3 de janeiro de 2018

A CARTA AOS HEBREUS E A EXCELÊNCIA DE CRISTO


A CARTA AOS HEBREUS E A EXCELÊNCIA DE CRISTO

 

                                                       Pr. JOSÉ COSTA JUNIOR

 

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

 

A Epístola aos Hebreus não é igual a nenhum outro livro do Novo Testamento. Ela começa como um tratado, continua como um sermão e conclui como uma carta. Conclui como uma carta, mas não começa como tal, pois não tem a saudação costumeira e não dá nem o nome do escritor nem o nome da comunidade à qual foi enviada. Contudo, por toda parte, o livro está claramente escrito para um grupo particular de leitores. Está escrito no melhor grego literário encontrado no Novo Testamento. O vocabulário é copioso e o estilo mostra traços de esforço e cuidado. A linguagem, ordem, ritmo, sintaxe, todos contribuem para o efeito total. O autor jamais é impetuoso; ele não é levado a se desviar por seus pensamentos. A beleza da carta pode mais facilmente ser apreciada que os detalhes do argumento, que demandam uma familiaridade não somente com o Velho Testamento, mas também certos tipos de interpretação do Velho Testa­mento vigentes no primeiro século.

 

Contudo, o leitor moderno sente que o autor de Hebreus o está dirigindo aos problemas com que o cristão se confronta hoje. Os primeiros leitores foram confrontados com fatos angustiantes. Particularmente na qualidade de quem anteriormente haviam sido zelosos aderentes do judaísmo. Parece muito provável que os primeiros leitores da epístola tinham ficado pessoalmente desapontados com o Cristianismo porque, por um lado, ele não lhes tinha proporcionado qualquer reino visível terreno e, por outro lado, o Cristianismo havia sido decisivamente rejeitado pela grande maioria dos seus irmãos de raça, os judeus. Além disso o contínuo apego ao Evangelho parecia apenas envolvê-los na participação das repreensões injuriosas de um Messias sofredor e crucificado, e no ter de enfrentar a possibilidade de violenta perseguição anticristã. É bem possível, portanto que se sentissem seriamente tentados a renegar a Jesus como o Messias e tornar a abraçar os bens visíveis e preferíveis, que o judaísmo parecia continuar a oferecer-lhes.

 

Que era o judaísmo que assim os atraía, em detrimento do Cristianismo, parece confirmado pelo modo óbvio com que o escritor resolve, desde o início da epístola, demonstrar a superioridade do novo pacto sobre o antigo, exibindo particularmente a proeminente excelência de Jesus, o Filho de Deus, em comparação com os profetas e os anjos, os líderes e os sumos sacerdotes que operavam na antiga dispensação. Portanto, o escritor mostra que se a antiga ordem era imperfeita e provisória, o Cristianismo trouxe perfeição (7.19), e perfeição que é eterna (5.9; 9.12,15; 13.20). Tanto o autor como seus leitores originais aparentemente eram judeus helenistas que tinham alguma familiaridade com o pensamento filosófico dos gregos, e parece que o autor lança mão de ideias baseadas em tais origens ao declarar que a antiga ordem continha meramente "figura do verdadeiro" (9.24) ou então apenas a "sombra dos bens vindouros, não a imagem real das coisas" (10.1).

 

O leitor moderno também vive numa época de sublevação social, religiosa e cultural. As dificuldades pressionam de todos os lados, à medida que o cristão encara problemas desconcertantes, de proporções gigantescas. Onde está o Cristo em tudo isto? Este livro fala ao cristão de hoje, bem como ao cristão daqueles dias, urgindo-o a encontrar a solução para o problema básico, numa visão mais plena da pessoa e da obra de Jesus, o Cristo. O escritor diz que a religião, ou a verdadeira adoração, não é presa a coisas externas; ela é derivada de uma fé na supremacia de Cristo em todas as coisas: a palavra perfeita de Deus ao homem e o representante perfeito do homem perante Deus. Este livro lembra ao crente que não é parte de sua chamada ser complacente, procurar uma facilitação nas dificuldades, voltando às antigas formas de vida, ou mesmo ser desencorajado pela natureza complexa dos assuntos mundiais, conforme eles o afetam pessoalmente. O crente deve pôr-se, em primeiro lugar, continuamente no propósito de Deus, ao longo do caminho já marcado por Jesus Cristo, o autor e aperfeiçoador da fé do crente (12:2).

 

Há alguns problemas críticos em Hebreus, contudo, para os quais não há soluções fáceis. Faltando uma saudação, dois problemas estão imedia­tamente evidentes: Quem escreveu este livro e a quem foi dirigido? Problemas concomitantes são os do propósito, ocasião, data e local. Há muita discussão sobre cada um desses pontos pelos eruditos bíblicos modernos, com muito pouco acordo sobre qualquer um. Mas, para que este livro possa falar à nossa própria situação, é necessário determinar-se algo do cenário original em que a epístola foi produzida e o que ela significou para seus primeiros leitores.

 

            O objetivo deste estudo é trazer algumas informações, colhidas dentro da literatura evangélica, com a finalidade de ampliar a visão sobre a carta aos Hebreus e a excelência de Cristo. Não há nenhuma pretensão de esgotar o assunto ou de dogmatizá-lo, mas apenas trazer ao professor da EBD alguns elementos e ferramentas que poderão enriquecer sua aula.

 

 

I.                   AUTORIA, DESTINATÁRIO E PROPÓSITO

 

Na própria epístola não encontramos indicação explícita sobre seu escritor. Os escritores cristãos primitivos também não nos provem qualquer testemunho unânime ou convincente. Tertuliano afirma que Barnabé foi quem a escreveu. Mas a tal afirmação falta confirmação; ainda que reste algo a dizer a favor do mesmo. O homem a quem foi dado o nome cristão que significa "filho da exortação" (At 4.36), bem poderia ter sido o responsável por esta "presente palavra de exortação" (13.22). Sendo levita, certamente ele se interessava mais que ordinariamente nos rituais sacrificais; sendo judeu de Chipre, mui possivelmente ele tivera íntimo contato com os ensinos helenistas e filosóficos do judaísmo de Alexandria, com os quais tanto o escritor como os seus leitores parecem ter tido alguma familiaridade; na qualidade de alguém que se converteu imediatamente após Pentecoste (o que talvez seja referido em 2.3-4) indubitavelmente ele foi influenciado pelo ensino de Estêvão, uma influência que parece persistir nesta epístola.

 

Em Alexandria, onde a epístola foi aceita por seus próprios méritos, há evidência de uma tendência crescente, no terceiro século de nossa era, de ligá-la ao apóstolo Paulo, ainda que bastante indiretamente. Clemente sugeriu que Paulo escreveu-a em hebraico e que Lucas a traduziu para o grego. Orígenes se inclinava a pensar que os pensamentos originais fossem do apóstolo, ainda que não a forma escrita e a linguagem finais. Tal conexão dessa epístola ao nome de Paulo muito contribuiu para que lhe conferissem autoridade apostólica, na falta do que muitos hesitaram em aceitá-la como canônica. Por consequência, muitas cópias manuscritas vieram a ser intituladas "A Epístola de Paulo aos Hebreus". Entretanto, essa atribuição da epístola ao apóstolo, não é aceita pela maioria dos eruditos contemporâneos. A própria evidência interna da epístola, como sua linguagem, estilo e conteúdo, é considerada como prova conclusiva contra essa suposição (por exemplo, contrastar Hb 2.3 com Gl 1.12; Gl 2.6).

 

Outras sugestões são inteiramente especulativas. Incluem os nomes de Apolo, Silas, Áquila (ou Prisca e Áquila) e Filipe, o evangelista. Dentre essas, a sugestão de Lutero-Apolo-é talvez a mais acertada. Pelo que sabemos de Apolo (ver At 18.24-28), ele é exatamente o tipo de homem que poderia ter escrito tal epístola. Porém, não existe qualquer outra evidência para comprovar que ele tenha sido seu autor. Quando um escritor humano das Escrituras foi providencialmente levado a ocultar sua identidade, não há necessidade de tentar descobri-la, havendo pouco ou nenhuma esperança de sucesso nessa tentativa. É mais sábio que nos contentemos em não sabê-lo.

 

            Juntamente com o problema da autoria, a Epístola aos Hebreus apresenta um problema quanto a seus primeiros leitores. A quem escreveu o autor? Assim como a falta de uma introdução impede a atribuição do nome do autor, igualmente a destinação não é apresentada. Se este livro é verdadeiramente uma carta, isto seria razão suficiente para se crer que o título não é original. Supõe-se que o título foi acrescentado, para se distinguir este livro de outros que foram aceitos, lidos e discutidos pelas igrejas primitivas. O título expressa, contudo, a crença dos escrito­res patrísticos de que o livro foi escrito àqueles que, por nascimento, eram judeus. Também não há evidência de que a carta tenha tido um título diferente. Embora Clemente de Roma e Hermas (também de Roma) não tenham citado a carta em seus escritos, o título é antigo. Panteno e Clemente de Alexandria conheciam este título na última metade do segundo século, e o manuscrito Papiro II, de Chester Beatly, do final do segundo século, tem o título pr/oj  0ebra/iouj "A Hebreus"). Tertuliano (por volta de 200) conheceu o título correspondente em latim, Ad Hebraeos. Foi sugerido que talvez o título tenha vindo a ser usado por analogia com os títulos da Epístola aos Romanos e a Epístola aos Gálatas. A falácia disto é imediatamente aparente quando se observa que os versículos introdutórios dessas duas cartas expressam uma igreja, ou igrejas, num contexto geográfico (Rm. 1:7; Gl. 1:2). A falta dos versículos introdutórios, nos manuscritos existentes, obstaria esta analo­gia. Além do mais, é improvável que uma carta fosse enviada com uma saudação contendo somente "Aos hebreus". É muito mais provável que o título tenha surgido da impressão recebida, ao se ler a carta, e sido uma tentativa de se determinar pelo conteúdo o caráter de seus primeiros leitores. Portanto, o título representa a impressão de que a carta foi originalmente escrita a um grupo de cristãos judeus, num lugar específico geograficamente.

É pressuposto, pelo escritor, que seus leitores estão muito familiarizados com o sacerdócio aarônico e levítico, tendo um interesse ativo nele, bem como estando totalmente familiari­zados com o Velho Testamento, o aceitando como autoridade e como sendo sagrado. Além disso, sente-se que o escritor estava dirigindo suas palavras a um grupo particular, a quem conhecia pessoalmente (6:9,10; 10:34; 13:7,19).

 

Era uma igreja, ou um grupo dentro de uma igreja, que estivera em existência por algum tempo (5:12; 13:7), mas não havia visto ou ouvido Jesus em pessoa (2:3,4). Era um grupo que já havia sofrido perseguição (10:32-34), mas não havia ainda experimentado o martírio (12:4). Tinha uma história de liberalidade e generosidade em cuidar daqueles que sofreram mais, em tempos de perseguição (6:10; 10:34). Havia tido alguns grandes líderes e mestres no passado (13:7), mas não havia progredido na fé cristã (2:1-4; 3:12-19; 6:4-6; 10:25-29; 12:14-16). Parece que estava começando a separar-se de outros cristãos na comuni­dade (10:25).

 

Mas, onde vivia esse grupo? Tradicionalmente, supunha-se que a carta foi primeiramente enviada a Jerusalém, pois lá o sacerdócio aarônico (levítico) servia no ritual do templo. O principal obstáculo a esta suposição é que a carta tem muito a dizer acerca do tabernáculo móvel, mas não do templo. Também teria havido alguns em Jerusalém que teriam ouvido e visto Jesus (contrariamente a Hb 2:3). O uso familiar da Septuaginta, em contrário ao Velho Testamento em hebraico, é outro argumento contra Jerusalém como a destinação desta carta. Também estes leitores não haviam "resistido até o sangue" (12:4), ao passo que os cristãos judeus em Jerusalém haviam sofrido martírio cedo ('At. 7:58-8:3), e, através da era apostólica, a igreja em Jerusalém fora mais uma receptora que doadora de auxílio (6:10; cf. At. 11:29; Rom. 15:26; etc).

 

De alguma maneira, a Epístola aos Hebreus está ligada com Roma. A expressão contida em 13:24 ("Os de Itália vos saúdam") é melhor entendida como aqueles que vieram da Itália e agora, na presença do autor da carta, estavam enviando saudações de volta a seus amigos na Itália. Esta é a maneira normal de se interpretar a frase. Contudo, ela poderia significar "os que estão na Itália", onde está também o escritor, mas isto força o sentido. Apoiando uma destinação romana, estão as alusões literárias mais antigas a esta carta, que vem de Roma.

 

Embora nem Clemente nem Hermas (ambos de Roma) mencionem a carta por nome, existem paralelos significativos, no vocabulário, para se concluir que ambos conheceram esta carta. De recursos extra bíblicos, o que se sabe acerca da igreja romana, desde seu princípio, mostra que ela era caracterizada por sua liberalidade e generosidade. Ela também tinha sofrido perseguição e perda de possessões (10:32), mas não perda de vidas (12:4), o que poderia ter ocorrido durante a época em que Cláudio expulsou os judeus de Roma (49 d.C). Na Epístola de Paulo aos Romanos (Rm. 14), a igreja em Roma parece ser escrupulosa em relação à comida, o que também é visto em Hebreus (13:9). Além disso, é sugerido, em Romanos 11:13,18, que a igreja em Roma tinha uma base cristã-judaica.

 

Embora estas considerações não sejam conclusivas, elas parecem encaixar-se melhor na situação que outras sugestões. Da informação contida na carta, parece que as pessoas endereçadas eram cristãos judeus que viviam fora da Palestina, na tradição do judaísmo não-conformista. Além disso, a carta está, de algum modo, relacionada com a Itália (13:24), que provavelmente significa Roma. Certeza além deste ponto é impossível, pelos materiais que temos à nossa disposição. Assim como a autoria permanece sendo um enigma, também a identidade da destina­ção desta carta.

 

Há, provavelmente, tanto debate acerca do propósito de Hebreus quanto há acerca de sua autoria e destinação. A

 

identificação do autor e dos primeiros leitores são de menos importância que determinar a razão para a escrita. A carta foi escrita de tal maneira que sua própria interpretação está determinada por seu propósito. O autor descreve sua mensagem como uma "palavra de exortação" (13:22), e isto deve indicar algo de seu propósito. Além disso, a palavra "exortar" (como verbo, substantivo e adjetivo) é usada seis vezes, através da epístola, e o verbo "advertir" aparece três vezes. Deve-se concluir que o assunto era de importância prática vital. Mas, qual era o assunto? O que foram os leitores exortados a fazerem ou não fazerem?

 

          É uma admoestação para que os cristãos judeus façam um completo rompimento com as velhas formas do judaísmo e para que entrem na maturidade da "vida abundante", que só pode ocorrer em Jesus Cristo e através dele (João 10:10). Era a tendência, na igreja primitiva, ficar o cristão perto demais dos elementos judaicos do grupo primitivo. Aqui está uma admoestação para ele afastar-se dos elementos do ritual judaico; uma exortação para encontrar a maturidade não no ritualismo do velho concerto, mas na nova religião do Espírito e da liberdade (João 3:1-15). O cristianismo não deve ser desenvolvido dentro do judaísmo (Luc. 5:36-39). O autor estava escrevendo àqueles que haviam-se tornado cristãos, mas ainda estavam-se prendendo ao ritualismo do judaísmo, o ritualismo que jamais poderia efetuar um resultado permanente (7:19; 10:1). Continuar com o ritualismo seria equivalente ao fracasso de seus pais em entrarem na Terra Prometida; demonstra uma falta de fé completa na obra de Jesus Cristo.

 

É por esta razão que o autor desenvolveu seu argumento como fez. Tudo de bom no judaísmo não era mais que uma sombra do que é real em Jesus Cristo (9:23-10:18 - 12:14-17). Jesus é superior, em todos os aspectos, àquilo sobre o que o judaísmo foi construído: as revelações através dos pais e dos anjos (1:1-2:18), Moisés (3:1-4:13), Arão (4:14-7:28), o sistema sacrificial (8:1-10:18). O autor não condena estes elementos como sendo maus, nem fala acerca deles de maneira depreciadora; mostra, sim, que eles foram substituídos. Eles foram úteis, mas agora serviram para sua finalidade e devem ser abandonados, desde que Jesus veio (1:2; 3:3; 8:12; 10:14). Há cinco passagens admonitórias, cada uma sendo uma exortação ou advertência contra o deixar de crescer na maturidade cristã (2:1-4; 3:7-19; 6:4-8; 10:26-39; 12:14-17). A urgência e necessidade do cresci­mento espiritual (6:1-20) são confirmadas por aqueles que, na história de Israel, se apressaram em completa fé na promessa de Deus de uma vida espiritual mais rica (10:36-11:40), sendo o próprio Jesus o exemplo supremo (12:2).

Mas qual é a mensagem de Hebreus para o cristão moderno? É sempre a tendência de o novo crente ficar perto demais dos elementos de sua vida anterior, de trazer alguns desses elementos para dentro de sua nova vida. Algumas das coisas velhas são bem obviamente erradas e devem ser abandonadas desde o início. Há outras coisas, contudo, que não são más em si, e é difícil determinar-se quais são realmente prejudiciais e quais não são. Hebreus assenta os princípios básicos para a maturidade cristã. Esta epístola foi escrita a cristãos que estavam num estado de crescimento impedido (5:11-6:3); ainda eram crianças espirituais. Precisavam crescer tão naturalmente na vida espiritual como as crianças normais o fazem na vida física. Há um perigo em permanecer-se sempre uma criança (6:4-20). Mas, esse crescimento deve ocorrer em Jesus Cristo; tudo o que se precisa para o crescimento encontra-se no Senhor e Salvador Jesus Cristo. O crescimento só pode ocorrer à medida que os olhos da pessoa estejam centralizados em Jesus (Hb. 12:2) e a vida seja rendida completamente a ele, em fé. Ele é nosso tudo em todos, o eterno (13:8). Ele é capaz de aperfeiçoar em nós tudo o que é necessário para nosso crescimento até a maturidade espiritual (4:14-16).

 
II.                CRISTO A PALAVRA SUPERIOR A DOS PROFETAS


O primeiro capítulo da epístola Aos Hebreus trata de assuntos primordiais à nossa vida de fé. O autor estava imbuído da responsabilidade de mostrar que a revelação em Cristo ultrapassa e é superior a todos os outros mediadores entre Deus e os homens, a saber: profetas e anjos. Para demonstrar essa realidade, utiliza-se da Palavra de Deus como única fonte. Assim, podemos dizer que o conceito pode ser desenvolvido por meio de algumas perguntas simples: como Deus falou? Quando falou? Por intermédio de quem falou? A quem falou? O que falou? E para que falou?

 

            O Cristianismo é uma religião de revelação. Deus fala às pessoas e por intermédio das pessoas. O Velho Testamento nos dá conta de que Ele falou por teofanias, visões, oráculos e sinais, por meio de voz suave, pela chorosa compaixão de Jeremias, por denúncias feitas por Amós ao som de trombeta, usando a fome, seca e pestilência, também a colheita abundante, a libertação do exílio, a lei, juízes, poetas e profetas.

 

            Apesar disso, o autor informa aos hebreus que, nos últimos dias, Deus falou por meio de um que com ele tem relacionamento de filho e, consequentemente, completa autoridade. É bom que o ouvinte compreenda que a expressão nestes últimos dias era comum aos hebreus e possuía sentido messiânico. Assim, quando Deus falou teria como resposta os dias recentes, nos últimos dias, cumprindo a expectativa da chegada do Messias.

 

            O profeta Amós havia apregoado a justiça; Isaías, a santidade; Oséias, o amor perdoador. Nestes últimos dias, Deus mandou seu mais autorizado porta-voz, Cristo.  Vemos que o entendimento do Velho Testamento que o autor exibe aponta para uma continuidade na revelação. As formas utilizadas pelo Antigo Testamento não sofrem solução de continuidade, pelo contrário, são aperfeiçoadas com a revelação final em Jesus Cristo.

Cristo, declara-nos o autor, é o cumprimento das promessas de Deus.

 

Deparamo-nos com alguns pensamentos que podem nos ajudar a compreender com mais facilidade por que dizemos que a fé cristã é melhor, é superior. Com o auxílio da chamada Bíblia Shedd, Edições Vida Nova, podemos elencar sete declarações que revelam a majestade e poder de Cristo, mencionadas pelo autor da epístola e ratificadas por outras referências bíblicas:

 

1.      Cristo é o herdeiro de todas as coisas: Efésios 1:20-23;

2.      Ele é o Agente da Criação: João 1:3;

3.       Ele é o brilho que irradia o Deus que é Luz: I João 1:5;

4.      Ele manifesta a verdadeira natureza de Deus: II Coríntios 4:4; Colossenses 1:5;

 

5.      Sua palavra poderosa sustenta o Universo: Colossenses 1:17;

6.      Ele é o sacerdote que se oferece a si mesmo como sacrifício para purificar os pecados: João 1:29, e

7.      Ele ocupa o trono soberano, à direita de Deus: Salmos 110:1 e Efésios 4:10.

           

Porque oportuno, detenhamo-nos na leitura dos quatro primeiros versículos, que tornarão o que acabamos de destacar ainda mais significativo: “havendo Deus, outrora, falado muitas vezes e de muitas maneiras aos pais, pelos profetas, nestes últimos dias nos falou pelo Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas, pelo qual também fez o Universo. Ele, que é o resplendor da glória e a expressão exata do seu Ser, sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder, depois de ter feito a purificação dos pecados, assentou-se à direita da Majestade, nas alturas, tendo-se tornado tão superior aos anjos quanto herdou mais excelente nome do que eles”.

           

Importante destacar que Hebreus nos aponta Cristo como o Logos de Deus, a sabedoria de Deus e o agente de Deus na criação. Os estudiosos do assunto costumam chamar a nossa atenção para duas correntes de pensamento que tinham destaque naqueles dias com relação à interpretação do relacionamento entre Jesus e Deus.

 

            A primeira é conhecida como adopcionista e diz que Jesus se tornara, na História, o Filho de Deus por nomeação do Pai e a outra afirma que Jesus era o Filho preexistente, estava com Deus no princípio. Sabedores disso, compreendemos melhor a razão do autor destacar com tanta certeza que Jesus era o herdeiro de todas as coisas, criador do Universo, resplendor da glória de Deus e sustentador do Universo pelo seu poder. Além de criar ele sustenta, não abandona a coisa criada à sua própria sorte.

 

Em Seu ser eterno Ele é Deidade genuína e absoluta, o resplendor ou brilho visível da glória de Deus, sendo Ele mesmo a expressão exata da deidade (gr. charakter tes hupostaseos, "reprodução da substância"), o Filho eterno do Pai, "vero Deus do Deus verdadeiro". No planejamento divino do universo, Cristo é o autor, sustentador e fim. Tudo foi criado por Ele. Ele sustenta a criação inteira. Ele é o seu herdeiro. Note-se que o fim é visto desde o início; a divina nomeação do Filho como herdeiro do universo precede a criação do universo.

 

Em relação aos homens, Cristo é o Profeta, o Sacerdote e o Rei dos homens. Em Cristo Deus proferiu Sua final palavra de revelação; e assim Ele traz Deus aos homens (cfr. Jo 1.14-18). Em Sua própria Pessoa Ele expurgou nossos pecados e consumou a obra de reconciliação; e assim Ele apresenta os homens a Deus. Agora Ele está entronizado à mão direita de Deus. Na qualidade de exaltado Deus-Homem, Ele obteve, por virtude de herança, uma posição muito acima de todos os outros (cfr. Ef 1.20-21; Fp 2.9-11).

 

III.             CRISTO SUPERIOR AOS ANJOS

Muitos judeus tinham um respeito supersticioso ou idólatra pelos anjos, porque tinham recebido a lei e outras notícias da vontade divina por sua ministração. Os consideravam como mediadores entre Deus e os homens, e alguns chegaram tão longe como para dar-lhes uma espécie de homenagem religiosa ou adoração. De modo que era necessário não só que o apóstolo insistisse em que Cristo é o Criador de todas as coisas e, portanto, criador dos próprios anjos, senão em que era o Messias em natureza humana ressuscitado e exaltado, a quem estão sujeitos os anjos, as autoridades e as potestades.

Para provar isto cita várias passagens do Antigo Testamento. Comparando o que Deus diz ali dos anjos com o que diz a Cristo, manifesta-se claramente a infinidade dos anjos a respeito de Cristo. aqui está o ofício dos anjos: são os ministros ou servos de Deus para fazerem sua vontade, porém, que coisas grandiosas diz o Pai de Cristo! Reconheçamo-lo e honremo-lo como Deus, pois se não tivesse sido Deus, nunca teria feito a obra de mediador e nunca teria levado a coroa do Mediador. Declara-se como Cristo foi apto para o ofício de Mediador e como foi confirmado nele: leva o nome de Messias por ser o Ungido. Somente como Homem tem seus semelhantes, e como ungido com o Espírito Santo; mas está por acima de todos os profetas, sacerdotes e reis que jamais tenham sido utilizados no serviço de Deus na terra.

Cita-se outra passagem da Escritura, o Salmo 102.25-27, no qual se declara o poder onipotente do Senhor Jesus Cristo, tanto ao criar o mundo como ao mudá-lo. Cristo envolverá este mundo como se for uma vestidura, para que não se abuse mais dele, nem seja usado como o tem sido. Assim como o soberano, quando as roupagens de seu estado lhe são tiradas para serem dobradas e guardadas, continua sendo o soberano, do mesmo modo nosso Senhor continuará sendo o Senhor quando tiver deixado a terra e os céus, como uma vestimenta. Então, não coloquemos nossos corações no que não é o que acreditamos que seja, e não será o que é agora. O pecado tem feito uma grande mudança no mundo, para pior, e Cristo fará uma grande mudança para melhor. Que estes pensamentos nos alertem, diligentes e desejosos do mundo melhor.

O Salvador tem realizado muito para fazer que todos os homens sejam seus amigos, porém tem inimigos, embora serão colocados por estrado embaixo de seus pés, pela submissão humilde ou pela destruição extrema. Cristo continuará vencendo. Os anjos mais excelsos não são senão espíritos ministradores, somente servos de Cristo para executarem seus mandamentos.

Os santos são herdeiros no presente, que ainda não entraram na plena possessão. Os anjos os ministram opondo-se à maldade e consolando suas almas, submetidos a Cristo e ao Espírito Santo. Os anjos reunirão a todos os santos no último dia, quando sejam lançados da presença de Cristo à miséria eterna todos os que depositaram seu coração e suas esperanças nos tesouros perecíveis e nas glórias passageiras.

 

CONCLUSÃO

 

Na confecção deste pequeno estudo, buscamos consultar literatura que mais se aproxima com o pensamento de nossa denominação, tentando não perder a coerência teológica. Evitamos expressar conceitos e opiniões pessoais sem o devido embasamento na Palavra, pois a finalidade é agregar conhecimentos, enriquecer a aula da escola dominical e proporcionar ao professor domínio sobre a matéria em tela. Caso alcance tais finalidades, agradeço ao meu DEUS por esta grandiosa oportunidade.

 

 

 

 

                                                       Pr. JOSÉ COSTA JUNIOR

 

Nenhum comentário: