Uma lição de humildade
TEXTO ÁUREO
“Porque eu vos dei o exemplo, para que, como eu vos fiz, façais vós também.” (Jo 13.15)
Entenda o Texto Áureo:
Eu lhes dei um exemplo … – No Novo Testamento, três palavras diferentes são traduzidas como “exemplo”. A palavra usada aqui (ὑπόδειγμα) se refere a casos específicos e isolados (veja Hebreus 4:11, 8:5, 9:23; Tiago 5:10; 2 Pedro 2:6). Compare com 1 Coríntios 10:6, 10:11 (τύπος) e Judas 7 (δεῖγμα). Percebe-se que o exemplo de Cristo sempre está ligado a alguma forma de autossacrifício.
Que … a vocês – Literalmente, “que assim como eu fiz a vocês, vocês também façam”. O paralelo está entre “eu” e “vocês”, por isso as palavras “uns aos outros” não foram acrescentadas. A prática da lavagem dos pés continuou de diferentes formas na Igreja. Segundo Bingham (12:4, § 10), o 17º Concílio de Toledo (694) decretou que fosse obrigatória na Quinta-feira Santa em todas as igrejas da Espanha e da Gália.
Em 1530, Wolsey lavou, enxugou e beijou os pés de 59 pobres em Peterborough (Cavendish, Life, 1. p. 242). Os monarcas ingleses mantiveram essa prática até o reinado de Jaime II, e até 1731 o Almoner Real lavava os pés dos beneficiários das esmolas reais em Whitehall na “Quinta-feira Santa”.
O costume da lavagem dos pés ainda é mantido em São Pedro, no Vaticano. Os menonitas preservaram essa prática, assim como os Irmãos Unidos, embora hoje ela tenha caído em desuso. Um relato interessante sobre a regra de Lanfranc em Bec pode ser encontrado em Anselm, de Church (pp. 49 e seguintes). O antigo costume inglês é descrito por Chambers em Divine Worship in England (p. 26). O ritual romano é registrado por Daniel em Cod. Lit. (1:412).
VERDADE PRÁTICA
A submissão e o serviço são características de maturidade e grandeza no percurso do crescimento espiritual do cristão.
Entenda a Verdade Prática
Na jornada cristã, a submissão e o serviço são elementos interligados que moldam a postura e o propósito do discípulo.
A submissão, que não deve ser confundida com passividade ou subserviência, é um ato de reconhecer a autoridade e o amor de Deus, assim como a liderança em diferentes contextos da vida.
O serviço, por sua vez, é a expressão prática desse amor e submissão, buscando o bem-estar do próximo e a realização da vontade de Deus em todas as áreas da vida.
LEITURA BÍBLICA EM CLASSE
João 13.1-10
1. Ora, antes da festa da Páscoa, sabendo Jesus que já era chegada a sua hora de passar deste mundo para o Pai, como havia amado os seus que estavam no mundo, amou-os até ao fim.
(1–4) Esses versículos são pontuados de maneiras diferentes. Alguns acreditam que a construção é interrompida e que o verbo principal é levanta-se no versículo 4, com sabendo no versículo 3 retomando o sabendo do versículo 1.
No entanto, parece melhor (como na A.V.) considerar o versículo 1 como completo por si só, pois é gramaticalmente completo, e ver o versículo 2 como um novo começo.
Nessa visão, o versículo 1 é uma introdução a todo o ciclo de ensinamentos que segue (capítulos 13–17), enquanto os versículos 2 e 3 introduzem o episódio específico da lavagem dos pés, uma manifestação simbólica do amor.
Antes da festa… A partícula disjuntiva (δέ, na Vulgata autem) pode sugerir um contraste com o retiro temporário mencionado em 12:36. Embora Jesus tenha se afastado, antes da crise de Sua Paixão, Ele preparou completamente os discípulos para o que aconteceria.
Antes da festa – Essas palavras não podem ser ligadas nem a sabendo nem a tendo amado. A cláusula deve estar ligada ao verbo principal amou. Assim, o indicativo de tempo marca a ocasião em que o amor de Jesus se manifestou de várias formas, nos atos e discursos que se seguiram. Tudo aconteceu “antes da festa”, ou seja, na noite (início) do dia 14 de Nisã.
Nessa última cena antes da Páscoa, onde o símbolo judaico alcançou seu cumprimento perfeito, o amor do Senhor foi revelado em sua forma mais elevada.
Quando Jesus sabia – Sabendo Jesus, ou seja, já que Ele sabia. Esse conhecimento, descrito como absoluto (εἰδώς), motivou a suprema demonstração de amor. A repetição da palavra mundo destaca esse ponto: no mundo, os discípulos enfrentariam provações, especialmente quando seu Mestre já tivesse partido. Isso explica a necessidade dos encorajamentos que seguem (ex.: 16:33).
Ao conhecer o sofrimento dos discípulos, o Senhor esqueceu o Seu próprio, mesmo que a previsão de Seus sofrimentos intensificasse Sua dor.
Sua hora – Assim como João destaca as condições morais da vida do Senhor por meio de um “não pode” divino (12:40) e um “deve” divino (20:9), ele também marca a sequência divina dos eventos. Os momentos decisivos de Suas manifestações estão absolutamente fixados no tempo (2:4; cf. 11:9-10, 9:4).
Em cada caso, essa hora é determinada em relação ao propósito que conduz (12:23, para que seja glorificado, e aqui para que passe). Compare com 4:21, 4:23, 5:25, 5:28; 1 João 2:18; Apocalipse 14:7, 14:15; João 7:6, 7:8 (καιρός); Efésios 1:10 (a plenitude dos tempos); Gálatas 4:4 (a plenitude do tempo).
Até que a hora chegue, os inimigos de Cristo são impotentes (7:30, 8:20). Quando chega, Ele reconhece sua chegada (12:27, 17:1).
Para que passasse… O propósito, como parte do plano divino, é enfatizado (ἵνα). Compare com 12:23 e 16:2. Passasse – A palavra exata (μεταβῇ, na Vulgata transeat) só é usada aqui nesse contexto. Indica a transferência de uma esfera para outra: cf. 5:24; 1 João 3:14. Para Cristo – e, n’Ele, para o cristão – a morte não é uma interrupção da existência, mas uma mudança no modo de existir, uma ida para o Pai, para Seu Pai e nosso.
Este mundo… o mundo – O demonstrativo (ὁ κόσμος οὗτος, este mundo) enfatiza o aspecto transitório e insatisfatório do mundo presente. A expressão aparece em 8:23, 9:39, (11:9), 12:25, 12:31, 16:11, 18:36; 1 João 4:17 (e em Paulo).
Para o Pai – Expressa o relacionamento religioso e moral, e não apenas uma ideia de poder (para Deus).
Os Seus – Atos 4:23, 24:23; 1 Timóteo 5:8. Compare com 17:6ss. Contraste com 1:11.
Até o fim – Até o máximo. A expressão original (εἰς τέλος, na Vulgata in finem) tem dois significados comuns: (1) por fim e (2) totalmente, completamente.
O primeiro sentido parece mais natural em Lucas 18:5, e o segundo em 1 Tessalonicenses 2:16.
O termo ocorre frequentemente na Septuaginta, muitas vezes ligado a palavras de destruição (completamente) ou abandono (para sempre): Salmo 12:1, (9:18, outros para sempre), etc.
No entanto, também aparece em outros contextos, como Salmo 15:11, 73:3, 48:8, e frequentemente em escritores gregos posteriores, ex.: 2 Clemente 19; Luciano, Somn. 9. Não há base para traduzi-lo aqui como até o fim de Sua presença terrena (mas veja Mateus 10:22, 24:13ss.), pois isso não se encaixa na conexão com antes da festa.
Se, no entanto, tomarmos as palavras como significando amou-os com amor perfeito, então a ideia fica clara: Como Cristo amou Seus discípulos e já havia demonstrado esse amor, agora, nesse momento crítico antes de Sua Paixão, Ele levou esse amor ao máximo. Ele os amou até o fim.
2. E, acabada a ceia, tendo já o diabo posto no coração de Judas Iscariotes, filho de Simão, que O traísse,
E, tendo terminado a ceia … – E—como uma manifestação especial desse amor—durante a ceia (δείπνου γινομένου)… o diabo … ele – Literalmente, segundo o texto mais antigo: o diabo, tendo já posto no coração de Judas Iscariotes, filho de Simão, que traísse a Jesus.
A mudança do sujeito da primeira para a segunda parte da frase (no coração de Judas … que ele traísse…) não é incomum. Além disso, não é possível aceitar a tradução o diabo tendo concebido em seu coração que…. A separação de “Iscariotes” de Judas no texto original (Judas, filho de Simão, Iscariotes) confirma que o título é de origem local. Compare com 6:71, onde é um epíteto de Simão.
3. Jesus, sabendo que o Pai tinha depositado nas suas mãos todas as coisas, e que havia saído de Deus, e que ia para Deus,
Jesus sabendo – Como antes, significa já que Ele sabia. O conhecimento de que possuía essa autoridade divina foi a base para Seu ato de serviço; assim como, no versículo 1, o conhecimento de Sua partida iminente foi a base para a manifestação suprema de Seu amor.
O Pai – Não Seu Pai. O Filho do Homem (Jesus) é agora o conquistador.
Tinha dado … – Nosso idioma não suporta bem a tradução literal no tempo oblíquo (deu, encontrado nas fontes mais antigas), mas a ideia é que essa comissão foi concedida uma vez e permanece para sempre. O mesmo vale para os verbos seguintes, que no original são veio e vai.
Todas as coisas – A soberania absoluta de Jesus se destaca ainda mais diante da aparente derrota. Mesmo a traição e a morte eram caminhos para a ressurreição. em suas mãos – Para agir conforme Sua vontade, mesmo quando foi entregue nas mãos dos homens (Mateus 17:22, 26:45).
A ordem original do texto é enfática: e que era de Deus que Ele veio, e para Deus Ele estava indo. O título de poder e glória é usado nesta cláusula, enquanto o de afinidade (o Pai) foi usado na anterior.
Veio – Veio ao mundo em Sua missão na encarnação. O uso da preposição (ἀπό) indica separação e não apenas origem. Compare com 8:42.
4. levantou-se da ceia, tirou as vestes e, tomando uma toalha, cingiu-se.
Levantou-se da ceia e pôs de lado … – Não há indicação do momento exato em que essa ação ocorreu. A expressão sugere que a ceia já havia começado, então essa lavagem dos pés não foi realizada antes da refeição. Podemos supor que se tratava de uma parábola em ação, ilustrando um princípio do reino que havia sido mencionado. Compare com Lucas 22:24ss.; (Mateus 18:1ss.).
Por essa razão, cada detalhe do ato de serviço é descrito com a precisão de uma testemunha ocular: levantar-se do meio do grupo (ἐγ, ἐκ), tirar as vestes superiores (ἱμάτια), pegar a toalha, cingir-se, derramar a água, lavar e enxugar. Quando Cristo serve, Ele o faz perfeitamente.
Pegou … e cingiu-se – A forma da expressão destaca que foi uma preparação feita por Ele mesmo. Compare com Lucas 12:37, 17:8 e João 21:18, além de Atos 12:8. “O que há de surpreendente em Ele se cingir com uma toalha, se, tomando a forma de servo, foi encontrado em aparência como homem?” (Agostinho, ad loc.)
5. Depois, pôs água numa bacia e começou a lavar os pés aos discípulos e a enxuga-los com a toalha com que estava cingido.
Depois disso … – Então (εἶτα), João 19:27, 20:27.
Derramou – A palavra original (βάλλει, Vulgata mittit), que é peculiar, é traduzida em outras passagens semelhantes como põe (Mateus 9:17 e paralelos).
Na bacia – Que já estava pronta para esse uso costumeiro. Compare com 2 Reis 3:11.
Começou a lavar – A cena é dividida em partes, assim como todos os detalhes da preparação foram mencionados separadamente. Compare com Gênesis 18:4, 19:2, 24:32, 43:24; Juízes 19:21; 1 Timóteo 5:10.
Os comentaristas rabínicos enfatizavam o significado de Ezequiel 16:9.
Diziam: “Entre os homens, o escravo lava os pés do seu senhor; mas com Deus não é assim.” Compare com os comentários de Lightfoot e Wetstein sobre essa passagem.
6. Aproximou-se, pois, de Simão Pedro, que lhe disse: Senhor, tu lavas-me os pés a mim?
Então veio a Simão Pedro … – À medida que passava pelo círculo dos discípulos, ou melhor, quando começou a percorrê-lo. Não há nada que sustente a ideia antiga de que Jesus começou com Judas. Pelo contrário, é mais natural supor que Ele tenha começado com Pedro. Isso torna sua recusa mais compreensível do que se outros já tivessem aceitado o serviço.
E Pedro disse a Ele … – A frase abrupta combina com o tom vívido do relato.
Tu me lavas os pés? – A posição dos pronomes no original (σύ μου νίπτεις τοὺς πόδας – Vulgata: tu mihi lavas pedes) enfatiza o contraste entre as pessoas. A questão principal não é o tipo de serviço, mas o fato de o Mestre servir ao servo.
7. Respondeu Jesus e disse-lhe: O que eu faço, não o sabes tu, agora, mas tu o saberás depois.
O que faço … – O abismo entre o pensamento do Senhor e o do discípulo é destacado pelos pronomes enfáticos (ὃ ἐγὼ ποιῶ, σὺ οὐκ οἶδας – o que Eu faço, tu não sabes). O significado do ato só poderia ser compreendido após a glorificação do Senhor. Sua interpretação dependia de uma visão completa de Sua pessoa e obra. Aqui, o verbo indica um conhecimento absoluto e completo (οὐκ οἶδας – tu não sabes), em contraste com um conhecimento adquirido por experiência progressiva (γνώσῃ – tu compreenderás). Compare com João 3:10-11.
Mais tarde – Literalmente, depois destas coisas (João 3:22, 5:1, 5:14, 6:1, 7:1, 19:38, 21:1). Em todos esses casos, a referência é a um grupo de eventos e não a uma única cena. Aqui, estas coisas incluem todas as circunstâncias da Paixão que já havia começado. Mesmo a explicação dada nos versículos 12ss.
Só foi plenamente compreendida após o sacrifício de Cristo. O entendimento completo veio no dia de Pentecostes.
8. Disse-lhe Pedro: Nunca me lavarás os pés. Respondeu-lhe Jesus: Se eu te não lavar, não tens parte comigo.
Pedro retoma a ideia de “mais tarde” – Ele argumenta que nada pode mudar sua posição em relação ao Senhor.
Para ele, essa posição está eternamente fixada. Sua resposta é enfática: Tu nunca lavarás os meus pés enquanto o mundo existir (οὐ μὴ … εἰς τὸν αἰῶνα). Ele presume que pode prever tudo e, assim, sua reverência assume a forma de obstinação, como no episódio correspondente em Mateus 16:22, onde sua reverência mal direcionada a Cristo, segundo sua própria interpretação do papel do Mestre, leva a uma repreensão severa.
Se eu não te lavar … – Cristo responde à confiança de Pedro com uma declaração sobre a separação inevitável que resulta da falta de submissão absoluta. Se não te prestar esse serviço, se não aceitares o que te ofereço, mesmo sem entender agora meu propósito, não terás parte comigo. A primeira condição do discipulado é a rendição total. Não parece adequado ao contexto trazer uma referência direta à purificação pelo sangue de Cristo (ver vv. 13ss.), embora, como observa Cirilo, essa ideia possa ser sugerida pelas palavras.
te lavar – Não apenas os pés. Cristo escolhe a maneira como realiza Sua obra, que é eficaz para o todo, e não apenas para uma parte.
Não terás parte comigo Não terás participação no meu reino, assim como um soldado leal compartilha das vitórias de seu capitão. Compare com Mateus 24:51; Deuteronômio 12:12, 14:27; Salmo 50:18.
9. Disse-lhe Simão Pedro: Senhor, não só os meus pés, mas também as mãos e a cabeça.
Pedro, com sua impulsividade característica, ainda responde no mesmo espírito de antes. Assim como antes tentou definir o que o Senhor não deveria fazer, agora ele tenta definir como isso deve ser feito, já que reconhece ser necessário. Ele deseja ampliar a ação para cada parte do corpo, enquanto Cristo escolheu realizá-la de um modo específico, segundo Sua própria vontade.
10. Disse-lhe Jesus: Aquele que está lavado não necessita de lavar senão os pés, pois no mais todo está limpo. Ora, vós estais limpos, mas não todos.
A resposta do Senhor introduz uma nova ideia. Do conceito do ato de serviço em si, somos levados ao significado simbólico da ação específica como um processo de purificação. O “lavar” de uma parte do corpo, como os pés, mãos ou cabeça, é contrastado com o “banhar” o corpo inteiro. O “lavar” não representa uma mudança essencial, mas se refere a uma transformação já realizada. Quem já tomou banho (ὁ λελουμένος) só precisa lavar (νίψασθαι) os pés. Algumas autoridades textuais omitem “exceto” e “os pés”. Se essa leitura for adotada, a ênfase estará em “não precisa”. A limpeza posterior pode ser um ato de amor divino, mas não deve ser exigida pela vontade humana.
A forma do verbo sugere essa ideia: não significa “ser lavado”, mas “lavar-se” ou “lavar os próprios pés” (Mateus 15:2; Marcos 7:3). No entanto, é mais provável que a omissão tenha ocorrido devido à dificuldade de conciliar a frase com “completamente limpo”. Se a leitura comum for mantida, o sentido será que a limpeza limitada, agora simbolizada, é tudo o que é necessário. Quem já tomou banho precisa apenas remover as impurezas adquiridas ao longo do caminho, assim como um convidado, após o banho, só precisa ter a poeira lavada dos pés ao chegar à casa do anfitrião.
Está completamente limpo – As impurezas superficiais, como nas mãos, cabeça ou pés, não alteram a condição geral. A pessoa, como um todo, continua limpa.
E vós estais limpos, mas nem todos – A ideia de impureza parcial da pessoa se transforma na ideia de impureza parcial da comunidade. Os apóstolos, como grupo, eram limpos. A presença de um traidor, a mancha a ser removida, não alterava o caráter do grupo, assim como a sujeira nos pés não mudava a limpeza essencial da pessoa.
Nesse contexto, o trecho ilumina a doutrina da santidade da Igreja visível. Isso se torna mais claro ao percebermos que o “banhar”, em contraste com “lavar”, antecipa a ideia do Batismo Cristão (Hebreus 10:22; Efésios 5:26; Tito 3:5).
No entanto, não há evidências de que os próprios apóstolos tenham sido batizados, exceto com o batismo de João. Para eles, o “banho” consistia na comunhão direta com Cristo. Esse ato especial de serviço era apenas um complemento ao amor contínuo dessa relação (cf. João 15:3).
INTRODUÇÃO
O evento do lava-pés, registrado exclusivamente no Evangelho de João (Jo 13.1-17), ocorre imediatamente antes da festa da Páscoa. Trata-se de um momento de transição no ministério de Jesus: do ensino público para a preparação íntima dos discípulos.
A perícope é introduzida no versículo 1 com uma clara ênfase no amor: “...tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim.” Essa declaração se torna a chave hermenêutica de toda a ação subsequente. Jesus, ciente de Sua autoridade e de Sua origem divina (v.3), voluntariamente se despoja de Suas vestes exteriores e assume o papel de servo ao lavar os pés dos discípulos. Esse ato era culturalmente reservado aos escravos gentios ou aos servos de menor status em uma casa. O gesto, portanto, é profundamente contracultural e escandaloso à luz da expectativa messiânica tradicional. Em vez de exigir honra, Jesus se abaixa — literalmente — para servir. O lava-pés é um símbolo multifacetado:
• Humildade: Jesus ensina que a liderança no Reino de Deus é servidora. “Ora, se eu, Senhor e Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros” (v.14).
• Purificação: O diálogo com Pedro (v.6-10) revela que a lavagem tem uma conotação espiritual. Jesus fala de uma “lavagem” que ultrapassa o literal, apontando para a necessidade de purificação interior (cf. Sl 24.3-4).
• Exemplo: “Porque eu vos dei o exemplo, para que, como eu vos fiz, façais vós também” (v.15). A ação de Jesus não é apenas uma cerimônia, mas um modelo de conduta ética para a comunidade cristã.
I. UMA HISTÓRIA REAL SOBRE A HUMILDADE
1. O lava-pés. O Evangelho de João se distingue dos sinóticos por sua teologia mais desenvolvida e simbólica. O capítulo 13 marca uma transição importante: dos "sinais" públicos (Jo 1–12) para os "discursos privados" com os discípulos (Jo 13–17), muitas vezes chamado de "Livro da Glória".
O episódio do lava-pés não aparece nos outros evangelhos e substitui, de certa forma, a instituição da Ceia. João prefere destacar o gesto de serviço como a essência do amor de Jesus. "Ora, antes da festa da Páscoa..." O evangelista antecipa a cruz: Jesus "sabia que era chegada a sua hora".
A expressão "tendo amado os seus... amou-os até o fim" (gr. eis telos) indica não apenas um amor até o último momento, mas até a plenitude, completamente. "Durante a ceia..." Há tensão no ambiente: o diabo já havia "colocado no coração de Judas" a traição.
João estabelece contraste entre o amor de Jesus e a traição de Judas, que será mencionada logo após. João nos apresenta um paradoxo: aquele que tem “todas as coisas” em suas mãos... lava os pés dos discípulos.
Uma atitude de servo: lavar os pés era tarefa de escravos ou servos gentios, nunca de um mestre. O gesto é escandalosamente humilhante, ainda mais vindo de alguém chamado “Senhor” e “Mestre”. Perceba que Pedro se escandalizou com essa cena! v.6–10 –Pedro resiste: “Tu, Senhor, me lavas os pés?”. Jesus responde que esse ato é essencial para a comunhão: “Se eu não te lavar, não tens parte comigo”.
O uso do verbo “lavar” (niptō) e “banhar” (louō) sugere um significado espiritual além do ato físico: purificação espiritual e participação com Cristo. Jesus interpreta o gesto como exemplo a ser seguido: “como eu vos fiz, façais vós também”. A lógica do Reino de Deus subverte os valores do mundo: liderança é serviço, autoridade é humildade.
O versículo 17 resume a ética joanina: “Se sabeis estas coisas, bem-aventurados sois se as praticardes.” Em um mundo marcado por poder e prestígio, o gesto de Jesus continua sendo profundamente contracultural. Mesmo sabendo que seus discípulos o abandonariam vergonhosamente em pouco tempo, deixando-o nas mãos dos pecadores; mesmo sabendo que Judas o trairia, que Pedro o negaria e que os outros se dispersariam, Jesus amou os seus discípulos até o fim. Jesus amou-nos a ponto de deixar a glória, entrar no mundo, fazer-se carne, tornar-se pobre, ser perseguido, odiado, zombado, cuspido, pregado numa cruz, carregando sobre o seu corpo no madeiro os nossos pecados e morrer por nós em uma rude cruz.
Esse é um amor imenso, eterno, infinito. Nenhum pregador jamais pode pregar completamente esse amor. Nenhum escritor jamais pode descrever completamente esse amor. Nenhum poeta jamais conseguiu descrever esse amor. Estou certo de que, ainda que todos os mares fossem tinta, e todos as nuvens fossem papel; mesmo que todas as árvores fossem pena e todos os seres humanos fossem escritores, nem mesmo assim se poderia descrever o amor de Cristo.
Seu amor excede todo o entendimento e toda possibilidade de plena descrição. O principal dos pecadores pode ir a Jesus com ousadia e confiar no seu perdão. Jesus se deleita em receber pecadores. Jesus não nos lança fora por causa dos nossos fracassos. Ele jamais nos rejeita por causa da nossa fraqueza. Aqueles a quem Jesus ama desde o princípio, ele ama até o fim. Aqueles que vão a ele jamais serão lançados fora.
2. O desenvolvimento da história. Jesus não se dirige mais ao povo, às multidões, ao mundo como um todo, mas apenas aos seus discípulos. A porta da oportunidade para o povo estava fechada. O ministério público de Jesus havia chegado ao fim.
João 13 a 17 é a mensagem de despedida de Jesus para seus discípulos amados, culminando com sua oração intercessora por eles e por nós. Entramos agora no capítulo 13 de João, o lugar santo do edifício sagrado desse evangelho. Acompanhando os fatos que serão narrados em cinco capítulos sucessivos, estaremos sozinhos com nosso Senhor e seus discípulos. E a noite em que Jesus é traído. Seu ministério público finda-se. O dia seguinte testemunhará sua angústia e sua morte. Ele se recolhe com os Doze a um cenáculo para com eles comer a Páscoa, instituir a ceia, seu memorial, revelar aos discípulos seu amor incomparável e prepará-los para a separação que sabe estar próxima.
3. A mudança de paradigma. Com esse gesto, Jesus nos ensina que privilégios não implicam orgulho, mas humildade. Jesus sabia quem era. Sabia de onde tinha vindo e para onde estava indo. Sabia sua origem e seu destino. Sabia que era o rei dos reis, o Filho do Deus altíssimo.
Sabia que o Pai tudo confiara a suas mãos e que era o soberano do universo. Contudo, sua majestade não o levou à autoexaltação, mas à humilhação mais profunda. O que ele sabia determinou o que ele fez. Sua humildade não procedeu da sua pobreza, mas da sua riqueza. Sendo rico, fez-se pobre. Sendo rei, fez-se servo. Sendo Deus, fez-se homem. Sendo soberano do universo, cingiu-se com uma toalha e lavou os pés dos discípulos.
Era costume que, antes de se assentarem à mesa, as pessoas lavassem os pés. Os discípulos tinham vindo de Betânia. Seus pés estavam cobertos de poeira. Eles não podiam assentar-se à mesa antes de lavar os pés. Esse era o serviço dos escravos, principalmente do escravo mais humilde de uma casa. Jesus estava no cenáculo com eles. Ali não havia servos. Jesus esperou que eles tomassem a iniciativa de lavar os pés uns dos outros. Mas eles eram orgulhosos demais para fazer um serviço de escravo.
Ninguém tomou a iniciativa. Aliás, os discípulos abrigavam no coração a dúvida de quem era o mais importante entre eles (Lc 22.2430). O vaso de água, a bacia, a toalha-avental, dispostos ali à vista de todos, os acusavam. Esses utensílios constituía uma acusação silenciosa contra aqueles homens! Mesmo assim, ninguém se mexia. Eles pensavam que privilégios implicava grandeza, reconhecimento, aplausos e regalias. Jesus, porém, reprova a atitude deles, mostrando-lhes que, entre os que o seguem, mede-se a grandeza de qualquer um pelo serviço prestado. Os discípulos ficariam felizes em lavar os pés de Jesus; eles não podiam conceber, entretanto, a ideia de lavar os pés uns dos outros, visto que essa era uma tarefa normalmente reservada aos servos inferiores. Pares não lavam os pés uns dos outros, exceto raramente e como sinal de grande amor.
Foi no meio de tais homens que se sentiam muito importantes, entre eles Judas Iscariotes, o traidor, que Jesus se levanta. Mesmo sabendo que era o Filho de Deus e que tinha vindo do céu e voltava para o céu, Jesus cinge-se com uma toalha, deita água em uma bacia e começa a lavar os pés dos discípulos e a enxugá-los com a toalha. Jesus repreende o orgulho dos discípulos com sua humildade. Jesus mostra que, no reino de Deus, maior é o que serve.
A grandeza no reino de Deus não é medida por quantas pessoas estão a seu serviço, mas a quantas pessoas você está servindo. Devemos ter o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus. Ele, sendo Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus. Ele se esvaziou. Ele se humilhou. Ele sofreu morte humilhante, e morte de cruz. Devemos nos revestir de humildade. Porque aquele que se humilhar será exaltado. Jesus, sendo o soberano do universo, cingiu-se com uma toalha. Sendo o rei dos reis, inclinou-se para lavar os pés sujos dos seus discípulos. Ah, como precisamos dessa lição de Jesus hoje! Temos hoje muitas pessoas importantes na igreja, mas poucos servos.
Muita gente no pedestal, mas poucas inclinadas com a bacia e a toalha na mão. Muita gente querendo ser servida, mas poucas prontas a servir. A humildade de Jesus repreende o nosso orgulho. O mundo se encontra cheio de gente que está de pé sobre sua dignidade quando deveria estar ajoelhada aos pés de seus irmãos. Humildade e amor são virtudes que as pessoas do mundo podem entender, se elas não compreendem doutrinas. O cristão mais pobre, o mais fraco e o mais ignorante pode todos os dias encontrar uma ocasião para praticar amor e humildade. Cristo nos ensinou a fazer isso. O que Jesus teve em mente não foi um rito externo, o lava-pés, mas uma atitude interna de humildade e vontade de servir.
II. HUMILDADE IMPLICA AUTOCONHECIMENTO
1. Conhecendo a própria natureza. Jesus enfrentou a traição, a agonia e a morte porque sabia que seria exaltado junto ao Pai depois disso tudo, quando receberia a glória e a comunhão que havia usufruído na eternidade com a Trindade (veja 17.4-3). Essa era a "alegria que lhe estava proposta" que o capacitou a "suportar a cruz" (Hb 12.2). A palavra usada no versículo 15 para “o exemplo” sugere tanto "exemplo" como "padrão" (Hb 4.11; 8.5; 9.25; Tg 5.10; 2Pe 2.6). O propósito do gesto de Jesus foi estabelecer o modelo de humildade amorosa.
2. O exemplo deixado por Jesus. Humildade, santidade e felicidade. A felicidade é resultado de uma vida conduzida dentro da vontade de Deus. Jesus já havia ensinado seus discípulos acerca da humildade e do serviço, mas agora lhes dá uma lição prática. Vamos destacar a seguir três pontos nesse sentido. Em primeiro lugar, a lição sublime (13.12-14).
Ao terminar de lavar os pés dos discípulos, Jesus retorna à mesa e pergunta se os discípulos tinham entendido a lição. Então afirma: Vós me chamais mestre e Senhor; e fazeis bem, pois eu o sou. Se eu, Senhor e mestre, lavei os vossos pés, também deveis lavar os pés uns dos outros. Os discípulos tinham uma clara compreensão de quem era Jesus. Chamavam-no de mestre e Senhor. A teologia deles estava certa. Tinham-no na mais alta conta. Sabiam que ele era o próprio Filho de Deus, o Messias, o Salvador do mundo.
Mas, sem deixar de ser mestre e Senhor, Jesus lhes lavou os pés. Se Jesus, sendo o maior, fez o serviço do menor, os discípulos deveriam servir uns aos outros em vez de disputar entre si quem era o maior entre eles. Jesus nocauteia aqui a disputa por prestígio e desfaz as barracas da feira de vaidades. Em vez de buscar glória para nós mesmos, devemos nos munir de bacia e toalha para servirmos uns aos outros.
3. O maior no Reino de Deus. Embora os discípulos provavelmente estivessem dispostos a lavar os pés de Jesus, eles não podiam conceber lavar os pés uns dos outros. Isso porque, na sociedade dessa época, essa tarefa era reservada para os servos mais humildes. Companheiros não lavavam os pés uns dos outros, exceto muito raramente e como sinal de grande amor. Lucas ressalta (22.24) que os discípulos estavam discutindo sobre qual deles <;ra o maior, de modo que nenhum estava disposto a se curvar para lavar os pés.
Quando Jesus se dispôs a lavar os pés deles, ficaram chocados. O gesto de Jesus também serve como símbolo de purificação espiritual (vs. 6-9) e modelo de humildade cristã (vs. 12-17).
Por meio desse gesto, Jesus ensinou a lição de serviço abnegado, que foi exemplificado de modo supremo pela sua morte na cruz. Esses procedimentos envergonharam todos os discípulos. Enquanto os outros permaneceram em silêncio, Pedro, talvez em lugar deles (veja Mt 16.13-23), disse com indignação que Jesus não se rebaixaria a ponto de lavar os pés dele. Ele não conseguia enxergar, além do humilde serviço, o simbolismo de purificação envolvido (v. 7; cf. 1 Jo 1.7-9).
A resposta de Jesus trouxe à luz o significado real do seu gesto: a monos que o Cordeiro de Deus purifique a pessoa do pecado (ou seja, como retratado no simbolismo da lavagem), ninguém pode ter parte com ele. Jesus não foi um alfaiate do efêmero, mas o escultor do eterno. Ele não ensinou apenas com palavras, mas, sobretudo, com exemplos. O exemplo não é apenas uma forma de ensinar, mas a única forma eficaz de fazê-lo. Se o servo não é maior do que o seu senhor e se o senhor serve, então, os servos não têm desculpas para não servirem uns aos outros.
III. HUMILDADE X OSTENTAÇÃO
1. Uma competição silenciosa. “O servo não é maior do que seu Senhor; assim, se o Senhor tornar-se um servo, o que é feito dos servos? Ficam no mesmo nível que o Senhor! Ao se tornar um servo, Jesus não nos empurrou para baixo; ele nos elevou! Dignificou o sacrifício e o serviço [...]. O homem verdadeiramente grande é aquele que faz os outros se sentirem grandes, e foi isso o que Jesus fez com seus discípulos, ensinando-os a servir”.
A Bíblia relata que havia, por vezes, competição e disputa entre os discípulos de Jesus, especialmente sobre quem seria o maior entre eles. Jesus frequentemente os corrigia, ensinando sobre a importância do serviço e humildade, em vez de ambição e status.
Disputas sobre grandeza: Em vários momentos, os discípulos discutiam sobre quem seria o maior, demonstrando um desejo por posição e destaque. Jesus frequentemente repreendia os discípulos por essas disputas, enfatizando que a grandeza no Reino de Deus não se baseava em status ou posição, mas sim no serviço aos outros.
É importante lembrar que os discípulos eram humanos, com suas imperfeições e limitações. A Bíblia não relata tudo o que aconteceu entre eles, mas é possível que houvesse desentendimentos e discussões.
2. O caminho humilde de Jesus. A vida cristã não se limita ao conhecimento da verdade. O conhecimento precisa desembocar na obediência. A felicidade não está apenas em saber, mas, sobretudo, no praticar o que se sabe, pois o ser humano não é aquilo que ele sabe nem o que ele sente, mas o que ele faz. É importante manter essas lições na ordem correta: humildade, santidade, felicidade. Sujeitar-se ao Pai, manter a vida pura e servir aos outros: esta é a fórmula de Deus para a verdadeira alegria espiritual. Jesus define o que é felicidade (13.17).
Bem-aventurados, aqui, significa muito felizes. Mas quem é feliz? É aquele que serve, e serve aos mais fracos, da maneira mais humilde. Feliz é aquele que não apenas chama Jesus de mestre e Senhor, mas também imita Jesus, servindo ao próximo. Ser feliz segundo o mundo é estar acima dos outros. E ser servido por todos. Ser feliz no reino de Deus é rebaixar-se para servir aos mais fracos. A grandeza no reino de Deus não é medida por quantas pessoas nos servem, mas a quantas pessoas nós servimos.
A felicidade não é um fim em si mesma, mas um subproduto de uma vida que vivemos dentro da vontade de Deus. O mundo pensa que a felicidade é resultado de outros nos servirem, mas a real felicidade é servirmos aos outros em nome de Jesus. O mundo pergunta: “Quantas pessoas servem você?” Mas Jesus pergunta: “A quantas pessoas você está servindo?” No reino de Deus, o maior é o servo de todos. O crente não deve se envergonhar de fazer nenhuma coisa que Jesus tenha feito (13.17).
Jesus deixou a glória, o céu, os anjos, o trono e veio ao mundo para servir, para servir pecadores como eu e você. Na vida cristã, não há espaço para vaidade e orgulho. Nosso rei foi servo. Ele se esvaziou. Despiu-se da sua glória. Nasceu numa manjedoura. Não tinha onde reclinar a cabeça. Cingiu-se com uma toalha. Lavou os pés de homens fracos e cheios de vaidade. Fez um trabalho próprio dos escravos. E seus discípulos deveriam fazer o mesmo. Jesus nos ensina sobre a inutilidade do conhecimento religioso que não é acompanhado pela prática (13.17).
Um conhecimento que não se traduz em trabalho, em obra, em serviço, é estéril e não pode trazer felicidade. Não basta conhecer a verdade se não somos transformados por ela. O conhecimento sem amor envaidece. A fé sem obras é morta. A doutrina sem vida é inútil. O conhecimento sem obediência nos torna mais culpados diante de Deus. O conhecimento sem prática não nos coloca acima do nível dos demônios (Mc 1.24; Tg 2.20).
Satanás conhece a verdade, mas não tem nenhuma disposição para obedecer. Conhecimento sem prática descreve o caráter de Satanás, e não do crente. Por isso, Satanás é sumamente infeliz. Um crente feliz é aquele que não apenas conhece, mas pratica o que conhece.
3. Um convite à humildade. A palavra grega praus, traduzida por mansidão, não significa fraqueza, mas força sob controle. Refere-se a alguém que, embora tenha poder e autoridade, escolhe não impor-se de forma violenta. A mansidão de Jesus se manifesta na forma como Ele lida com os pecadores, os marginalizados e os discípulos falhos. Ele é firme diante da hipocrisia (como com os fariseus), mas sempre compassivo com os quebrantados.
Já o termo Humildade (gr. tapeinos), significa “baixo, modesto”, e em termos morais, aponta para alguém que reconhece sua posição diante de Deus. Jesus, embora sendo Deus, esvaziou-se a si mesmo (cf. Filipenses 2:5–8), assumindo a forma de servo.
Sua humildade é vista na encarnação, no serviço (como no lava-pés) e na cruz. Ao terminar de lavar os pés dos discípulos, Jesus retorna à mesa e pergunta se os discípulos tinham entendido a lição.
Então afirma: Vós me chamais mestre e Senhor; e fazeis bem, pois eu o sou. Se eu, Senhor e mestre, lavei os vossos pés, também deveis lavar os pés uns dos outros. Os discípulos tinham uma clara compreensão de quem era Jesus.
Chamavam-no de mestre e Senhor. A teologia deles estava certa. Tinham-no na mais alta conta. Sabiam que ele era o próprio Filho de Deus, o Messias, o Salvador do mundo.
Mas, sem deixar de ser mestre e Senhor, Jesus lhes lavou os pés. Se Jesus, sendo o maior, fez o serviço do menor, os discípulos deveriam servir uns aos outros em vez de disputar entre si quem era o maior entre eles.
Jesus nocauteia aqui a disputa por prestígio e desfaz as barracas da feira de vaidades. Em vez de buscar glória para nós mesmos, devemos nos munir de bacia e toalha para servirmos uns aos outros.
CONCLUSÃO
A humildade, do latim humilitas (relacionada a humus, "terra fértil"), é a virtude que nos leva a reconhecer, com sinceridade e equilíbrio, quem realmente somos: nossas forças, nossas limitações, nossa dependência de Deus (para os que creem) e nossa necessidade de crescer continuamente. Humildade não é autodepreciação nem negação do valor pessoal. Pelo contrário, é lucidez interior.
O oposto da humildade é o orgulho — que muitas vezes cria uma imagem inflada de si mesmo, impedindo-nos de ver: nossas fraquezas e vícios, nossos medos e mecanismos de defesa, as formas como ferimos os outros ou sabotamos a nós mesmos. Sem humildade, permanecemos em uma zona de autoengano.
A humildade nos permite olhar para dentro com verdade; A humildade abre espaço para o olhar honesto, sem máscaras: Admitimos que não sabemos tudo. Reconhecemos que temos feridas e áreas não resolvidas. Ficamos mais dispostos a ouvir, a aprender, a crescer — sem nos prender a uma imagem falsa de perfeição. Jesus, ao falar de ser "manso e humilde de coração" (Mt 11:29), revela um tipo de pessoa aberta, acessível, verdadeira — não defensiva nem egocentrada. Como precisamos resgatar esse ensino hoje.
Amem