).

A preocupação sincera indica que o pecado imperdoável não ocorreu. Tal preocupação, no entanto, não é mensurada nas emoções ou na depressão suicida (Mt 27.3-5; talvez Hb 12.16,17), antes em uma renovada busca por Deus, em fé e dependência dEle. As passagens em Hebreus exemplificam este inabalável ainda que delicado equilíbrio pastoral.

A Bíblia admite diferentes graus de pecado. Esse fato é demonstrado em algumas das categorias de pecado (já citadas) e nos diferentes julgamentos divinos (Mt 11.24; = Mc 12.38-40; = Lc 10.12; = 12.47,48; = Jo 19.11), Mas a Bíblia também ensina o mínimo pecado cometido torna a pessoa plenamente pecadora (Dt 27.26—28.1; = GI 3,10; = Tg 2.10).

A discrepância aparente é resolvida pelo fato de que tanto o pecado mais insignificante quanto o mais hediondo são suficientes para levar à condenação eterna. Mesmo assim, peca- dos mais graves usualmente têm implicações mais significativas, não somente para as pessoas contra quem foram cometidos mas também para o pecador, que assim se afasta cada vez mais da presença de Deus.

A Bíblia ensina que somente Deus e os seres espirituais não-caídos (como os anjos) não possuem a mácula do pecado. A idéia de que os povos antigos viviam uma vida simples e quieta é desmentida pela antropologia, que revela um lado escuro em todas as sociedades humanas. Até mesmo as explicações evolucionárias que a teologia liberal oferece a respeito do pecado reconhecem a universalidade deste.

O pecado contamina o mundo dos espíritos. A depravação de Satanás (Jó 1.6—2.6), sua queda (Lc 10.18 e Ap 12,8,9, com suas interpretações), a “guerra” no céu (Dn 10.13; = Ap 12.7) e referências aos espíritos maus ou impuros (2 Co 12.7; = Ef6.10-18; = Tg4.7) dão testemunho disso. O pecado tem afetado o Universo além do escopo da ciência física.

As Escrituras também ensinam que todo ser humano, individualmente, é pecaminoso em algum sentido. Desde os tempos no Éden, o pecado tem ocorrido dentro de grupos. O pecado é claramente encorajado pelas atividades em grupo. A sociedade contemporânea é uma sementeira de tendências baseadas em capacidade (desde a vida embrionária), sexo, raça, antecedentes étnicos, religião, preferência sexual e até mesmo em posição política.

Assim como o pecado se achava em Israel, também há pecado na Igreja. Jesus o previu (Mt 18.15-20), e as Epístolas dão testemunho de sua presença (1 Co 1.11; = 5.1,2; = Gl 1.6; = 3.1; = Jd 4-19). A Igreja sem mácula nem ruga não será uma realidade antes da segunda vinda de Jesus (Ef 5.27; = Ap 21.27).

As Escrituras ensinam que os efeitos do pecado se encontram até mesmo na criação não-humana. A maldição de Gênesis 3.17,18 marca o início desse mal, e Romanos 8.19- 22 declara o estado desordenado da natureza. A criação geme, esperando a consumação. A palavra grega mataíotês (“frustração”, “vazio”, Rm 8,20) descreve a inutilidade de um objeto totalmente separado de seu propósito original e sintetiza a futilidade do estado presente do próprio Universo. O pensamento divino aqui pode abranger tudo, desde plantas e animais a quarks e galáxias.

A extensão do pecado tem limitação cronológica. Antes da criação e durante um período posterior não especificado, o pecado não existia, e tudo era bom. Entretanto, não somente a lembrança mas também a esperança cristã conhece um futuro em que, finalmente, o pecado e a morte já não existem (Mt 25.41; = 1 Co 15.25,26, = 51-56; = Ap 20. 10, 14,15).

CONSEQÜÊNCIAS DO PECADO

O pecado, por sua própria natureza, é destrutivo. Já descrevemos boa parte dos seus efeitos. Mesmo assim, é necessário aqui um breve resumo.

O estudo das conseqüências do pecado devem considerar a culpa e o castigo. Há vários tipos de culpa (heb. ‘ash.m, Gn 26.10; gr. enochos, Tg 2.10). A culpa individual ou pessoal pode ser distinguida da comunitária, que pesa sobre as sociedades. A culpa objetiva refere-se à transgressão real, quer posta em prática pelo culpado, quer não.

A culpa subjetiva refere-se à sensação de culpa numa pessoa, que pode ser sincera e levar ao arrependimento (SI 51; = At 2.40- 47; cf. Jo 16.7-11). Pode, também, ser insincera (com a aparência externa de sinceridade), mas ou desconhece a realidade do pecado (e só corresponde quando apanhada em flagrante e exposta à vergonha e castigada, etc.) ou evidencia uma mera mudança temporária e externa, sem uma reorientação real, duradoura e interna (por exemplo, Faraó). A culpa subjetiva pode ser puramente psicológica na sua origem e provocar muitas aflições sem, porém, fundamentar- se em qualquer pecado real (1 Jo 3.19,20).

A penalidade, ou castigo, é o resultado justo do pecado, infligido por uma autoridade aos pecadores e fundamentado na culpa destes. O castigo natural refere-se ao mal natural (indiretamente da parte de Deus) incorrido por atos pecaminosos (como a doença venérea provocada pelos pecados sexuais e a deterioração física e mental provocada pelo abuso de substâncias). O castigo positivo é infligido sobrenatural e diretamente por Deus. O pecador é fulminado, etc.

Os possíveis propósitos do castigo são relacionados a seguir.

(1) A retribuição ou a vingança pertencem exclusiva- mente a Deus (SI 94.1; Rm 12.19).

(2) A expiação traz a restauração do culpado (esta realizada em nosso favor pela expiação vicária oferecida por Cristo).

(3) O julgamento leva o culpado a dispor-se a restituir o que foi tirado ou destruído, e assim pode ser comprovada a obra que Deus realizou numa vida (Ex 22.1; = Lc 19.8).

(4) A correção influencia o culpado a não pecar no futuro. Esta é uma expressão do amor de Deus (SI 94.12; = mHb 12.5-17).

(5) O castigo do culpado serve para dissuadir a outros do mesmo comportamento. A dissuasão é usada freqüentemente nas advertências divinas (SI 95.8-11; = 1 Co 10.11).

Os resultados do pecado são muitos e complexos. Podem ser considerados em termos de quem e o que é afetado por ele. O pecado tem seu efeito sobre Deus. Embora sua justiça e sua onipotência não sejam prejudicadas pelo pecado, as Escrituras dão testemunho de seu ódio por ele (Sl 11.15; = Rm 1.18), de sua paciência para com os pecadores (Ex 34.6; = 2 Pe 3.9), de sua busca pela humanidade perdida (Is 1.18; = 1 Jo 4.9-10, 19), de sua mágoa por causa do pecado (Os 11.8), de sua lamentação pelos perdidos (Mt 23.37; = Lc 13.34) e de seu sacrifício em favor da salvação da humanidade (Rm 5.8; = 1 Jo 4.14; = Ap 13.8). De todas as revelações bíblicas a respeito do pecado, estas talvez sejam as mais humilhantes.

Todas as interações de uma sociedade humana outrora pura estão pervertidas pelo pecado. As Escrituras protestam, repetidas vezes, contra as injustiças praticadas pelos pecadores contra os “inocentes” (Pv 4.16; sociais, Tg 2.9; econômicas, Tg 5.1-4; físicas, SI 11.5; etc.). O mundo físico também sofre os efeitos do pecado. A decadência natural do pecado contribui para os problemas da saúde e do meio ambiente.

Os efeitos mais variados do pecado podem ser notados na mais complexa criação de Deus: a pessoa humana. Ironicamente, o pecado traz benefícios (segundo as aparências). O pecado pode até mesmo produzir uma alegria transitória (Sl 10,1-11; = Hb 11.25,26). O pecado também produz pensamentos enganosos, segundo os quais o mal parece bem.

Como conseqüência, as pessoas mentem e distorcem a verdade (Gn 4.9; = Is 5.20; = Mt 7.3-5), negando o pecado pessoal (Is 29.13; = Lc 39-52) e até mesmo a Deus (Rm 1.20; = Tt 1.16). Em última análise, o engano do que parece ser bom revela-se como mau. A culpa, a insegurança, o tumulto, o medo do juízo e coisas semelhantes acompanham a iniqüidade (Sl 38.3,4; = Is 57.20,21; = Rm 2.8,9; = 8.15; = Hb 2.15; = 10.27).

O pecado é futilidade. A palavra hebraica ‘awen (“dano”, “aflição”, “engano”, “nulidade”) evoca a imagem da infrutuosidade do pecado. E o mal angustioso ceifado por quem semeia iniqüidade (Pv 22.8) e é a inutilidade prevalecente em Betel (chamada com desprezo: Beth ‘Awen — “casa de nulidade”) apesar da grande tradição de que antes desfrutava (0s 4.15;= 5.8; 10.5,8; = Am 5.5; cf. Gn 28.10-22). Hevel (“nada”, “vazio”) é a repetida “vaidade” — ou “irrelevância” — de Eclesiastes e do frio consolo dos ídolos (Zc 10.2). Seu equivalente em grego, mataíotês, retrata o vazio ou a futilidade da criação amaldiçoada pelo pecado (Rm 8.20) e as palavras enfatuadas dos falsos mestres (2 Pe 2.18).

Em Efésios 4.17, os incrédulos são apanhados “na vaidade do seu sentido” por causa do seu entendimento entenebrecido e da separação de Deus causada pela dureza de coração.

O pecado envolve o pecador numa dependência cada vez mais exigente (Jo 8.34; = Rm 6.12-23; = 2 Pe 2.12-19), tornando-se uma lei ímpia no íntimo (Rm 7.23,25; = 8.2). Desde Adão até ao Anticristo, o pecado é caracterizado pela rebelião, que pode assumir a forma de “tentar a Deus” (1 Co 10.9) ou de hostilidade contra Ele (Rm 8.7; = Tg 4.4).

O pecado nos separa de Deus (Gn 2.17, = cf. 3.22-24; = Sl 78.58-60; = Mt 7.21-23; = 25.31-46; = Ef 2.12-19; = 4.18). O resultado pode ser não somente a ira de Deus, mas também o su silêncio (Sl 66.18; = Pv 1.28; = Mq 3.4-7; = Jo 9.31).

A morte (heb. maweth, gr. thanatos) teve sua origem no pecado, e é o resultado final do pecado (Gn 2.17; = Rm 5.12-21; = 6.16,23; = 1 Co 15.21,22,56; = Tg 1.15). É possível distinguir entre a morte física e a espiritual (Mt 10.28; = Lc 12.4).

A morte física é uma penalidade ao pecado (Gn 2.17; = 3.19; = Ez 18.4,20; = Rm 5.12-17; = 1 Co 15.21,22) e pode vir como um juízo específico (Gn 6.7,11-13; = 1 Cr 10.13,14; = At 12.23).

Entretanto, para os crentes (que estão mortos para o pecado, Rm 6.2; = Cl 3.3; em Cristo, Rm 6.3,4; = 2 Tm 2.11) significa uma restauração mediante o sangue de Cristo (Jó 19.25-27; = 1 Co 15.2 1,22) porque Deus tem triunfado sobre a morte (Is 25.8; = 1 Co 15.26,55-57; = 2 Tm 1.10; = Hb 2.14,15; = Ap 20.14).

Os não-salvos vivem na morte espiritual (Jo 6.50-53; =Rm 7.11; = Ef 2.1-6; = 5.14; = Cl2.13; = l Tm 5.6; = Tg 5.20; = lPe 2.24; = 1 Jo 5.12), que é a derradeira expressão da alienação entre a alma e Deus. Até mesmo os crentes, quando pecam, experimentam uma separação parcial de Deus (Sl 66.18), mas Ele está sempre disposto a perdoar (Sl 32.1-6; = Tg 5.16; = 1 Jo 1.8,9).

A morte espiritual e a morte física estão associadas e serão plenamente realizadas após o Juízo Final (Ap 20.12- 14) , Embora Deus tenha ordenado o triste fim dos pecadores (Gn 2.17; = Mt 10.28; = Lc 12.4), este fim não lhe dá prazer (Ez 18.23; = 33.11; = 1 Tm 2.4; = 2 Pe 3.9).

A única maneira de se lidar com o pecado é amando a Deus em primeiro lugar, e então passar a ser um canal para levar ao próximo o seu amor, mediante a graça divina. Somente o amor é capaz de opor-se ao pecado, que se opõe a tudo (Rm 13.10; = 1 Jo 4.7-8). Somente o amor pode cobrir o pecado (Pv 10.12; = 1 Pe 4.8) e, em último lugar, ser o remédio contra ele (1 Jo 4.10). E somente “Deus é amor” (1 Jo 4.8). No que diz respeito ao pecado, o amor pode expressar-se de maneiras específicas.

O conhecimento do pecado deve gerar santidade na vida do indivíduo e uma ênfase à mesma santidade, na pregação e no ensino à igreja.

A Igreja deve reafirmar a sua identidade, a de uma comunidade de pecadores salvos por Deus, ministrando na confissão, no perdão e na cura. A humildade deve caracterizar todos os relacionamentos cristãos, à medida que os crentes tomam consciência, não somente da vida e morte terríveis das quais foram salvos, mas também do preço ainda mais terrível daquela salvação.

Quando uma pessoa é salva da mesma natureza pecaminosa, nenhuma quantidade de dons espirituais, ministérios ou autoridade pode justificar a elevação de uma pessoa acima de outra. Pelo contrário, cada pessoa deve preferir e honrar as outras mais que a si mesma (Fp 2.3).

A amplidão universal e a profundidade sobrenatural do pecado devem levar a Igreja a corresponder, com a dedicação de todos os membros e o revestimento do poder milagroso do Espírito Santo, ao imperativo da Grande Comissão (Mt 28.18-20).

A compreensão da natureza do pecado deve renovar a nossa sensibilidade diante das questões do meio ambiente e levar-nos a retomar a comissão original de cuidar do mundo de Deus, o qual não devemos deixar nas mãos daqueles que preferem adorar a criação ao invés de ao Criador.

Questões de justiça social e necessidade humana devem ser advogadas pela Igreja como testemunho da veracidade do amor, em contraste à mentira que é o pecado. Mesmo assim, semelhante testemunho deve apontar sempre para o Deus da justiça e do amor, que enviou o seu Filho a morrer por nós. Somente a salvação, e não a legislação ou um evangelho social que desconsidera a cruz ou ainda a ação violenta ou militar, pode curar o problema e seus sintomas.

Conclusão

Finalmente, a vida deve ser vivida na esperança certa de um futuro além do pecado e da morte (Ap 21 e 22). Então, purificados e regenerados, os crentes verão a face daquEle que já não lembra mais do seu pecado (Jr 31.34; = Hb 10.17).

Elaboração pelo:- Evangelista Isaias Silva de Jesus (auxiliar)

Igreja Evangélica Assembléia de Deus Ministério Belém Em Dourados – MS

Teologia Sistemática Pentecostal 2º. Edição 1997