20 de junho de 2010

ESPERANÇA NA LAMENTAÇÃO

ESPERANÇA NA LAMENTAÇÃO

TEXTO ÁUREO = “ As misericórdias do Senhor são a causa de não sermos consumidos; porque a suas misericórdias não têm” ( Lm 3. 22)

VERDADE PRATICA = Por serem trabalhosos estes últimos dias, a presente hora é de contrição e súplicas diante do Senhor. Que Ele nos ouça o clamor e avive-nos espiritualmente, enquanto há esperança

Introdução

Pano de Fundo Histórico

A catástrofe terrível que ocorreu com o país de Judá e a cidade de Jerusalém em 587- 586 a.C. constitui a cortina de fundo desse pequeno livro. O exército babilônico de Nabucodonosor tinha sitiado Jerusalém por dezoito longos meses. Quando a cidade afetada pela fome e doença foi finalmente tomada, ela foi totalmente demolida e incendiada. Foi uma ocasião trágica e muito sofrida para o povo judeu. A segurança de Jerusalém era vista como uma doutrina preciosa pelos habitantes da cidade desde os tempos de Isaías (701 a.C.). Agora, os que estavam vivos para ver a cidade em ruínas e o Templo completamente destruído tinham dificuldades em acreditar naquilo que viam. A aflição deles era quase insuportável. Nos meses e anos que se seguiram, suas mentes foram importunadas com muitas perguntas não respondidas acerca da sua história passada e do seu destino futuro

1 – TITULO E LUGAR NO CÂNON

No texto hebraico o livro não recebe título, mas semelhantemente aos livros do Pentateuco, ele era conhecido pela sua primeira palavra: “Como!”, ‘eykah (também a primeira palavra dos capítulos 2 e 4). No entanto, de alguma forma, no decorrer dos séculos os rabinos começaram a referir-se a esse livro como “lamentações” ou “hinos fúnebres” (qinot), e ele aparece com esse nome no Talmude babilônico. Os tradutores da Septuaginta, a versão grega do Antigo Testamento, seguiram os rabinos ao usar o termo grego para lamentações, Threnoi. Eles foram um passo adiante e atribuíram o livro a Jeremias. Conseqüentemente, as versões gregas posteriores, a siríaca, a antiga versão latina, a Vulgata de Jerônimo e as versões em inglês e português têm colocado o seguinte título: “As Lamentações de Jeremias”.

Na Bíblia Hebraica atual o livro de Lamentações não faz parte dos Livros Proféticos, mas, sim, dos Escritos (Hagiógrafos). Ele é um dos Cinco Rolos (Megilloth) daquela seção (o terceiro) das Escrituras Hebraicas. Por meio da Septuaginta e dos escritos de Josefo fica evidente que a posição desse livro nem sempre foi essa. A Septuaginta coerentemente colocou Lamentações junto com a profecia de Jeremias. Em um comentário acerca do número e natureza das Sagradas Escrituras,1 Josefo faz o mesmo. Ao se referir aos livros do Antigo Testamento, Josefo afirma que são vinte e dois, e os divide em três grupos

Embora não mencione Lamentações pelo nome, para chegar ao número vinte e dois, ele precisava juntar Lamentações com Jeremias e Rute com o livro de Juízes, Ele evidentemente seguiu a Septuaginta ao posicionar Lamentações entre os Livros Proféticos e não entre os Escritos. Melito, bispo de Sardes (180 d.C.), semelhantemente chegou aos mesmos vinte e dois livros, no que foi seguido por Orígenes (250 d.C.), Agostinho (420 d.C.) e Jerônimo (405 d.C.). Isso significa que todos esses homens acreditavam que o livro de Lamentações pertencia aos Livros Proféticos e não aos hagiógrafos.

Jerônimo, no entanto, menciona que “alguns incluíam Rute e Lamentações nos hagiógrafos e, dessa forma, acreditavam existir vinte e quatro livros no Antigo Testamento”.2 Esses estudiosos podiam estar se referindo a 2 Esdras e ao Talmude. Dessa forma eles acreditavam existir vinte e quatro livros e colocavam Lamentações entre os Escritos. Podemos concluir que durante o período intertestamental e nos primeiros séculos da Igreja Cristã não existia uma posição oficial e unânime em relação aos livros das Escrituras. O livro de Lamentações em um catálogo era encontrado nos Escritos e em outro nos Livros Proféticos. As nossas Bíblias seguem a ordem da Septuaginta e relacionam o livro de Lamentações com Jeremias.

II – AUTORIA E DATA

O texto hebraico não menciona ninguém especificamente como autor do livro de Lamentações. Mas uma longa tradição coloca Jeremias como autor desse livro. Não se pode negar que o livro é escrito no espírito de Jeremias e apresenta muitas similaridades com suas profecias. A Septuaginta, no entanto, é a fonte mais antiga que atribui esses poemas a Jeremias. Embora 2 Crônicas 35.25 tenha sido citado, com freqüência, como referência bíblica para a autoria de Jeremias do livro de Lamentações, essa passagem meramente menciona que Jeremias escreveu um lamento acerca da morte do rei Josias que ficou conhecido pelos cantores do Templo em uma época posterior. Ele conecta Jeremias com esse tipo de literatura, mas isso apenas confirma o que já sabemos acerca do próprio livro do profeta. Não é possível saber se esse versículo se refere ao livro de Lamentações, porque o repertório coral do Templo devia conter muitos hinos de lamentação.

A Septuaginta é bastante explícita em sua posição quanto à autoria do livro. Essa versão grega do livro apresenta uma nota introdutória (evidentemente baseada em um original hebraico) que claramente atribui o livro a Jeremias. Essa nota diz o seguinte: “Depois que Israel foi levado cativo e Jerusalém foi destruída, Jeremias chorou e se lamentou com esta lamentação a respeito de Jerusalém, e disse”. Em seguida vem o primeiro versículo do texto hebraico. A Vulgata apresenta essa nota introdutória com uma pequena variante; o texto em árabe o reproduz com exatidão, e o Targum (paráfrase) de Jônatas, a substitui com esta linha: “Jeremias, o profeta e sumo sacerdote disse”. Essas autoridades são seguidas pelo Talmude e pelos Pais da Igreja, dando a entender que Jeremias era o autor de Lamentações. Por séculos a autoria de Jeremias nunca foi questionada.

Hoje, no entanto, muitos estudiosos renomados rejeitam a autoria de Jeremias. Eles o fazem com base na estrutura, estilo e atitude em relação à destruição de Jerusalém admitida pelo autor. Eles alegam que a forma acróstica bastante precisa, a presença de muitos termos novos e de frases que não são encontradas na profecia de Jeremias, a atitude desnorteada do escritor em relação à destruição de Jerusalém, são discrepantes com o pensamento de Jeremias. Esses estudiosos apresentam um número impressionante de diferenças com a profecia, e estão bastante seguros de que esses poemas não vêm da pena de Jeremias.

III - PROPOSITO E USO

Esses poemas são canções tristes escritas com a expectativa de que seriam recitadas pela congregação de Israel para expressar seu grande pesar acerca da perda de sua identidade nacional. Eles consideram todos os grandes assuntos da aflição pública, O propósito deles é expressar, de forma terapêutica, as emoções mais profundas de um povo quebrantado e devastado. Os poemas permitem ao povo confessar que Deus o havia tratado com justiça, e, ao fazê-lo, encontrariam forças para suportar o peso indescritível da angústia sem desesperar-se. Eles tinham a intenção de ajudar o povo a aprender uma lição do passado e, ao mesmo tempo, conservar sua fé em Deus mesmo quando confrontados com uma desgraça avassaladora. Abrindo as portas para a oração, esses poemas apontavam o caminho para o arrependimento e fé e, deste modo, estimulavam esperança na misericórdia de Deus.

IV - CANÇÃO DE UMA CIDADE EM LUTO = Lamentações 1.1-2

A SITUAÇÃO DA CIDADE, 1.1-7

Essa canção de profunda tristeza inicia com uma descrição da cidade cativa de Jerusalém personificada por meio de uma mulher que perdeu seu marido e filhos. O infeliz estado da sua viuvez é pranteado. “Como!” foi a única maneira apropriada de iniciar essa canção fúnebre. Essa era a forma mais apropriada para expressar tristeza e dor para aquela ocasião. Aqui essa canção prepara o caminho para a revelação da situação trágica da cidade. A solidão da viuvez é ressaltada: Como se acha solitária aquela cidade (1). Ela tinha sido tão populosa e tão grande entre as nações; mas agora ela está vazia, e seus filhos estão no cativeiro. Os seus amantes (2; aliados políticos), depois de a humilharem, a desprezaram como um brinquedo sujo e sem valor. Traída e aflita, ela chora de noite, sem encontrar descanso (3), e não há quem a console. A expressão nas suas angústias também pode ser traduzida como: “no meio das suas dificuldades” (Smith-Goodspeed).

Além de tudo isso ela vive em um estado de viuvez espiritual. A vida religiosa da cidade havia cessado. O Templo havia sido destruído. Os caminhos (estradas) para Sião estão vazios; não há adoradores que compareçam para sua reunião solene; suas portas estão desoladas; e os sacerdotes gemem (4). Há a amargura do remorso, porque o dia da graça passou. Para piorar a situação, seu julgamento vem da mão divina. O SENHOR a entristeceu (5).

Mas em tudo isso o profeta reconhece a justiça divina; a tristeza de Jerusalém é por causa da multidão das suas prevaricações. Foi-se toda a sua glória (6); seus adversários estão no controle; suas famílias estão no exílio. Os seus príncipes estão tão destituídos de força que parecem corças sem pasto; enfraquecidos pela fome eles caminham diante dos seus perseguidores; caem para não mais levantarem. Nessa condição debilitada e solitária, surgem lembranças assombrosas que só aumentam a tristeza da cidade. Jerusalém se lembra das suas mais queridas coisas, que pertenciam a ela nos tempos antigos (7). Isso é motivo de clamor e pranto. Mas não há alívio do seu sofrimento, porque os seus adversários zombam da sua miséria.

V - A PERVERSIDADE DA CIDADE, 1.8-11

A causa do sofrimento de Jerusalém está no fato de ela ter pecado gravemente (8). Seu pecado não foi uma coisa superficial. A palavra instável significa “impura” (NVI). A sua imundícia está nas suas saias (9), indicando que seu pecado era uma perversidade íntima, i.e., uma disposição interior. Jerusalém era tão impura moralmente quanto uma mulher era impura durante seu período de menstruação.

Por isso, o problema básico de Jerusalém era o seu coração perverso (Jr 17.9).

Todos os que a honravam E...] viram a sua nudez (8) significa que sua verdadeira natureza havia sido revelada; profanada e impura, ela se afasta envergonhada. Ela foi pasmosamente abatida (9), i.e., “ela caiu de modo espantoso” (ARA) porque seguiu as inclinações de um coração perverso. Ela fracassou em considerar as conseqüências de uma vida perversa. Ela nunca se lembrou do seu fim; ela viveu somente para o presente.

O versículo 10 refere-se, em primeiro lugar, à profanação do Templo. Suas coisas mais preciosas eram os “utensílios para as ofertas sacrificais” (Berkeley, nota de rodapé). Mas há uma implicação mais profunda. O inimigo havia entrado no seu santuário (10) e tinha tomado suas coisas mais preciosas, i.e., roubou a sua pureza; e agora o seu povo (11) geme debaixo da gravidade do seu pecado. Ela reconhece que se tornou desprezível. A tristeza da viuvez é aumentada pela compreensão da sua impureza. O significado literal do versículo ii é deixado claro por Smith-Goodspeed: “Eles trocaram tesouros por mantimento para mantê-los vivos”.

VI - O CLAMOR DA CIDADE, 1.12-19

O fardo acumulado da sua condição trágica tornou-se pesado demais para carregar. Judá clama em sua angústia. Não vos comove isso, a todos vós que passais pelo caminho? (12). Embora o hebraico seja dificil, a ARC captou o sentido. Dirigindo-se a todos que possam ouvir seu clamor, ela implora por compaixão, insistindo que não há dor como a minha dor. Ela confessa que seu castigo vem do SENHOR, e enumera todas as coisas que sofreu pelas mãos dele. Deus enviou fogo (13) aos seus ossos. O qual se assenhoreou deles provavelmente significa: “o qual os subjugou” (Berkeley). Uma rede foi armada para os seus pés; suas prevaricações foram entretecidas em um jugo intolerável ao redor do seu pescoço (14). Seus valentes (15), bem como os seus jovens, foram jogados no lagar da ira de Deus.

A contemplação das suas muitas angústias traz um novo irromper de lágrimas: Por essas coisas E...] os meus olhos se desfazem em águas (16). Mas não há consolador para amenizar sua dor, e o inimigo prevaleceu contra ela. Mesmo que ela esteja sufocada com lágrimas a ponto de não poder falar, ela parece ouvir uma voz a dizer que embora Sião (17) estenda as suas mãos em súplica compadecida, Deus mandou que ela fosse afligida. Depois de recompor-se, Sião reconhece que Deus agiu de maneira justa com ela. Ela confessa que se rebelou contra os seus mandamentos (18). Não há ressentimento em suas palavras, e nenhuma inclinação para defender-se. Ela então reconhece: Meus amadores (nações aliadas e deuses a quem Judá se havia voltado) E...] me enganaram. Por causa disso, seus filhos estão no cativeiro; seus sacerdotes e E...] anciãos expiraram. A tristeza da sua condição a esmaga enquanto faz um apelo final: Ouvi, pois, todos os povos e vede a minha dor (18-19).

VII - A ORAÇÃO DA CIDADE, 1.20-22

Traída, quebrantada e castigada, Sião agora eleva sua voz em oração: Olha, SENHOR, quanto estou angustiada E...] porque gravemente me rebelei (20); não tenho quem me console (21). Nesse ensaio da sua situação desagradável estão todos os elementos de um coração arrependido: tristeza profunda, confissão, humilhação e fé. O povo de Judá se volta para o Senhor porque está convencido de que somente Ele pode ajudar. Não há esforço para desculpar seus pecados, e ele aceita seu castigo como sendo justo. No entanto, Judá expressa a certeza de que de alguma forma Deus o vindicará diante dos seus inimigos: mas, em trazendo tu o dia que apregoaste, eles (os inimigos) serão como eu (21). Aqui está a convicção de que em um universo moralmente ordenado nenhum transgressor ficará impune. Venha toda a sua iniqüidade à tua presença (22) é um reconhecimento de que todo o mal será castigado. Seus inimigos também experimentarão o castigo pelo seu pecado. Um Deus soberano fará com que todas as coisas aconteçam da forma correta.

VIII - CANÇÃO DE UM POVO QUEBRANTADO == Lamentações 2.1-22

Esse poema continua o tema geral do capítulo 1, uma lamentação pela cidade de Jerusalém. No entanto, esse capítulo parece ampliar seu escopo para incluir o povo de Israel em geral e Judá em particular. Como poema acróstico ele é quase idêntico em estilo ao capítulo 1, com a exceção de que a décima sexta e a décima sétima letra do alfabeto hebraico estão invertidas. Apesar disso, não há uma interrupção do pensamento. Esse fenômeno ocorre novamente nos capítulos 3 e 4. O capítulo 2 continua a suposição teológica de que o castigo do povo é resultado direto da sua desobediência a Deus, e que seu castigo é plenamente merecido.

8.1 - O ADVERSÁRIO DO POVO, 2.1-10

A terrível realidade da aflição de Sião é revelada. O relato detalhado indica que o autor foi testemunha ocular da catástrofe que ele descreve. A coisa surpreendente acerca do poema é que o Senhor é visto como o Antagonista ou Adversário de Judá. O autor descreve o que significa ter Deus como seu Inimigo. Isso ilustra a declaração do Novo Testamento: “Horrenda coisa é cair nas mãos do Deus vivo” (Hb 10.31). Isso é ainda mais espantoso quando esse aspecto é comparado com o amor contínuo de Deus pelo seu povo.

Mas a admissão de que o nosso castigo vem da mão de Deus pode ser muito salutar quanto ao seu efeito. Ele pode marcar o início do arrependimento. A ira do Senhor é uma coisa muito real e impressionante. No dia da sua ira (1) ocorreram inúmeros incidentes incomuns no meio do seu povo. Nuvens indicam uma calamidade de proporções gigantescas. Deus derribou [...] a glória de Israel (o Templo), e não se lembrou do escabelo de seus pés (propiciatório). Ele derribou L..] as fortalezas [...J de Judá e desonrou o reino e os seus príncipes (2). Ele cortou [...] a força de Israel (3) ao retirar sua destra para defendê-los. Ao mesmo tempo destruiu o que era formoso à vista (o Templo) e devorou todos os seus palácios (5). Ele multiplicou o pranto e a lamentação da filha de Judá.

As ações de Deus são vistas como um indicação da sua justiça. Ele não aprova o pecado em nenhum lugar; Ele arrancou a sua cabana (barraca) com violência, e acabou com o escárnio que ocorria nas festas fixas e nos sábados em Judá (6). A expressão: como se fosse a de uma horta parece uma figura do poder de Deus e da insegurança humana; Deus destruiu o Templo de pedra como se fosse uma barraca temporária de um jardineiro feita de galhos e folhas. Mesmo o rei e o sacerdote experimentaram a vara da ira divina. Ele rejeitou o seu altar (7) e detestou o seu santuário, indicando que é necessário mais do que um ritual exterior para impedir o julgamento de um Deus santo. O grito do inimigo foi ouvido no lugar santo como em um dia de reunião solene. O rosto de Deus estava voltado contra Sião, de tal forma que fez planos para destruí-la e demarcou seus propósitos com um cordel (8). Antemuro e muro significavam toda a defesa da cidade. Conseqüentemente, as portas da cidade caíram por terra (9), seus ferrolhos (defesas) estão quebrados, o seu rei e os seus príncipes estão no exílio, os seus profetas estão sem visão, e a sua lei é suspensa. Os anciãos (10) se vestem com panos de saco, e lançam pó sobre a sua cabeça, e as virgens abaixam a sua cabeça envergonhadas.

8.2 - A AGONIA DO POVO, 2.11-16

Enquanto o profeta apresenta a destruição fisica da cidade e da nação, a maré da emoção tem se elevado em sua alma. Quando se volta para contemplar a condição dos indivíduos envolvidos, não consegue refrear sua tristeza. Ele irrompe em um lamento pessoal em relação àquilo que acabou de ver com seus próprios olhos (11). Essas palavras refletem o espírito compassivo do profeta (Jr 9.1; 14.17). Ele clama em voz alta em seu imenso sofrimento: Meus olhos [..i minha alma [...] meu coração. A ACF traz: “Meus olhos [...] minhas entranhas [...] meu fígado”. Todas essas são expressões orientais de extrema angústia. Ele então relata o que seus olhos viram em relação ao sofrimento do seu povo. Com a cidade sendo destruída à sua volta, o compassivo profeta vê meninos e crianças de peito desfalecendo de fome e doença. Pode-se ouvir seu clamor comovente, suplicando por comida às suas mães (12); e momentos depois derramam sua alma, i.e., expiram nos braços de suas mães.

No meio da sua aflição, o poeta tenta pensar em alguma catástrofe semelhante com a qual possa comparar a situação atual do povo. Ele esperava trazer consolo à nação sofredora (13), mas, infelizmente, não encontra nada que sirva de comparação com essa grande tristeza. Ela é incomensurável como o mar.

Jeremias então coloca seu dedo na verdadeira causa do problema; a catástrofe tem uma base moral. Essa ruína esmagadora tem sua origem nas visões e oráculos enganosos dos falsos profetas (14). Eles não foram fiéis em expor a maldade do povo: “Seus profetas viram para ti vaidade e falsidade” (14, lit.). Sua falta de sinceridade em proclamar a verdade de Deus resultou em expulsão e exílio. Jeremias chegou à raiz do problema; a “morte” de uma nação ou de uma igreja sempre começa pelos seus líderes. Os profetas (cf. Jr 14.14-16; 23.9-40) são responsabilizados por toda a situação trágica, embora o povo não seja desculpado por sua disposição em se deixar desviar.

O poeta agora retrata o escárnio incontido que o povo de Judá e Jerusalém atura de todos os que passam (15). Mesmo os viajantes que não guardam nenhum ódio de Jerusalém expressam surpresa e desprezo pela cidade outrora orgulhosa. Eles meneiam a cabeça e batem palmas, dizendo: E esta a cidade que denominavam perfeita em formosura? Os inimigos dos judeus, por outro lado, não mostram nenhum tipo de constrangimento. Eles assobiam e rangem os dentes em um prazer cruel, gritando: Certamente este é o dia que esperávamos (16).

8.3 - A RESPOSTA DO POVO, 2.17-22

Em busca de uma solução, o profeta começa a exortar o povo. Ele leva o povo a

lembrar que existe um governo moral operando no universo. Desde os dias da antiguidade (17) o Senhor havia feito uma aliança com seu povo no Sinai. Naquele tempo Ele deu os mandamentos para o bem-estar da nação. Esses mandamentos continham tanto bênçãos quanto maldições. Ao longo dos séculos, Deus tem cumprido a sua palavra em todos os detalhes. Seu castigo agora era devido à falha deles em guardar seus mandamentos. Ele não poupou ou teve pena do povo, para que Israel soubesse que as leis de Deus operam inexoravelmente na vida dos homens.

Mas visto que Deus é santo, Ele pune o pecado com grande severidade, mas também perdoa a todo aquele que se arrepende com um coração quebrantado e contrito. O Deus que aflige também cura. O profeta insiste em que a resposta para a situação deles é encontrada na oração sincera e determinada. Nos versículos 18-19, ele apresenta o tipo de oração que eles devem fazer em seus corações e com seus lábios. Na KJV não fica claro quem está se dirigindo a quem. Mais provável é que Jeremias esteja se dirigindo ao povo de Jerusalém.

Num estilo oriental, que parece estranho à mente ocidental, o profeta se dirige ao muro destruído de Jerusalém como se ele representasse a cidade e seus habitantes. Eles são conclamados a clamar de dia e de noite (18) em súplica a Deus, para derramar lágrimas como um ribeiro, não se permitindo descanso algum. Sua exortação é reforçada no versículo 19, em que os constrange a orar a noite toda e levantar as mãos em sua direção. Os judeus dividem a noite em três vigílias. A implicação é que o Deus que ouviu o clamor dos filhos de Israel no Egito (Ex 3.7) e ao longo da sua história, vai ouvi-los agora.

No versículo 20, o povo começa a suplicar ao Senhor. Eles oram: Vê, ó SENHOR, e considera a quem fizeste assim! Então segue uma oração de lamentação na qual eles enumeram todas as coisas trágicas que ocorreram: Hão de as mulheres comer E...] as crianças que trazem nos braços? Ou matar-se-á no santuário do Senhor o sacerdote? Jazem E...] pelas ruas o moço e o velho (21). E uma triste narrativa de angústia e dor. Há, no entanto, nessa narrativa um pedido inferido (prontamente entendido pela mente primitiva) para que haja misericórdia e livramento. Eles acreditavam que Deus não podia ficar indiferente com a enumeração de todas essas afrontas contra os instintos naturais (20b), a santidade religiosa (20c) e a vida humana (2 1-22). E a fé deles em Deus estava correta. Ele nunca é indiferente com aqueles que são verdadeiramente penitentes. Dessa forma, o capítulo termina com uma velada expressão de esperança.

IX - CANÇAO DE UM PROFETA SOFREDOR == Lamentações 3.1-66

Esse poema se encaixaria perfeitamente no capítulo 20 da profecia de Jeremias, ou, melhor ainda, se seguisse o episódio da cisterna do capítulo 38. Esse capítulo tem, na verdade, a mesma extensão dos capítulos 1 e 2, mas a construção é diferente.

Nesse capítulo, os versículos têm somente um terço do tamanho dos versículos dos outros dois capítulos, mas há três vezes mais versículos. Em vez de somente a primeira linha de cada estrofe começar com uma letra subseqüente do alfabeto hebraico, como nos capítulos 1 e 2, todas as três linhas de cada estrofe começam com a mesma letra. Assim, as linhas 1, 2 e 3 começam com Alefe, e as linhas 4, 5 e 6 começam com a letra Bete, etc. Diferentemente dos dois primeiros capítulos, cada linha é considerada um versículo, dessa forma, totalizando 66 versículos em vez dos habituais 22.

O poema é escrito do ponto de vista de um indivíduo, e todos os versículos estão na primeira pessoa do singular (“eu”, “a mim”, “meu”), exceto os versículos 40-47. Esse uso da primeira pessoa não impede o poema de ser usado como um lamento público, visto que o autor se identifica com a comunidade em sua aflição. A dificuldade deles é a dificuldade do profeta, e a tristeza deles é a sua tristeza. “Ele está organicamente associado com eles e procura levá-los a uma mesma apreensão religiosa da aflição deles, para que possam compartilhar a sua fé”.’

9.1 - UM GRITO DE DESESPERO, 3.148

O poeta identifica-se como um indivíduo que experimentou em sua própria vida todo o sofrimento que a nação tinha experimentado: Eu sou o homem que viu a aflição (1). Evidentemente ele se julga um exemplo simbólico da nação. Como seu representante diante de Deus, ele tem levado as tristezas e o sofrimento deles. Ele tem sentido a vara do furor divino repetidas vezes. Em sua dor, lamenta que Deus transformou sua luz em trevas (2), semelhantemente às trevas dos que estavam mortos (6; no Sheol). Deus se voltou contra ele e o castiga de contínuo (3). A doença tem enfraquecido o seu corpo a ponto de estar prematuramente velho (4). Fel e trabalho (5; amargura e pesar) fazem parte da sua vida. Não há deleite na vida, e ele precisa lutar para sobreviver.

Circunvalou-me (7), i.e., Deus o colocou dentro de uma cerca e ele perdeu sua liberdade. Ele reclama por precisar carregar os pesados grilhões de um prisioneiro. Embora clame na sua angústia, não há resposta para o seu grito: ele exclui a minha oração (8). Pedras lavradas (firmemente fixadas) bloqueiam o seu caminho e o fazem andar por veredas tortuosas (9). Em qualquer direção que procura ir, encontra dificuldades. Suas frustrações são quase insuportáveis. Como se isso já não fosse o suficiente, Deus assiduamente se volta contra ele. Como o urso ou o leão (10), Deus o espera em uma emboscada. Ele o persegue implacavelmente com seu arco e flecha (12), a ponto dos seus rins (“coração”, N’VI) estarem cheios de flechas da vingança de Deus (13).

Fui feito um objeto de escárnio (14), i.e., seu próprio povo zombava dele nas suas canções todo o dia. Ele não encontra descanso para mente ou corpo; seu coração fartou-se de amargura, e ele está embriagado pelo absinto (15; cf. Jr 23.25). Deus quebrou seus dentes com pedrinhas (16), i.e., deu a ele pedras em vez de pão. Cobriu-me de cinza significa que ele não passou por alguma dificuldade momentânea, mas, sim, pelas profundezas da desgraça e humilhação. A paz (17) foi tirada do profeta há muito tempo, e ele “esqueceu-se do que é ser feliz” (RSV). Jeremias está nas profundezas do desespero. Ele clama: Já pereceu a minha força, como também a minha esperança (18). Bloqueado em cada movimento, quebrantado física e emocionalmente, dilacerado com inúmeras aflições, e sofrendo as dores dos condenados, a força se foi e a esperança o abandonou. Mas o limite do homem é a oportunidade de Deus. E precisamente nesse ponto que sua fé encontra uma base sólida.

9.2 - UMA CONFISSÃO DE FÉ, 3.19-39

O profeta externou sua queixa diante do Senhor. Sua força se foi, seu coração está quebrado. Ele está exausto e desamparado. Toda tensão e conflito saíram dele. Ele consegue desligar-se dos problemas. Humilde e quieto, ele espera diante de Deus. Na quietude vem a mudança. Ele começa a orar suavemente: “Lembra-te da minha aflição [...] Minha alma [...j se abate (se curva) dentro de mim (19-20). Discernimento e compreensão começam a tomar conta dele: Disso me recordarei (21) — ele começa a lembrar muitas coisas que havia esquecido durante sua aflição. Deus não despreza alguém com um coração quebrantado e contrito (SL 51.17)!

Certamente aqui está “Uma Mensagem de Fé e Esperança”.

1) As misericórdias de Deus nunca cessarão; suas misericórdias não têm fim

(22). Mesmo quando falhamos, Ele permanece fiel! Além do mais, suas misericórdias se renovam a cada manhã (23). A continuidade da misericórdia de Deus é uma prova da sua fidelidade, por isso o profeta clama: Grande é a tua fidelidade. Esses pensamentos provocam uma resposta sincera, e o profeta continua: A minha porção é o SENHOR (i.e., a soma total dos meus desejos); portanto, esperarei nele (24). Enquanto o profeta confessa sua fé em Deus, outras coisas tomam conta da sua mente.

2) O caminho de Deus é o melhor caminho,

a) Ele é favorável para a alma (25) que busca a sua orientação.

b) Paciência e esperança (26) abrem os canais da salvação,

c) Disciplina na mocidade (27) tornam a idade adulta segura e bem-sucedida.

3) Bem-aventurado é o homem que suporta a tentação.

a) Esse homem entregou-se completamente a Deus.

b) Ele “pôs a boca no pó”, em humilhação (29).

c) Ele entregou os seus direitos e, semelhantemente a Jesus, ofereceu a sua face (30) aos que o queriam ferir (Is 50.6; Mt 5.39); e quando foi afrontado e injuriado, ele não injuriou (1 Co 4.12; 1 Pe 2.23).

4) O sofrimento tem um propósito moral.

a) Deus testa seu povo, mas sua rejeição não é permanente. Ele não o rejeitará para sempre (31).

b) Embora permita que venha o sofrimento, Ele ama demais a humanidade para abandoná-la ou permitir que seja provada além das suas forças (32). e) Ele não tem prazer nas aflições dos homens (33), mas permite que essas aflições ocorram para que algo melhor possa acontecer ao sofredor.

5) Podemos estar plenamente certos de que Deus vê e desaprova todo mal.

a) Ele é contra todo abuso e injustiça feita contra os desamparados (34).

b) Qualquer perversão da justiça, quer por motivos religiosos ou políticos, contará com seu desagrado e castigo (35-36).

6) Lamentar sem razão das aflições é errado. Nada é feito sem a permissão de Deus.

Ele permite que exista tanto o bem como o mal (38) nesse mundo. Como agente livre, o homem não precisa escolher o mal com sua punição resultante (39). Portanto, ele não deveria queixar-se acerca dos sofrimentos resultantes do seu pecado, mas deveria queixar-se dos seus pecados, que causam seu sofrimento.

9.3 - UM APELO AO ARREPENDIMENTO, 3.40-47

Visto que a transgressão e rebelião da parte do povo redundaram em sofrimento e castigo, o profeta faz um apelo para que esquadrinhem (examinem) e provem seus caminhos (40; conduta). Ele insiste em que o mínimo que poderiam fazer seria analisar a situação deles de maneira honesta. Em vez de culpar a Deus pelo sofrimento, deveriam averiguar o significado e propósito da dificuldade que veio sobre eles. O objetivo de tudo isso deveria servir para ajustar as contas entre eles e Deus, i.e., para voltarem-se novamente para o SENHOR. No hebraico, voltar ou “retornar” (shub) significa “arrepender-se”.

Visto que a oração é a maneira mais apropriada de aproximar-se de Deus, Jeremias os admoesta a iniciar seu exame com um pedido sincero. Eles deveriam levantar o coração juntamente com as mãos para Deus (41). A ênfase no coração indica que a verdadeira submissão deve ser acompanhada de atos exteriores de súplica, para que a oração seja genuína. No passado, eles haviam orado, mas seus corações não acompanharam suas mãos nesse exercício. Nos versículos 42-47, o profeta fala as palavras que o povo precisa dizer. Aqui encontramos uma lamentação acerca do que a rebelião contra Deus acarretou para o povo. Deve haver confissão de pecado: Nós prevaricamos e fomos rebeldes (42), e sua confissão deve ser acompanhada pela lamentação (pranto, pesar genuíno).

Nesses versículos vemos “Os Resultados de Rejeitar a Deus”.

1) A rebelião corta as misericórdias de Deus; tu não perdoaste (42). De acordo com a sua natureza, Deus não podia perdoar até que ocorresse um arrependimento genuíno.

2) A rebelião produz um castigo imediato e implacável: Mataste, não perdoaste

(43). O pecado é um terrível bumerangue.

3) A rebelião separa de Deus; uma nuvem fica entre o homem e Deus por causa da

transgressão, de tal forma que a nossa oração não chega a Deus (44). Somente quando o povo se afasta da rebelião é que Deus poderá ouvir a oração (Sl 66.18).

4) A rebelião traz humilhação e pesar: “Tu nos tornaste escória e refugo entre as

nações” (45, NVI).

5) A rebelião traz terror e confusão: Temor e cova vieram sobre nós (46-47). “O caminho dos transgressores é dificil” e o profeta roga para o povo produzir “frutos dignos de arrependimento” (Mt 3.8).

Os versículos 40-47 tratam do seguinte tema: “O que Fazer quando Vem a Condenação”.

1) Admitir que estamos debaixo da condenação de Deus (42-47);

2) Examinar nossa vida de maneira honesta (40a);

3) Voltar-nos ao Senhor (40b);

4) Ser completamente sinceros em nossa oração (41) — A. F. Harper.

9.4 - A DOR DA INTERCESSÃO, 3.48-54

Quando o profeta considera o que o pecado e a rebelião fizeram com seu povo, ele irrompe em uma oração de intercessão: Torrentes de água derramaram os meus olhos, por causa (em favor) [...] do meu povo (48). O tempo passa, mas ele não para de orar. Ele está determinado a continuar sua intercessão até que o SENHOR atente e veja desde os céus (50). Embora sua intercessão drene suas forças físicas, ele continua orando: “O meu olho (seu choro é o labutar da alma) lida severamente com a minha vida” (51, lit.).

Em agonia de alma Jeremias enfrenta a morte física. Nesse momento, sua mente parece voltar-se à sua experiência na cisterna antes da queda de Jerusalém (Jr 38.6-13). O versículo 52 parece dizer que ele enfrentou a morte de uma forma semelhante naquela oportunidade. Sem motivo, seus inimigos o haviam caçado. Eles planejavam arrancar (53) a sua vida, ao lançá-lo na cova, e a cobriram com uma pedra. Ele afundou-se na lama, e as águas da morte (falando figurativamente) correram sobre sua cabeça. Em desespero ele gritou: Estou cortado (54), i.e., “a morte chegou”. Essas palavras certamente foram escritas no estilo de Jeremias, cuja vida foi um martírio prolongado. Elas foram colocadas aqui para que a oração do profeta possa se tornar uma oração de intercessão nos lábios do povo.

A passagem mostra “A Verdadeira Oração de Intercessão”.

1) Quando intercedemos por uma pessoa é como se o pecado e a culpa dela fossem nossos.

2) A intercessão envolve um sentido de desespero (48-5 1) semelhante à da rainha Ester: “Perecendo, pereço” (Et 4.16).

3) Não pode haver intercessão sem sofrimento e humilhação.

4) A intercessão pode, na verdade, significar a morte do intercessor — pelo menos ele deve estar disposto a dar sua vida (Ex 32.32)

9.5 - UMA CANÇÃO DE CONFIANÇA, 3.55-66

Quando o profeta olha para trás e lembra da sua experiência da cisterna e a compara com o momento presente, sua fé começa a crescer. Ele logo irrompe em uma canção de confiança e esperança: Invoquei o teu nome, SENHOR E... Ouviste a minha voz (55- 56). Ele continua a cantar: Tu te aproximaste e disseste: Não temas (57). Ele agora traz todos os seus problemas, passados e presentes, diante do Senhor e clama:

Pleiteaste [...] remiste a minha vida (58). Viste (59-60). Ouviste (61). Tu [...] darás a recompensa (64). O hebraico da última parte do versículo 56 não é claro. Pode significar o seguinte: “Não feches os teus ouvidos aos meus suspiros e gritos” (Berkeley). Eu sou a sua canção (63) significa: “Eu sou o tema das suas canções de escárnio” (Berkeley).

Essa passagem expressa a confiança do poeta de que Deus vindicará seu povo, e, no tempo oportuno, sua justiça prevalecerá. Por isso, ele se regozija pela presença do Governante moral no universo que julgará a causa do pobre e necessitado. Ele olha adiante para o dia em que o povo de Deus será vingado dos seus inimigos:

Perseguirás, e eles serão desfeitos debaixo dos céus do SENHOR (66). Naquele dia, o direito prevalecerá sobre todo o mundo, e “a terra se encherá do conhecimento do SENHOR, como as águas cobrem o mar” (Is 11.9).

O tom refletido nos versículos 64-66 tem sido chamado de elemento “imprecatório” no Antigo Testamento. Esse aspecto é, às vezes, dificil de entender. As maldições que são invocadas sobre os inimigos parecem anticristãs e muito abaixo do padrão apregoado por Jesus em Mateus 5.43-48.

No entanto, não podemos nos esquecer que é difícil distinguir entre as formas hebraicas: “Que isso aconteça” e “Isso acontecerá”. Podemos estar certos de que pelo menos algumas das maldições são simples predições do que acontecerá como resultado da rebelião contra Deus (cf. CBB, Vol. III, “O Livro de Salmos”, Int.).

X - CANÇÃO DE UM REINO DEVASTADO = = Lamentações 4.1-22

Esse poema é uma canção de contrastes. Ele compara a glória antiga do reino de Judá, representada por Jerusalém, com sua infeliz condição atual. Jeremias foi uma testemunha ocular do terrível desastre em 587-586 a.C., quando Jerusalém caiu diante dos babilânios. Podemos sentir o palpitar de tristeza que preponderou durante o cerco e a subseqüente demolição da cidade. O poema é um acróstico alfabético como nos capítulos 1 e 2, com a exceção de que as estrofes aqui têm duas linhas em vez de três. O pecado de Judá é o tema predominante do capítulo. Essa idéia não está completamente ausente nos capítulos anteriores, mas nesse capítulo 4 ela aparece como o motivo principal para o colapso do reino. A extensão do pecado de Judá é tratada nos versículos 1-12, e as conseqüências do seu pecado são o tema dos versículos 13-22. Assim, os motivos morais do destino de Judá ocupam a mente do poeta.

10.1 - O PODER DEGRADANTE DO PECADO, 4.1-12

A gravidade do pecado de Judá e Jerusalém tem sua raiz na rebeldia do coração. A descrição aqui revela até que ponto uma nação pode chegar quando seus fundamentos morais são removidos. O gemido do profeta, ao lamentar acerca da glória passada de Judá e a condição devastadora na qual se encontra agora, é suficiente para quebrar o coração. “Como os poderosos caíram!”. O poeta entoa uma canção triste acerca da incrível mudança que sobreveio a essa outrora orgulhosa nação e sua capital: Como se escureceu o ouro! (1). Escurecida e deslustrada, a cidade dourada não passa de um monte de cinzas. Ele lamenta a completa destruição do Templo: Como estão espalhadas as pedras do santuário ao canto de todas as ruas; i.e., espalhadas por toda a cidade. Os jovens da nação, a esperança da sua vida futura, estão estirados pelas ruas da cidade. Em vida eles eram comparados a ouro (2); agora eles não passam de um amontoado de barro, semelhante a vasos de barro quebrados no monte de refugo do oleiro!

As mães de Judá, perturbadas pelo sofrimento, tratam seus bebês pior do que o fazem os animais selvagens. Apesar do fato de os chacais (3) serem animais de rapina violentos, eles não se esquecem dos seus filhotes. Enquanto as avestruzes são conhecidas por serem negligentes e cruéis com seus filhotes (Jó 39.13-17), as mães de Judá são ainda piores; elas se tornaram cruéis (desumanas). Com a morte do seu instinto materno, elas deixam seus bebês morrerem por falta de alimento. Os meninos clamam por pão (4), mas ninguém lhes dá atenção.

Mulheres que se vestiam em carmesim (púrpura) e comiam iguanas delicadas agora perambulam sem destino pelas ruas. Elas chegaram a um ponto degradante: abraçam esterco (5) em busca de comida.

Jerusalém teve um destino ainda mais triste do que Sodoma. Sodoma se subverteu [...] em um momento (6) pela mão de Deus, mas o castigo de Jerusalém tornou-se quase insuportável. A referência a Sodoma ressalta a dimensão da culpa de Jerusalém. Ela era a cidade que tinha o Templo, a lei e os profetas. Visto que teve tanta luz e privilégio, ela mereceu um castigo mais severo do que Sodoma. Deve ter sido difícil para um poeta judeu escrever o versículo 6. Esse versículo retrata de uma forma inesquecível a compreensão de Jeremias do poder degradante do pecado.

“Seus príncipes” — em vez de nazireus (7) — outrora belos em aparência, bem nutridos e populares no meio do povo, estão agora em uma condição deplorável. Seus rostos estão “mais escuros do que a escuridão” (8, lit.); seus nomes estão esquecidos; o povo não os reconhece, porque não passam de esqueletos ambulantes, mirrados e sem vida como um pedaço de pau. A condição de Judá e Jerusalém é tão deplorável que os mortos à espada (9) são mais ditosos do que os vivos. O cerco à cidade havia privado os viventes das necessidades mais básicas da vida. Algumas mulheres piedosas (10), impelidas pela fome, cozeram seus próprios filhos, para servirem de alimento. Ninguém imaginaria que Jerusalém pudesse chegar a esse ponto! Mesmo os reis da terra (12) estão estupefatos com o destino dessa nação e dessa cidade. O pecado, depois de consumado, gera a morte (Tg 1.15).

Nos versículos 1-12, vemos “Os Efeitos Degradantes do Pecado”.

1) A beleza da vida desaparece (1).

2) Os recursos da mocidade são perdidos (2).

3) A dignidade da mulher se torna pior do que a dos animais do campo (4-5, 10).

4) Os efeitos do pecado são mais amplos onde a luz foi mais brilhante (6);

5) Até os líderes se tornam confusos e quebrados (7);

6) O castigo final é pavorosamente radical (11-12).

10.2 - O PODER DESMORALIZANTE DO PECADO, 4.13-16

A responsabilidade pela ruína de Judá é atribuída diretamente aos líderes religiosos da nação. Foi por causa do pecado dos seus profetas e das maldades dos seus sacerdotes (13, RSV). É na vida desses homens que vemos o poder desmoralizante do pecado. Eles poderiam ter evitado a destruição do país. Em vez disso:

1) Seu ensinamento e seu exemplo mutilaram a vida moral da nação.

a) Eles não eram aptos para discernir entre a voz de Deus e a voz dos seus próprios corações.

b) Eles profetizaram falsamente, dizendo: “Paz, paz, quando não há paz” (Jr 6.14).

c) Eles sucumbiram à pressão dos tempos e pregavam o que o povo queria ouvir; eles não expuseram os pecados do povo, para que pudessem ser sarados (2.14).

d) Eles estavam com medo de defender o que era certo; eles colocaram a popularidade acima da justiça.

e) Eles chegaram a crer na mentira como se fosse verdade, e na verdade como se fosse mentira. Jeremias já havia “trovejado”, em oportunidades anteriores, contra esses falsos líderes do povo (Jr 5.3 1; 6.13; 23.11-16), mas eles frustraram todos os seus esforços para levar o povo ao arrependimento genuíno.

2) Eles eram culpados de assassinato, talvez não diretamente, mas indiretamente. Debaixo da aparência externa da religião, derramaram o sangue dos justos no meio da nação (13). O conselho e a influência deles resultaram na morte dos justos (veja Jr 26.20-24).

3) Chegou o dia em que o mundo deles ruiu sobre suas cabeças. Quando a cidade de Jerusalém foi destruída, eles ficaram desnorteados. Eles erram (perambulam ou tateiam) como cegos nas ruas (14). Sua confusão era resultado da cegueira dos seus corações. Eles não estavam preparados para as emergências da vida.

4) O pecado deles se revelou. Suas máscaras foram tiradas quando suas predições provaram ser falsas. O povo então reconheceu quem eles realmente eram; impostores desprezíveis e miseráveis. O castigo deles era ser tratado como leprosos morais. Os homens gritavam para eles: Desviai-vos [...J Imundo! Desviai-vos [...] não toqueis (15).

5) Eles foram expulsos da sua terra pelo seu próprio povo. A maldição de Caim estava sobre eles. Eles andam errantes entre as nações (15), mas nem lá são desejados.

6) Eles sofreram a vingança divina. A ira do SENHOR os havia espalhado (16). Apesar do fato de serem sacerdotes e velhos (anciãos), nenhum favor foi concedido a eles, tanto por Deus como pelos homens. Como Governante moral do universo, Deus assumiu a responsabilidade de garantir que esses falsos líderes fossem punidos.

10.3 - O PODER ENGANADOR DO PECADO, 4.17-20

Essa seção é um reconhecimento de que a nação tinha colocado sua confiança no lugar errado. O poeta faz a confissão pelo povo. Jeremias olha para o passado — para a época do cerco da cidade (17-18), a queda da cidade (18), a fuga do rei e dos seus nobres (19), e a captura de Zedequias (20). O profeta declara que 1) a nação foi enganada em colocar sua confiança em aliados estrangeiros. Os nossos olhos desfaleciam, esperando vão socorro (17). Jeremias e outros profetas haviam advertido Judá para não colocar sua confiança em homens, mas a nação tinha rejeitado a palavra do Senhor e continuou a confiar no Egito. Faraó havia feito uma tentativa, em certa ocasião, de livrar Jerusalém (Jr 37), mas todo o episódio foi um completo e lamentável fracasso. O salmista também tinha clamado: “Vão é o socorro do homem” (SI 60.11), mas é impressionante o que atrai as pessoas quando elas estão em descompasso com Deus.

2) A nação tinha sido iludida ao acreditar que poderia resistir à Babilônia. Embora Jeremias tivesse proclamado repetidas vezes que Deus havia entregado o Oriente Médio nas mãos de Nabucodonosor (Jr 25), o povo de Judá não acreditou. Eles continuaram a rebelar-se até que a cidade caiu. Estão cumpridos os nossos dias, porque é vindo o nosso fim (18).

3) Eles foram ludibriados ao pensar que poderiam escapar se fugissem. Sobre os montes nos perseguiram (19). Isso evidentemente se refere à fuga de Zedequias e seus príncipes (Jr 39.4-7). Quando o povo começa a desobedecer a Deus, continua pensando que o próximo passo será o passo certo. Mas esse nunca é o caso.

4) A nação estava iludida ao pensar que as promessas de Deus à casa de Davi eram incondicionais. Eles interpretaram mal o caráter de Deus e seus métodos de operação. Agora lamentam: O respiro das nossas narinas, o ungido do SENHOR, foi preso nas suas covas (20). A referência aqui é à captura de Zedequias pelos babilônios na “floresta” do Jordão, e o fim da monarquia davídica. Os versículos revelam a lealdade do povo de Judá à casa real, mas também revelam que a confiança no homem como fonte de sabedoria e força máxima está equivocadamente fora de lugar.

10.4 - O PODER DESTRUIDOR DO PECADO, 4.21-22

Temos aqui um exemplo de como o pecado do orgulho pode destruir uma nação. Edom, embora descendente de Abraão e parente de Judá, sempre foi arrogante e altivo em relação a Israel. Seu orgulho alcançou proporções grandiosas na sua reação à queda de Jerusalém em 587-586 a.C. Ele tinha colaborado com o inimigo, traído seus vizinhos e retido sua ajuda aos necessitados. Aproveitando-se do infortúnio do seu parente, chegou a tomar uma parte do território de Judá (Ez 35.10-12). Agora Edom se alegra de maneira perversa com o castigo de Judá e com o seu próprio livramento dos horrores da guerra. Mas no auge da sua exultação ouve-se uma voz, anunciando sua condenação.

O início do versículo 21 é repleto de ironia: Regozija-te e alegra-te, ó filha de Edom — i.e., divirta-se agora — o cálice chegará também para ti. A referência é ao cálice do furor de Deus como profetizado por Jeremias (25.15-28).

Embebedar-te-ás: Edom experimentará todas as coisas que acompanham a embriaguez: vergonha, confusão, tristeza e destruição.

No versículo 22, o poeta confessa abertamente que Judá e Jerusalém foram castigados severamente pelas mãos do Senhor. Mas Judá sofreu seu castigo, e esse tempo acabou. O castigo da tua maldade está consumado. Dias melhores estão por vir para Judá. Ele nunca mais te levará para o cativeiro. A implicação é que Judá tem um futuro, mas Edom não. Quando chegar o dia do castigo de Edom, Ele descobrirá (revelará) os seus pecados. Edom cairá e nunca mais se levantará (Ob 18).

XI - SOBRE LAMENTAÇÕES DE JEREMIAS” =LAMENTAÇÕES Cap. 03 v. 25 ao 27

A palavra Lamentação vem do Hebraico e significa: Uma canção triste ou composição poética consagrada ao luto e à tristeza. Jeremias frisa a esperança de Jerusalém na misericórdia de Deus. Mediante muitas comparações, o profeta mostra que foi Deus quem trouxe o cativeiro e a desolação de Jerusalém em 586 aC. Na amargura da situação, o escritor pede a Deus que se lembre de sua aflição, e expressa fé na benevolência e nas misericórdias de Deus. Três versículos sucessivos usam no início a palavra “bom”, e mostram que é apropriado esperar a salvação da parte do Senhor. (Lm. 03 v. 25, 26 e 27) Deus causou o pesar, mas mostrará também misericórdia. Mas por ora, não obstante a confissão de rebeldia, Deus não perdoou; bloqueou as orações.

É bom para o homem suportar jugo na sua mocidade. Muitos dos jovens a quem Jeremias estava se referindo haviam sido levados como cativos para a Babilônia. É para aliviá-los que Jeremias escreve este versículo. Note que Jeremias não culpa os Babilônios. Ele diz que, em última instância, quem está trazendo este jugo sobre aqueles jovens é Deus mesmo. Este jugo é como aquele que é representado pelos mandamentos de Deus. É muito bom que aprendamos desde cedo que temos sérias obrigações para com Deus e não podemos pretender que Deus aceita qualquer coisa. Nunca é cedo demais para começarmos a nos moldar pelo molde de Deus. Sem o jugo que Deus nos impõe a grande maioria de nós seria como touros indomáveis que não se ajustam ao uso da canga e se tornam improdutivos.

PRECISAMOS VER: (Lm. 03 v. 01) = “Eu sou aquele homem que viu a aflição pela vara do seu furor.” / (Ap. 03 v.18) = “E que unjas os teus olhos com colírio, para que vejas.” Igreja de Laodicéia.

PRECISAMOS SER GUIADOS: (Lm. 03 v. 02) = “Ele me guiou e me fez andar em trevas e não na luz.” / (Sl. 73 v. 24 e 25) = “Guiar-me-ás com o teu conselho, e depois me receberás na glória. Quem tenho eu no céu senão a ti ? E na terra não há quem eu deseje além de ti.”

PRECISAMOS SER O ALVO DE DEUS: (Lm. 03 v. 12) = “Armou o seu arco, e me pôs como alvo à flecha.” / (Sl. 84 v. 09) = “Olha, ó Deus, escudo nosso, e contempla o rosto do teu ungido.” Filhos de Core.

PRECISAMOS CONFIAR NA MISERICÓRDIA: (Lm. 03 v. 22) = “As misericórdias do SENHOR são a causa de não sermos consumidos, porque as suas misericórdias não têm fim.”

PRECISAMOS TER O SENHOR COMO NOSSA PORÇÃO: (Lm. 03 v. 24) = “A minha porção é o SENHOR, diz a minha alma; portanto esperarei nele.”

PRECISAMOS CRER QUE O SENHOR É BOM: (Lm. 03 v. 25) = “Bom é o SENHOR para os que esperam por ele, para a alma que o busca.”

PRECISAMOS TER ESPERANÇA: (Lm. 03 v. 26) = “Bom é ter esperança, e aguardar em silêncio a salvação do SENHOR.”

PRECISAMOS SUPORTAR O JUGO: (Lm. 03 v. 27) = “Bom é para o homem suportar o jugo na sua mocidade.” / (Is. 10 v. 27) = “E acontecerá, naquele dia, que a sua carga será tirada do teu ombro, e o seu jugo do teu pescoço; e o jugo será despedaçado por causa da unção.”

Elaboração pelo:- Evangelista Isaias Silva de Jesus

Igreja Evangélica Assembléia de Deus Ministério Belém Em Dourados – MS

Bibliografia

Comentário Bíblico Beacon

principiosdateologia.blogspot.com

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